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Queimadas em Mosqueiro atingem 32 entre 40 comunidades, alerta liderança local

Moradores, em grande parte agricultores, relatam dificuldades com a perda de plantações e de bens materiais

Gabriel Pires / Camila Guimarães
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“Eu mesmo nunca tinha visto algo assim. Só na televisão”, diz Sílvio Malato, 58, morador de uma das 32 comunidades da Ilha de Mosqueiro, distrito de Belém, que está pegando fogo há, pelo menos, 37 dias, conforme informações da Cooperativa Agropecuária Mista de Mosqueiro (Coopam). A associação representa 40 das 44 comunidades da ilha e afirma que a situação é calamitosa na região.

Na comunidade 19 de Abril, às margens da PA-391, Malato acredita que a queimada já dura quase um mês: "A situação está assim, vai e volta o fogo. O fogo surge sem a gente tocar fogo, porque o capim está seco". Com este cenário, o morador relata os prejuízos à saúde física dele e de seus vizinhos, além de dos esforços dos moradores para tentar aplacar os avanços das chamas.

"É ruim por causa da fumaça, nossos olhos ficam ardendo, a gente não tem para onde ir, não tem para onde ficar... Nem a máscara dá jeito. Tem criança, tem pessoas idosas por aqui. Até agora nenhuma casa pegou fogo, mas muitas já foram ameaçadas. Os moradores tentam apagar com balde, com areia, a gente fica se virando aqui", relata o morador.

image Morador tem esperança de que chova e de que as autoridades tomem providências. (Igor Mota / O Liberal)

Outra moradora da comunidade, a dona de casa Maria do Socorro Machado, de 49 anos, cita os impactos das queimadas também para a fauna local: "Eu tenho visto coisas que eu nunca tinha visto na minha vida. Ontem eu não dormi porque esta fumaça faz mal para os nossos olhos, para a nossa garganta, para a nossa respiração. É dolorida também para o papagaio, para os macacos, para os periquitos, os animais com que nós convivemos".

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Já na comunidade Nova Esperança, que também fica ao longo da PA-391, o fogo tomou proporções tão grandes que, do dia para noite, agricultores chegaram a perder toda a produção. Foi o caso de José Natalino Lima, de 46 anos, que viu seus 865 pés de açaí serem consumido pelas chamas sem poder fazer nada:

"Eu me lembro quando o fogo vinha vindo. Quando eu fui no fundo das minhas terras, ele já vinha queimando de lá para cá. Eu avisei no nosso grupo: quem tivesse açaí para cá, que não deixasse de vir olhar. Mas quando ele veio para cá, a gente não teve como apagar, passou por cima de tudo", relata.

image O agricultor, José Natalino, perdeu toda a produção de açaí devido às chamas, em Mosqueiro. (Igor Mota / O Liberal)

Ele mora há seis anos na ilha com a esposa, uma enteada e duas filhas. Sem perspectiva de lucro com o açaí, por enquanto o agricultor não sabe o que fazer: "É difícil, mas a gente não tem para onde ir. Tem que ficar aqui na fumaça mesmo". Ele também expressa a esperança nas providências divina:

"Quero ver também o que as autoridades podem fazer pela gente, porque o prejuízo foi grande, mas não foi culpa da gente. Quando chover de novo a gente planta de novo e vê o que Deus tem para fazer. Uma hora esse fogo vai acabar. (...) A gente espera que Deus mande chuva para ao menos molhar a terra".

Proporção das queimadas supera força-tarefa que vem sendo feita

O diretor administrativo da Cooperativa Agropecuária Mista de Mosqueiro (Coopam), Augusto César Silva, conta que a associação acompanha 40 das 44 comunidades de Mosqueiro há, pelo menos, quatro anos. Destas, 32 têm registro de incêndios. Ele atribui a causa do fogo a múltiplos fatores. Além da queimada espontânea, devido à estiagem, ele cita outras:

"Ainda existem famílias que tentam cultivar - por falta de recursos e de incentivo - usando a tecnologia da queima para preparar roçado e a gente está tentando orientar essas famílias a não desenvolverem mais essa prática, mas é difícil. Assim como há essa questão da agricultura, nós entendemos que existe, sim, a possibilidade de estar havendo essas queimadas criminosas, porque este ano está atípico, o número de queimadas cresceu avassaladoramente".

image Sinistro na ilha de Mosqueiro já é considerado um incêndio florestal e não mais focos de incêndio. (Igor Mota / O Liberal)

Augusto César diz que a cooperativa tem buscado o poder público para pedir ajuda. O Corpo de Bombeiros Militar do Pará (CBMPA) e a Polícia Militar (PM) são alguns dos órgãos que têm atuado diretamente no combate às chamas e na tentativa de coibir queimadas criminosas. Mas os esforços não têm sido suficientes para tanto fogo. Augusto estima que a área que já foi e/ou ainda está sendo afetada pelas queimadas já somem 750 hectares.

"Fizemos uma grande reunião na sede da nossa cooperativa onde estiveram o poder judiciário, o Ministério Público, o comando da Polícia Militar da ilha, do Corpo de Bombeiros, da Saúde e, nessa reunião, nos comprometemos a fazer uma força-tarefa para montar brigadas de contenção emergencial dessas queimadas, mas, neste momento, a gente percebe que há uma limitação de estrutura física e de material, porque as queimadas tomaram uma proporção muito além das expectativas do próprio governo".

"Enquanto cooperativa, a gente espera também a sensibilidade do poder público de perceber que muitas famílias perderam tudo. Tem famílias que há mais de 15 anos plantam açaí e, neste momento, tiveram toda sua produção queimada. Famílias perderam casas, animais... A situação é calamitosa. O poder público tem, sim, mandado as viaturas do corpo de bombeiros, a polícia militar tem agido tentando coibir as queimadas, mas a proporção é grande mesmo", complementa.

Na última quarta-feira, 6, a Prefeitura de Belém instalou um gabinete de crise para enfrentar o sinistro na ilha de Mosqueiro, que já é considerado um incêndio florestal e não mais focos de incêndio. A força-tarefa conta com a cessão de duas pás mecânicas e de dois carros-pipa com capacidade de 12 mil litros cada. As pás carregadeiras servem para abrir trincheiras no terreno a fim de isolar as chamas, impedindo que avancem para outras áreas, enquanto os carros-pipa reforçam o equipamento dos Bombeiros no combate ao fogo. O gabinete também possui o serviço de alerta para o atendimento de saúde no Hospital de Mosqueiro para possíveis casos de pacientes prejudicados pela fumaça.

O gabinete de crise reúne a Defesa Civil Municipal, Guarda Municipal de Belém, Agência Distrital de Mosqueiro (Admos), Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), Corpo de Bombeiros e Polícia Militar, com o objetivo de reduzir os danos ambientais e sociais.

A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) diz, em nota, que enviou fiscais para avaliar os danos e investigar as causas do incêndio. Já foram registrados prejuízos, como a destruição de uma residência na comunidade 19 de Abril e a devastação de áreas agrícolas, incluindo açaizais, comprometendo o sustento de famílias locais.

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