Em Belém, artistas transformam cinzas de queimadas em mural sobre a Marcha pelo Clima

Mural foi criado por Mundano, Mauro Neri e artistas paraenses para registrar a marcha e dialogar com o território

Amanda Martins
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A Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 30) chegou ao fim, mas a população de Belém já passa a conviver com parte de seu legado a céu aberto. Um mural de 45 metros de comprimento por 3,5 metros de altura ganhou forma na Avenida Marquês de Herval, 761, para eternizar a Marcha Mundial pelo Clima, realizada no último sábado na capital paraense. A obra, finalizada na sexta-feira (21), foi produzida coletivamente pelos artivistas Mundano, Mauro Neri e pelos paraenses And Santtos, Marcelo Bocão e Vitor Cupido. A intervenção integra o projeto Cinzas da Floresta”, que utiliza pigmentos produzidos a partir de cinzas de queimadas coletadas em expedições pelos principais biomas brasileiros, com a proposta de transformar esses resíduos em arte como forma de denunciar a escalada dos incêndios florestais que vêm atingindo sucessivos recordes no país.

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O mural fez parte de uma ação conduzida pelo artista paulistano Mundano, que lidera o projeto.  Ele explicou que a criação em Belém só foi possível pelo trabalho colaborativo. “Tem sido um privilégio poder pintar com artistas locais. É muito importante essa troca de artistas amazônidas, trazendo referências e técnicas. Sozinho eu não conseguiria fazê-lo, é um mural super grande, com uma dimensão expressiva”, disse. Segundo o artista, a iniciativa ‘deixou marcado na cidade que cultura e clima caminharam juntos nesta COP’.

Mundano contou que o projeto que reutiliza as cinzas das queimadas começou após uma expedição de mais de 10 mil quilômetros pelos biomas Amazônia, Pantanal, Cerrado e Mata Atlântica. Ao longo da viagem, ele encontrou brigadistas, cientistas, especialistas em fogo e comunidades atingidas por queimadas, reunindo mais de 200 quilos de cinzas usadas como pigmento. “Essas cinzas viraram um grande mural em São Paulo homenageando brigadistas. O restante decidimos compartilhar com outros artistas. O projeto virou um movimento que tem usado pigmento de destruição ambiental para reconstruir nossa história”, explicou. A tinta já foi utilizada em prédios e murais em Belém, Manaus, Recife e Goiânia.

image (Carmem Helena / O Liberal)

No mural da Marquês de Herval, o público pode identificar frases e cartazes inspirados nos utilizados pelos manifestantes durante a Marcha pelo Clima, que reuniu cerca de 50 mil pessoas pelas ruas de Belém com a intenção de fortalecer debates sobre justiça climática, reparação de danos e defesa dos territórios tradicionais.

Mundano destacou que o conteúdo visual reflete tanto o ato quanto o ambiente da conferência. “As pessoas vão encontrar cartazes escritos em várias línguas, inspirados em fatos reais e temas marcantes da Conferência Climática. As figuras e as frases retratam a marcha global do dia 15 e o espírito da conferência, afinal este mural foi feito com cinzas da floresta e com a sociedade civil participando ativamente da COP”, afirmou. 

image Artivista e artista visual And Santtos (Carmem Helena / O Liberal)

O artista paraense And Santtos reforçou que o processo criativo buscou representar a diversidade presente no ato. “Pensamos de uma maneira bem coletiva para retratar de forma lúdica a marcha pelo clima. Pensamos em uma diversidade grandiosa de pessoas brancas, pretas, pardas, indígenas. Também pensamos em incluir elementos da cultura brasileira, porque quando se trata de justiça climática o assunto é amplo, e a cultura é fundamental”, disse. 

Para ele, o local escolhido favorece o impacto da obra. “O mural está sendo feito em um lugar bastante frequentado. Diariamente passam muitas pessoas, carros, motos e bicicletas. Usamos nossas ferramentas para tentar passar essa mensagem”, acrescentou.

Antes de receber a nova arte, o muro já abrigava outra obra de forte simbolismo. O espaço havia sido ocupado também por uma pintura de And Santtos, que homenageou o indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips, mortos em 5 de junho de 2022, no Vale do Javari, no Amazonas. 

Na obra, And retratou Bruno e Dom ao lado de figuras indígenas e de araras amazônicas, estas representadas em cores vibrantes, enquanto os dois homenageados apareciam em preto e branco, recurso que o artista utilizou para indicar que eles permaneciam ao lado dos povos originários, ainda que de outra forma. 

Legado

Sobre a criação em conjunto, ele destacou a liderança de Mundano. “O processo de criação parte da mobilização do coletivo artivista. O Mundano já tem sua própria linguagem, então pensamos de maneira objetiva em retratar as pessoas através das cinzas;  pessoas que já foram, pessoas que permanecem na discussão, pessoas que brigam pela causa”, explicou. 

And acrescentou que o mural simboliza também a necessidade de reconhecimento da luta climática. “É uma mensagem de apoio. A luta não é pessoal, é de toda a comunidade da terra. É sempre importante passar essa mensagem para quem circula pelo local”, afirmou. 

O artista ressaltou ainda como buscou traduzir o espírito da COP 30 na obra. “Pensamos de forma diversa, colocando as pessoas que participaram da marcha como múltipla vozes e incluímos expressões culturais. O importante é lembrar que temos um futuro que precisa ser melhor que o presente. As cinzas falam sobre isso: têm um simbolismo grande, a devastação, a inalação, tudo prejudicial, mas que agora também compõe uma reflexão coletiva”, disse.

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