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Um ano sem padre Bruno Sechi

“Jamais nos deixem perder as esperanças”, era uma das frases mais conhecidas do religioso, que fundou a República de Emaús

Cleide Magalhães
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Neste sábado (29), completou-se um ano da morte do padre Bruno Sechi, vítima da covid-19, aos 80 anos. Ele é um dos principais ícones na luta pela cidadania e pelos direitos humanos no Pará, com destaque à luta em prol de crianças e adolescentes. Padre Bruno foi o fundador do Movimento República de Emaús, no bairro do Bengui, em Belém, capital paraense.

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Raízes italianas


Padre Bruno era filho de Francesco Giuseppe Sechi e Maria Antônia Murta e nasceu na cidade de Santu Lussurgiu, na Itália, e há 56 anos morava no Brasil. Católico, ingressou na vida religiosa aos 11 anos de idade, em outubro de 1950. Fez o noviciado salesiano de 1956 a 1957 em Lanúvio, em Roma, capital italiana.

Na mesma cidade emitiu a primeira profissão religiosa em agosto de 1957. Padre Sechi estudou Filosofia na comunidade de São Calisto nos anos seguintes. E conseguiu realizar a profissão perpétua como salesiano de Dom Bosco em agosto de 1963.

Missionário, chegou ao Brasil na ditadura


Um ano mais tarde, em outubro de 1964, em plena Ditadura Militar, chegou ao Brasil como missionário. De março de 1965 à 1968 estudou Teologia no Instituto Teológico Pio XI, em São Paulo.

Os anos de chumbo vividos no Brasil ajudaram a formar no padre - sensível às causas sociais - uma nova perspectiva de preocupação com os pobres, em especial com os jovens, inspirado na Teologia da Libertação. Foi ordenado presbítero em junho de 1968 por Dom Fernando Legal, bispo emérito de São Miguel Paulista.

Após sua ordenação, padre Bruno Sechi foi destinado à comunidade da Escola Salesiana do Trabalho, no bairro da sacramenta, em Belém, onde trabalhou de 1969 a 1970 como encarregado do Oratório Festivo Dom Bosco.

image Padre Bruno Sechi: legado da República de Emaús completou meio século (Cláudio Pinheiro / O Liberal)

O sonho da República de Emaús


Ainda segundo Cleice Maciel, coordenadora Executiva do Movimento de Emaús, neste trabalho o padre mobilizou a juventude em encontros de espiritualidade, que deram origem ao trabalho com crianças e adolescentes em situação de rua. Assim, em 1970, fundou o Restaurante do Pequeno Vendedor. Posteriormente, passou a chamar-se República do Pequeno Vendedor, abrangendo feiras e áreas de concentração de crianças trabalhadoras.

“Os primeiros esforços daquilo que depois ficou conhecido como Movimento República de Emaús surgiram em Belém, com um grupo de jovens e o padre Bruno Sechi. O ano era 1970 e aquele grupo montou na Ladeira do Castelo, uma rua do centro histórico de Belém, o chamado 'Restaurante do Pequeno Vendedor'”, segundo relato em destaque no portfólio do Movimento da República de Emaús.

A ideia era usar a hora do almoço para atrair os meninos que vendiam frutas, sacolas e outros produtos na feira do Ver-o-peso, logo, não estudavam, eram perseguidos pelo “rapa” e tratados como marginais pela sociedade e órgãos públicos.

“A princípio arredios, não demorou para que os meninos percebessem que entre aquelas pessoas existia um sentimento com o qual eles não estavam acostumados, a solidariedade capaz de transformar suas vidas. No ano seguinte, 1971, o grupo já aglutinava mais de 150 meninos. Desse modo, nasceu a República do Pequeno Vendedor”, informa a publicação.

Cidade de Emaús tem 41 anos de existência

Criado na década de 1970, o Movimento de Emaús inspira-se na passagem bíblica do caminho de Emaús (Lc. 24,17) em que, três dias após a crucificação, Jesus aparece, ressuscitado, aos discípulos, como símbolo de esperança e renovação através do gesto da partilha do pão. Com isso, uma das frases mais conhecidas do religioso era “Jamais nos deixem perder as esperanças”.

Dois anos depois, em 1972, o processo de evolução do movimento fez surgir a Campanha de Emaús, como forma de sensibilização e mobilização da população. Em 1980 criou-se a Cidade de Emaús, no bairro de Bengui, em Belém.

A Campanha de Emaús é uma das atividades da instituição, mais conhecida pela sociedade e um dos alicerces para a sustentabilidade do Emaús. Ela acontece anualmente no último domingo de setembro, quando aproximadamente 800 voluntários, principalmente jovens, percorrem em caminhões cedidos por empresas locais, as ruas de Belém recolhendo objetos disponibilizados pela população.

A grande coleta é também uma oportunidade da população tomar consciência dos graves problemas que atingem crianças, jovens e suas famílias. Anualmente é distribuída uma carta aberta com motivações e sugestões para participação. A doação de materiais não é restrita apenas à grande coleta, mas continua durante o ano, com entrega direta ou através de solicitações via telefone ou pelo site do Movimento.

Em 1983 o Centro de Defesa do Menor tornou-se a quarta expressão do movimento, voltada a combater a violência contra as crianças. Em 1993, foi criada a Agência Emaús de Notícias, para divulgar sistematicamente a situação das crianças e adolescentes na Amazônia.

O carisma pessoal e o empenho pela causa dos adolescentes e jovens permitiram ao padre Bruno importantes serviços. Atuou na Pastoral do Menor, foi presidente regional da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB) e coordenador Nacional do Movimento Meninos de Rua.

Sechi participou de encontros internacionais do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), órgão das Nações Unidas, e foi delegado arquidiocesano da Pastoral Carcerária e delegado do Capítulo Geral 21 dos Salesianos. Recebeu e participou de diversos serviços públicos ligados à proteção da infância.

Em 1990, iniciou o processo de desligamento da Sociedade de São Francisco de Sales (Salesianos), para encarnar-se no Clero da Arquidiocese de Belém e, assim, poder acompanhar o desenvolvimento da obra por ele iniciada. O processo de secularização foi concluído em maio de 1997, com decreto da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada.

Na caminhada de sacerdote arquidiocesano, padre Bruno Sechi foi para a paróquia São Domingos de Gusmão, em 1998, como vigário paroquial. Em 2008, ele participou da fundação da Caravana da Paz, que reunia dezenas de confissões religiosas cristãs. Bruno Sechi foi coordenador da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Belém.

Já em 2013, com a ajuda do Padre Bruno Sechi, o Movimento de Emaús realizou a cartografia social do bairro da Terra Firme. Depois ele assumiu a Paróquia do Guamá e retornou para a Paróquia da Terra Firme como padre.  

Na passagem pela Terra Firme, padre Bruno apoiou a luta em defesa de um bairro melhor, contribuindo para a formação do movimento social em defesa do bairro. Ele esteve na Paróquia da Terra Firme até o ano de 2014, quando foi morar definitivamente na sede do Movimento de Emaús, no Bengui.  

Em 2017, padre Bruno Sechi reunia algumas pessoas para celebrar, uma vez por mês, e então fundou a Fraternidade Emaús. A fraternidade não é um espaço confessional nem doutrinário, mas uma comunidade onde relaciona fé e vida e se solidariza com a luta do povo com afeto, partilha e compromisso.

Ainda naquele ano, 2017, padre Bruno estava como vigário da Paróquia João Paulo II, no bairro do Curió-Utinga, onde atuava até o momento da sua morte, dia 29 de maio de 2020, e teve como causa sequelas da covid-19. A partir de 2020, ele também diminuiu um pouco o ritmo de trabalho, pois a paróquia demandou mais dedicação, já que a comunidade estava muito fragilizada devido à pandemia da covid-19.

Outras atividades do padre Bruno era a realização de trabalhos formativos na arquidiocese, era idealizador e apresentador do programa de TV “Pensando Bem”, na TV Nazaré, onde ele entrevistava personalidades públicas discutindo política, cidadania, fé, direitos humanos, atualidades, saúde e meio ambiente. E, mesmo sem ter um cargo de coordenação no Emaús, continuava a contribuir com o direcionamento das ações do movimento de incidência política.

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