Parteira Rosalina, de 86 anos, de Bagre (PA), é reconhecida pelas várias vidas que trouxe ao mundo

O Iphan reconheceu o “Ofício, Saberes e Práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil” como Patrimônio Cultural do País.

Bruna Lima

Durante 40 anos Rosalina Rodrigues Vulcão, 86, dedicou-se a trazer à luz vidas. Diferentes gerações do município de Bagre vieram ao mundo por meio do seu trabalho como parteira. Este mês, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu o Ofício, Saberes e Práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil como Patrimônio Cultural do País e durante esta semana foi apresentado um projeto de lei na Assembleia Legislativa do Estado do Pará para que as parteiras sejam declaradas patrimônio cultural do estado. Rosalina é uma das parteiras que representa dedicação e amor pela vida.

Essa função na vida de Rosalina nasceu de forma natural, ela disse que não foi algo que foi repassado, mas sim percebido. Rosalina teve 14 gestações e todas foram com parteira e foi a partir da observação de como as parteiras faziam que ela absorveu essa função. Ela recorda a primeira vez que foi chamada para fazer um parto.

"Eu estava em casa ainda lá em Bagre e uma moça estava em trabalho de parto e me chamaram para ajudar. Eu fui e deu tudo certo e a partir desse dia comecei a fazer outros partos", declara dona Rosalina.

image Rosalina Rodrigues Vulcão, 86, dedicou toda sua vida ao ofício de parteira, trazendo à luz filhos, netos e outros parentes, além de pessoas fora da família. (Carmem Helena / O Liberal)

Essa função foi ganhando força e muitas pessoas passaram a lhe depositar confiança para exercer esse trabalho. "Isso foi crescendo e na minha de forma muito natural. Fui ganhando experiência e graças a Deus sempre deu tudo certo. Todos os partos as crianças desenvolveram bem", declara a parteira.

Dona Rosalina não sabe dizer ao certo o número de partos que fez, até porque não tem como contabilizar. Ela exerceu essa função durante 40 anos na cidade de Bagre, no Marajó. "Mais de mil pessoas com certeza, pois imagina, ela era referência como parteira na cidade. Ela atravessou gerações", disse a filha de Rosalina, Kátia Vulcão.

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Inclusive, os dois primeiros filhos de Kátia foram trazidos ao mundo com ajuda de sua mãe. "Os meus dois filhos mais velhos foram com a minha mãe e não tinha pessoa melhor para me acompanhar nesse momento da minha vida. É um ato de confiança muito forte que existe entre a gestante e a parteira. Eu sabia que ia estar segura. Nós fizemos em casa", recorda Kátia. Na terceira gestação, Kátia engravidou de gêmeos e teve os filhos em Belém.

As pessoas se sentem muito agradecidas pelo ato de dona Rosalina, ela é chamada de Mãe Velha por muitos, já que ela também ajudou a gerar a vidas. "Ela tem muitos afilhados e é muito respeitada em Bagre, as pessoas visitam e sempre falam dela com orgulho", disse Kátia sobre o legado que a mãe carrega.

image Rosalina teve 14 gestações e todas contaram com auxílio de parteira, assim, ela aprendeu a função. (Carmem Helena / O Liberal)

Na família, ela contribuiu com o parto de todas as filhas e noras. Nos últimos anos, ela já não faz mais parto de forma assídua, em decorrência de alguns problemas de saúde, mas ela diz que em caso de urgência não vai dizer não. "Durante à noite eu não faço mais, pois minha vista já não é tão boa como antes, mas de dia ainda encaro", declara dona Rosalina.

Dailton Vulcão, 43, é um dos netos de dona Rosalina, em cujo parto ela contribuiu. Ele diz que se sente feliz e honrado com essa dádiva. “Eu nasci e sempre fui criado pela minha mãe e pela minha avó. Isso para mim é natural, mas ao mesmo tempo é valioso, pois ela ajudou a minha mãe a me dar a vida. E eu tenho muitas imagens na minha cabeça dessa função dela, eu lembro das pessoas indo na nossa casa para pedir a ajuda, lembro dela saindo com uma maleta, sombrinha e lanterna”, recorda o neto da parteira.

Patrimônio Nacional

Neste mês de maio, o conselho consultivo do Iphan reconheceu o Ofício, Saberes e Práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil como Patrimônio Cultural do País. O presidente do Iphan, Leandro Grass, explica que o reconhecimento é uma forma ainda maior de valorizar o trabalho de milhares de mulheres espalhadas pelos interior do Brasil.

“Por muitas décadas o Brasil não tinha uma rede hospitalar e muitas crianças nasceram pelas mãos de parteiras, por isso esse reconhecimento é uma forma de perpetuar esses saberes”, pontua Leandro Grass.

O pedido para tornar o Ofício e Saberes das Parteiras Tradicionais em Patrimônio Cultural já havia sido solicitado ao órgão em 2011, mas foi negado. O Iphan considerou que o registro de patrimônio não era o instrumento mais adequado para a proteção de tais saberes. Na época, foi considerado um possível conflito de saberes entre as parteiras e os médicos tradicionais.

Para a família, a função de dona Rosalina se tornar patrimônio nacional é uma honra, uma vez que reflete em um ato de amor e coragem, mas que já não se vê mais como antes. "Hoje tudo já mudou muito, essa prática sempre foi muito frequente pelos interiores e hoje muita coisa já mudou. É muito importante virar patrimônio nacional para que as novas gerações tenham conhecimento", reflete a filha de Rosalina.

Na última semana, foi apresentado um projeto de lei na Assembleia Legislativa do estado pela deputada estadual Maria do Carmo PT para que as parteiras sejam declaradas patrimônio cultural do estado.

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