Legado negro de Léa Garcia na cultura brasileira permanecerá vivo

Léa Garcia ganhou 11 premiações e concorreu como atriz revelação no Festival de Cannes

Vito Gemaque
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Parte da história do teatro e da dramaturgia brasileira contou com a colaboração da atriz Léa Garcia, de 90 anos, que morreu ontem (15) vítima de um infarto. A atriz que fez teatro, cinema e novelas na televisão seria homenageada, ao lado da colega Laura Cardoso, justamente nesta terça-feira na 51ª edição do Festival de Cinema de Gramado, na Serra do Rio Grande do Sul, o mais importante festival brasileiro. O legado de Léa Lucas Garcia de Aguiar estará para sempre na história da cultura do Brasil, principalmente para negros e negras, que se viram representados pelos inúmeros papéis de Léa.

Nascida em 11 de março de 1933, na Praça Mauá, no Rio de Janeiro, Léa Garcia queria ser escritora, mas o encontro com as artes cênicas mudaria profunda e irreversivelmente sua vida. Léa queria cursar letras para ser escritora. Entretanto, tudo mudou ao conhecer Abdias Nascimento, artista, escritor professor universitário e militante político negro, que chegou a ser eleito senador pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT). Ao conhecer Abdias, com quem se casou, Léa conheceu também o que viria ser outra paixão - as artes cênicas.

Com um grupo de atrizes e atores negros, Léa Garcia subiu pela primeira vez no palco para interpretar a Rapsódia Negra (1952), texto de Abdias, encenada pelo Teatro Experimental do Negro. Esse seria um caminho irreversível. Anos depois, ela interpretaria Mira na peça “Orfeu da Conceição” (1956) de autoria de Vinícius de Moraes.

A peça com uma equipe 40 negros em cena foi um grande sucesso e se transformou no filme “Orfeu Negro” ou “Orfeu do Carnaval”, com produção ítalo-franco-brasileira, que ganhou o A Palma de Ouro, no Festival de Cannes (1959), o Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira (1960), o Melhor Filme Estrangeiro no Globo de Ouro (1960) e o British Academy of Film and Television Arts (1961). Pela interpretação neste filme Léa Garcia foi indicada como atriz revelação para “Palma de Ouro”, em Cannes.

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Na televisão, a participação de Léa Garcia também foi histórica. A estreia ocorreu na TV Tupi, em 1950. A estreia na TV Globo ocorreu em 1970, quando entrou no elenco “Assim na Terra como no Céu”, de Dias Gomes. O maior sucesso na teledramaturgia aconteceu na TV Globo em “Escrava Isaura” (1976), um fenômeno de audiência no Brasil e no exterior. No folhetim, pela primeira vez uma atriz negra interpretou uma vilã, Léa Garcia deu vida à Rosa.

Léa Garcia tem mais de uma centena de trabalhos em diferentes meios. Somente na televisão foram mais de 50 trabalhos, no cinema 34 filmes, 24 peças de teatro que resultaram em 11 premiações nacionais e internacionais.

Referência

Todo esse trabalho fez de Léa Garcia uma referência negra para jovens atrizes e atores. A história de luta pelo espaço dos negros e negras sempre permeou a carreira de Léa Garcia. A bailarina e artista de Terreiro, Lo Ojuara lembra da primeira vez que viu Léa Garcia na televisão interpretando Cida, em “Anjo Mau” (1997), que era mãe de Luiza Brunet. Depois ela conheceu o filme “Orfeu do Carnaval” e se encantou de vez pela atriz.

“Eu fiquei abismada com aquela mulher com aquele talento enorme, fiquei muito impactada com a representação dela. Pensei, meu Deus, como pode uma mulher com um talento enorme fazer um papel tão pequeno. E ainda num papel pequeno brilhava mesmo assim. Depois eu fui crescendo e conhecendo ela melhor no teatro negro”, destaca.

Para a atriz paraense negra Karina Diaz, Léa Garcia é de teatro, cinema, teledramaturgia, e cultura negra ancestral. “Léa Garcia é uma referência muito grande para todo artista negro, negra, e negri, que está começando, que traz como cerne de sua base o Teatro Experimental Negro. As referências de Abdias Nascimento, as referências de Ruth Costa como uma atriz antecessora à Léa. Falar de Léa Garcia é falar da possibilidade de artistas negros estarem em papéis de destaque em várias teledramaturgias, do teatro ao cinema, é uma referência muito grande”, afirma.

A ativista negra e atriz Wellingta Macedo ressalta a importância de Léa pelos lugares que ocupou antes de toda a discussão sobre representatividade na televisão. “Lea Garcia é falar de uma mestra, de ancestralidade, é falar de uma das grandes damas negras do teatro brasileiro, que abriram os caminhos para que atrizes como eu, e atores negros, pudessem ocupar seus espaços de direito que foram historicamente negados por conta do racismo da sociedade brasileira. Falar dela também é falar de uma mulher que sempre foi inspiração para mim e para muitas mulheres negras, que são atrizes, que trabalham no cinema atrás das câmeras, como diretoras, como fotógrafas, como cenógrafas, como roteiristas”, assegura.

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