‘Jogo do Tigrinho’: Influencers não podem ser confundidos com donos da plataforma, defende advogado
A propaganda ou divulgação não pode ser confundida com a conduta de explorar o jogo de azar

Um grupo de influenciadores digitais foi alvo da operação “Truque de Mestre”, no Pará, na última semana. A ação, da Polícia Civil, teve como objetivo cumprir mandados de prisão temporária e de busca e apreensão contra investigados por envolvimento em jogos de azar na internet, conhecidos como “Jogo do Tigrinho” (Tiger Fortune). De acordo com a PC, o grupo movimentou mais de R$ 20 milhões e é suspeito de estelionato, lavagem de dinheiro e associação criminosa. O advogado criminalista Filipe Silveira adianta que uma pessoa eventualmente contratada para divulgar um sítio eletrônico de apostas não pode ser confundida com o proprietário ou com a pessoa que disponibiliza o serviço.
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“A propaganda ou divulgação, portanto, não pode ser confundida com a conduta de explorar o jogo de azar, com ela não se confunde. Aquele que faz ou promove publicidade enganosa ou abusiva, poderá, se existente relação de consumo, ser responsabilizado pelo crime previsto no art. 67 do Código de Defesa do Consumidor ou no art. 68 do mesmo código se a publicidade for de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança. Ademais disso, a depender do caso concreto, a esses tipos penais poderá ser acrescido circunstâncias agravantes se (a) ocasionarem grave dano individual ou coletivo; (b) dissimular a natureza ilícita do procedimento; (c) menores de 18 anos, maiores de sessenta ou pessoas portadoras de necessidades especiais”, esclarece o Filipe Silveira.
Ele acrescenta: “Veja, nesse contexto, que a conduta de quem faz a propaganda não pode ser confundida com a conduta de quem explora o jogo de azar, são situações e contextos diversos”. “A única forma de se imputar ao responsável pela propaganda ou divulgação a exploração do jogo de azar ocorre quando aquele que está promovendo o jogo de azar também é o responsável pela criação e inserção do produto ilícito no país”, assegura.
Estelionato
“No caso em debate, o crime de estelionato é geral em relação à contravenção penal (mais específica), razão pela qual a conduta de explorar jogo de azar deveria ser punida pela lei das contravenções penais e não pelo Código Penal. Porém, na hipótese específica dos chamados influencers não há demonstração de que estivessem explorando o jogo de azar, mas sim de estarem divulgando, realizando publicidade, mesmo que, em tese, soubessem do caráter ilegal do jogo; estivessem fazendo afirmação abusiva sobre as chances de ganho; ou induzindo ao comportamento perigoso do consumidor”, comenta Silveira.
Ainda segundo ele, “nesse caso, portanto, mais uma vez, a legislação específica seria o CDC (Código de Defesa do Consumidor) e não o Código Penal. A meu juízo, há uma grave distorção do programa normativo do art. 171, de seus incisos e parágrafos, pois, nenhum deles alberga a conduta que fora atribuída pelas notícias divulgadas aos influencers, isto é, não há exploração de jogo de azar, não há fraude praticada pelos influencers, mas sim a publicidade de uma atividade ilícita, o que poderia atrair os crimes e circunstâncias agravantes presentes no Código de Defesa de Consumidor e não no Código Penal”.
Associação criminosa
Para Filipe Silveira, no que diz respeito ao crime de associação criminosa, “pelo menos em um sentido apriorístico ou inicial, não há notícias de que os influencers estavam reunidos com estabilidade e permanência para juntos cometerem inúmeros crimes. Aparentemente, o crime de associação criminosa foi utilizado para viabilizar a aplicação da medida de segregação temporária”.
“É preciso que se compreenda que a legislação criminal brasileira diferencia o crime praticado em concurso, quando duas pessoas se unem no mesmo propósito para um delito, do crime de associação criminosa, quando três ou mais pessoas se associam, com estabilidade e permanência, para praticar um número indeterminado de crime”, informa.
Lavagem de dinheiro
“Por fim, a mera utilização do produto de um eventual crime (a exemplo a compra de automóveis ou outros bens) em nome próprio não caracteriza, por si só, o crime de lavagem de capitais. A lavagem se caracteriza, em apertada síntese, pela ocorrência de três fases (colocação, dissimulação e integralização). Na primeira e segunda fases (colocação e ocultação) o agente promove atos para ocultar a natureza, origem, localização e propriedade do bem, correspondendo as condutas proibidas no caput e no §1º do art. 1º da Lei 9613/1998. Na terceira fase, chamada de dissimulação, prevista no §2º do art. 1º da Lei 9613/1998 pune-se o processo de integração do bem de origem ilícita na economia formal, daí porque se pune aquele que, tendo conhecimento da origem, utiliza tais bens na atividade econômica. O que se pode concluir, portanto, em grossa síntese, é que a compra de bens em nome próprio ou para uso pessoal, sem qualquer processo de ocultação ou dissimulação, não corresponde ao crime de lavagem de dinheiro”, resume.
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