Terapia com inteligência artificial cresce, mas especialistas alertam para riscos à saúde mental
Aplicativos e plataformas que simulam conversas com psicólogos têm atraído cada vez mais usuários em busca de apoio emocional

O uso da inteligência artificial como forma de terapia vem crescendo e ganhou destaque no Fantástico no último domingo (14). Aplicativos e plataformas que simulam conversas com psicólogos têm atraído cada vez mais usuários em busca de apoio emocional, mas especialistas alertam que a prática pode apresentar riscos à saúde mental. Uma pesquisa americana revelou que, entre quem relata problemas de saúde mental, metade recorre a robôs para desabafar, compartilhar sentimentos e buscar aconselhamento.
A presidente do Conselho Regional de Psicologia do Pará e Amapá (CRP-10), Eveny da Teixeira, analisa a tendência com preocupação. Ela lembra que a tecnologia e a IA podem ser ferramentas auxiliares valiosas na automatização de tarefas administrativas ou na análise de dados para políticas públicas, mas enfatiza que a oferta de “terapia com IA” é um equívoco. “A terapia não é só uma troca de palavras. Ela é um processo relacional, a oferta de um cuidado que transforma. É construído na confiança, na empatia genuína e no vínculo humano entre um profissional qualificado e seu cliente”, afirma.
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Segundo a psicóloga, um sistema de IA, por mais interessante que pareça, carece de consciência, compreensão emocional real e julgamento ético. Ela alerta que a interação com chatbots pode ser potencialmente perigosa, especialmente em situações críticas, como surtos psicológicos. A psicóloga explica que, embora algumas pessoas usem a IA como um canal para desabafar e buscar conselhos imediatos, na prática funciona mais como escrever em um diário.
“Imagina agora alguém em surto, que perdeu o contato com a realidade, conversando com uma IA que tenderá a bajular e a concordar com esse falante? O resultado final poderá ser potencialmente perigoso para o próprio falante ou para outras pessoas no entorno. Um chatbot pode oferecer uma escuta não julgadora e respostas genéricas baseadas em algum algoritmo, mas a psicoterapia com uma psicóloga ou um psicólogo vai além disso. O nosso trabalho não é oferecer respostas prontas, mas facilitar um processo de autoconhecimento e transformação”, pontua.
Formação
Além disso, Eveny destaca que um terapeuta humano, baseado em formação ética e técnica, pode discordar de análises simplistas que o cliente faz de si mesmo e de seu contexto, incentivando reflexões e ajudando a pessoa a conectar pontos de sua história. “Mais do que isso, uma profissional capacitada tem o discernimento para ajudar a cliente a identificar que muitas de suas angústias não são apenas ‘problemas individuais’, mas estão profundamente conectadas a questões estruturais da sociedade, como racismo, misoginia, capacitismo e LGBTfobia”, explica.
Ela alerta que a IA, treinada em dados que muitas vezes reproduzem preconceitos, não tem capacidade crítica para essa contextualização social, podendo reforçar visões estereotipadas. Eveny reforça que o grande risco é que a pessoa tenha a falsa sensação de estar sendo cuidada por uma ferramenta incapaz de oferecer profundidade, contestação saudável e análise contextualizada. “Não, não é recomendado utilizar aplicativos de IA como substitutos para a psicoterapia. A razão central é a responsabilidade profissional”.
Recomendação
Segundo a psicóloga, a relação terapêutica é regida por um código de ética rigoroso, que garante sigilo, competência técnica e compromisso com o bem-estar do paciente. Quando um software assume esse papel, não há garantia sobre confidencialidade, julgamento clínico ou responsabilidade em situações de risco, como suicídio ou automutilação. Eveny ainda ressalta que a IA pode ser usada como recurso complementar, mas nunca substitui a psicóloga. A forma segura e correta de realizar terapia é por meio do atendimento profissional qualificado, seja presencial ou online, sempre com psicólogos devidamente registrados.
O CRP recomenda consultar o Cadastro Nacional dos Psicólogos para confirmar a validade do registro e garantir segurança no atendimento. Para populações vulnerabilizadas, existem alternativas gratuitas e seguras, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do SUS e serviços-escola das universidades, que contam com supervisão de profissionais registrados. “A mensagem que deixamos para a sociedade é: não troque a relação humana autêntica e ética por uma interação automatizada. Sua saúde mental é preciosa demais para ser delegada a um algoritmo. A tecnologia deve servir para ampliar o acesso ao cuidado humano, nunca para eliminar o humano do cuidado”, alerta Eveny.
Atendimentos em Belém
Em Belém, o acesso aos serviços de saúde mental é realizado nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Entre os serviços oferecidos estão terapias individuais e em grupo, além de outras formas de acompanhamento contínuo. Além das UBS distribuídas pelos bairros de Belém, que oferecem suporte a casos mais leves, a rede municipal de saúde dispõe de quatro CAPS, voltados ao cuidado especializado de situações de maior complexidade.
Além da rede municipal, a Universidade Federal do Pará (UFPA) oferece diferentes serviços de apoio psicológico e psicossocial. Por meio da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Proaes), estão disponíveis duas iniciativas principais. O Plantão Psicológico atende estudantes da instituição em situações emergenciais, oferecendo um serviço psicoterapêutico imediato para facilitar a compreensão da situação vivida no momento. O atendimento é realizado na Clínica de Psicologia da UFPA, no Campus Básico, em Belém, sem necessidade de agendamento, sempre às segundas, terças e sextas-feiras, das 14h às 17h.
Já o Projeto de Extensão de Assistência Psicossocial aos Discentes da UFPA (PEAPs), mantido em parceria com a Superintendência de Assistência Estudantil (Saest), recebe estudantes encaminhados para acolhimento e atendimento psicológico e/ou psiquiátrico. O serviço é voltado tanto para alunos de graduação quanto de pós-graduação e funciona na sede do Instituto de Ciências Médicas da UFPA, localizada na Avenida Generalíssimo Deodoro, nº 01, no bairro Umarizal. Os contatos são (91) 3201-7054 e peaps@ufpa.br.
Além desses serviços, a Pró-Reitoria de Desenvolvimento e Gestão de Pessoas (Progep) mantém o Programa de Assistência Psicossocial ao Servidor (PAPs), que integra a rede de promoção da saúde e qualidade de vida dos trabalhadores da universidade. O programa é fruto de uma parceria entre a UFPA e o Hospital das Clínicas Gaspar Vianna (HC) e oferece atendimento em saúde mental a todos os servidores da UFPA e do próprio hospital.
O serviço recebe técnicos administrativos e docentes encaminhados pelo Subsistema Integrado de Saúde do Servidor Público (SIASS), pela Progep ou por qualquer unidade acadêmica ou administrativa da universidade, além daqueles que procuram atendimento de forma espontânea. O PAPs também funciona na sede do Instituto de Ciências Médicas da UFPA, na Avenida Generalíssimo Deodoro, nº 01, Umarizal, com contatos pelo telefone (91) 3201-7054 e pelo e-mail paps@ufpa.br.
Confira onde buscar atendimentos nos CAPS:
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CAPS AD - Álcool e outras Drogas: Av. Gov. José Malcher, 1457 - Nazaré, Belém - PA, 66060-230
Público-alvo: jovens, adultos e idosos com uso abusivo de álcool e drogas.
Horário de funcionamento: 8h às 18h -
CAPS III - Casa Mental do Adulto: Tv. Dom Romualdo de Seixas, 1954 - Nazaré, Belém - PA, 66055-028
Público-alvo: adultos e idosos.
Horário de funcionamento: 24h -
CAPS II - Casa Mental do Mosqueiro: R. Francisco Xavier Cardoso, 1077 - São Brás, Belém - PA, 66063-075
Público-alvo: jovens, adultos e idosos.
Horário de funcionamento: 8h às 18h -
CAPSi - Casa Mental da Criança e do Adolescente: Tv. Magno de Araújo, 300 - Telégrafo, Belém - PA, 66113-055
Público-alvo: crianças e adolescentes, dos 06 aos 18 anos.
Horário de funcionamento: 8h às 18h
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