Tirar a primeira CNH no Pará custa R$ 2,8 mil; proposta prevê fim da obrigatoriedade de autoescola

Pesquisa aponta 20 milhões de brasileiros dirigem sem habilitação e 32% ainda não se habilitaram devido ao alto custo da Carteira Nacional de Habilitação

Dilson Pimentel
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O Pará ocupa a 17ª posição no ranking nacional de custos para obtenção da primeira Carteira Nacional de Habilitação (CNH). O valor no Estado é de R$ 2.802,45. Pesquisa Perfil do Condutor Brasileiro, do Instituto Nexus, aponta que 20 milhões de brasileiros dirigem sem habilitação e 32% ainda não se habilitaram devido ao alto custo. A percepção de que o valor é elevado é praticamente consenso: 80% consideram a CNH cara ou muito cara e 66% dizem que o preço cobrado não condiz com o serviço entregue, informou, ainda, o Ministério dos Transportes.

Entre os brasileiros com renda familiar de até um salário mínimo, 81% não possuem habilitação. A taxa de não habilitados também é expressiva nas regiões Nordeste (71%) e no Norte (64%). O preço elevado para se habilitar tem reflexos ainda na informalidade. Quase metade (49%) dos condutores não habilitados dizem que o custo é o principal motivo para não regularizarem a situação. Isso mostra que o valor cobrado vai além de um problema econômico, se torna uma questão de segurança viária e inclusão social.

Paralelamente, o governo federal estuda mudanças no processo para quem pretende conduzir carros de passeio (categoria B) ou motocicletas (categoria A). Uma das propostas, já redigida e formalizada pelo Ministério dos Transportes, prevê o fim da obrigatoriedade das aulas em autoescolas nesses casos. A medida, se aprovada pelo presidente Lula, permitirá que o candidato decida se fará ou não o treinamento. O ministro dos Transportes, Renan Filho, enfatiza que não se trata do encerramento das atividades das autoescolas, mas de tornar o serviço opcional.

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image A imagem mostra Lisomar Lima do Reis e o instrutor de autoescola Luan Carlos (Foto: Thiago Gomes/O Liberal)

Opiniões nas ruas

Em Belém, Lisomar Lima do Reis, mestre de obras, disse que considera o valor atual justo pelo serviço prestado, mas reconhece que uma redução seria positiva. "O valor da CNH não é alto, no sentido de que você vai aprender com um profissional. Mas, se pudesse baixar um pouco mais, seria bom. Vai melhorar para muita gente, até porque vai parar um pouco de muitas pessoas irregulares no trânsito", afirmou.

Lisomar conta que se programou financeiramente, guardando dinheiro e pagando em prestações até conseguir arcar com a habilitação. Sobre a proposta do governo, ele avalia que a formação profissional é essencial: "Se não tornar mais obrigatório, vai colocar mais pessoas sem uma parte profissional. A vida é muito mais cara do que a gente vai pagar. É bom ter um instrutor para ensinar." O trabalhador também destacou que a decisão de tirar a CNH agora está ligada à necessidade no trabalho e à vontade de circular de forma regular.

Darlene Reis, pedagoga de 58 anos, já possui habilitação e considera o valor “um pouco justo”, mas reconhece que, para muitas pessoas, o custo é pesado. "Eu guardei dinheiro e contei com a ajuda dos meus filhos e do meu esposo. Para mim ficou mais fácil, mas tem muita gente que não é assim", disse. Para ela, a exigência das aulas deve permanecer: "Lá tem instrutores habilitados para a gente sair apto. O nosso trânsito precisa disso, não pode simplesmente jogar a pessoa para se virar."

Visão técnica

O instrutor de autoescola Luan Carlos, 31 anos, se posiciona contra a flexibilização. Ele argumenta que a ausência de formação formal pode trazer riscos. "Se não tiver a obrigação do aluno passar pelas autoescolas, ele vai aprender com pais, tios ou outros adultos. Isso pode trazer vícios, como não ligar a seta, não respeitar a faixa de pedestre ou a sinalização", explicou. Para ele, a função da autoescola é capacitar e formar condutores conscientes, algo especialmente importante no Pará: "O trânsito aqui é regrado de incompatibilidades. Ninguém respeita ninguém. Por isso, acredito que essa mudança será prejudicial se entrar em vigor." Com o debate em andamento, a proposta segue para avaliação do presidente Lula. Se aprovada, marcará uma das maiores mudanças no processo de habilitação no Brasil nas últimas décadas.

Para o presidente do Sindicato das Autoescolas de Belém, Sandro Hage, a iniciativa representa um risco tanto para a segurança no trânsito quanto para os milhares de empregos gerados pelo setor em todo o país. Segundo ele, para essa proposta ir à frente, seria necessária uma alteração no Código de Trânsito, o que levaria ao menos dois anos. “Isso impacta diretamente mais de 15 mil autoescolas e cerca de 300 mil empregos com carteira assinada em todo país, além de afetar a segurança no trânsito. Sem a autoescola, o trânsito vira um caos. Pessoas sem preparo ensinando outras a dirigir pode ser desastroso", disse.

Ele também destacou que a proposta vai na contramão de metas internacionais de segurança viária, como a redução de 50% nas mortes e lesões no trânsito até 2030, estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo Hage, a Federação Nacional das Autoescolas e Centros de Formação de Condutores (Feneauto) já está se mobilizando para tentar barrar o avanço da proposta junto ao Ministério dos Transportes.

image Darlene Reis, pedagoga de 58 anos (ao volante) considera o valor “um pouco justo”, mas reconhece que, para muitas pessoas, o custo é pesado (Foto: Thiago Gomes/O Liberal)

Especialista alerta: “Valor da CNH no Brasil transforma direito em exclusão social”

Bacharel em Direito e especialista em mobilidade urbana e trânsito, Rafael Cristo avalia que o custo para obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) no Brasil é excessivamente alto. “Se analisarmos, é quase dois salários mínimos. Isso faz com que a habilitação deixe de ser um instrumento de inclusão social e passe a ser de exclusão social. Essa é uma das grandes preocupações técnicas e também econômicas”, afirma.

Segundo ele, a redução dos custos não deve se limitar apenas aos valores cobrados pelos Centros de Formação de Condutores (CFCs). É necessário rever também as taxas administrativas, que considera “muito altas”, além de serviços como biometria e telemetria, incluídos nos últimos anos e que aumentaram o preço final.

“Todo o investimento tecnológico das habilitações no Brasil foi transferido para o usuário, tornando o processo muito caro para determinadas classes. A CNH social, conhecida aqui no Pará como CNH Pai d’Égua, não atende nem 5% da população que precisa de uma carteira”, aponta. Para ele, a habilitação precisa voltar a ser um instrumento de inclusão social.

Mudanças no processo: redução, mas não fim das aulas

Sobre a proposta do governo federal de tornar facultativa a frequência em autoescolas, Cristo defende que a solução não está em extinguir a obrigatoriedade, mas em reduzir a carga mínima de aulas. “O volume de aulas hoje é muito grande. Reduzir de 20 para 10 seria o ideal, e, caso a pessoa necessitasse de mais, poderia fazer. Mas não retirar a obrigatoriedade das aulas práticas”, sugere.

Ele ressalta ainda que o custo de manutenção de veículos nas aulas,,como combustível, encarece o processo. Por isso, propõe que o governo crie incentivos e até isenção de impostos para as autoescolas, ajudando a baratear o serviço. Além disso, defende a revisão das taxas, como a de R$ 348 e outra de quase R$ 600, praticadas no Pará, e a redução dos custos de tecnologia, especialmente telemetria.

“Com essas medidas, seria possível alcançar um impacto de redução entre 27% e 30% no valor atual, melhorando a qualidade do serviço no Brasil todo. É preciso pensar em soluções macro, que beneficiem quem realmente precisa da habilitação”, conclui.

Em nota, o Departamento de Trânsito do Estado do Pará (Detran-PA) informa que está acompanhando atentamente as discussões em nível nacional sobre a possível flexibilização das exigências para obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), incluindo a proposta de emissão do documento sem a obrigatoriedade de aulas em autoescolas.

UF - Valor total da primeira habilitação no Brasil

Posição

1º RS 4.951,35

2º MS 4.477,95

3º BA 4.120,75

4º MG 3.968,15

5º SC 3.906,90

6º AC 3.906,60

7º RR 3.828,40

8º AP 3.780,47

9º PR 3.670,83

10º AM 3.418,95

11º PE 3.416,44

12º CE 3.020,97

13º SE 3.049,97

14º DF 3.005,67

15º TO 2.985,33

16º MT 2.964,04

17º PA 2.802,45

18º RN 2.806,00

19º MA 2.858,01

20º GO 2.600,39

21º RJ 2.567,82

22º PI 2.401,00

23º RO 2.355,22

24º ES 2.338,76

25º AL 2.069,14

26º SP 1.983,90

27º PB 1.950,40

Fonte: Senatran (Secretaria Nacional de Trânsito)

 

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