Morre aos 94 anos Carmen Vale, última testemunha histórica do ‘chupa-chupa’ em Colares
Moradora da comunidade do Ariri, agricultora ficou conhecida por relatar ataques misteriosos durante a Operação Prato, nos anos 1970

A agricultora Carmen da Conceição Vale, conhecida em Colares, no nordeste do Pará, como uma das testemunhas históricas dos ataques atribuídos ao fenômeno popularmente chamado de “chupa-chupa”, faleceu na madrugada deste sábado (6), aos 94 anos. Ela foi uma das principais personagens da época da Operação Prato, ação conduzida pela Força Aérea Brasileira (FAB) para investigar relatos de objetos voadores não identificados na região, entre 1977 e 1978. Segundo a família, ela era a última testemunha viva dos misteriosos relatos.
Notoriedade
De acordo com a neta, a biomédica Simara Vale, 43 anos, Carmen estava lúcida até poucos dias antes da morte, quando sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) e entrou em coma. “Ela faleceu essa madrugada, de sexta para sábado. Estava com 94 anos, super lúcida. Entrou em coma há sete dias e acabou partindo”, relatou.
Na década de 1970, Carmen ganhou notoriedade na região após relatar ter sido uma das pessoas afetadas pelas luzes misteriosas que apareciam no céu e atacavam os moradores de Colares e arredores. Os relatos deram origem à investigação oficial da FAB, conhecida como Operação Prato. O fenômeno, apelidado de “chupa-chupa”, ficou marcado por provocar sintomas físicos nas vítimas, como queimaduras, ferimentos e anemia.
Segundo Simara, a avó dizia que foi atacada enquanto dormia ao lado de uma neta pequena. “Ela dizia que estava deitada e uma luz clara, como uma tomada, desceu do telhado e tocou no braço dela. Ela ficou paralisada, não conseguia falar nem se mover”, contou. O que teria salvado Carmen foi o toque da criança em seu braço, o que teria feito o fenômeno recuar. “Ela ficou roxa, com febre, muito amarela. Na época, diziam que era o sangue sendo sugado”, relembra.
Legado
Moradora da vila de Ariri, próxima ao centro de Colares, Carmen viveu toda a vida no local. Agricultora, criou três filhos e mais de uma dezena de netos.
“Ela era muito forte, determinada, uma mulher guerreira e boa de coração. Sempre ajudava quem precisava”, destaca Simara.
Mesmo analfabeta, Carmen se tornou uma referência local e passou a ser considerada patrimônio histórico da comunidade. “A gente colocou esse título nela porque as pessoas iam até a casa dela ouvir os relatos. Ela já era a última viva daquela época, uma das últimas a testemunhar o que aconteceu”, diz a neta. Segundo Simara, inclusive pilotos de avião buscavam conversar com a avó. “Eles diziam que viam coisas no céu e iam até ela porque sabiam que ela entendia o que eles estavam falando”, relata.
Operação Prato e o fenômeno ‘chupa-chupa’
A Operação Prato foi uma investigação conduzida pela Força Aérea Brasileira (FAB) sobre supostos fenômenos aéreos não identificados no Pará, especialmente no município de Colares. Os moradores relataram ataques de luzes vindas do céu, que causavam lesões e deixavam as vítimas debilitadas.
A FAB produziu mais de 500 páginas de documentos e 16 horas de vídeos, mantidos em sigilo por anos. Parte desses arquivos foi liberada a partir de 2004, mas as causas do fenômeno permanecem sem explicação oficial. Médicos locais chegaram a relatar que diversas vítimas apresentavam sintomas de perda de sangue, mesmo sem ferimentos visíveis.
Carmen foi atendida em hospital na época, mas segundo a família, não chegou a ser formalmente interrogada pela investigação.
Memória
Apesar da projeção que Colares ganhou nacionalmente por conta da Operação Prato, a família relata que a comunidade do Ariri e a própria Carmen nunca receberam apoio ou reconhecimento institucional. “Ela sempre lutou por melhorias. Queria que o lugar tivesse sido mais valorizado. Mas nunca veio nada de concreto”, lamenta a neta.
Para Simara, o maior legado de Carmen é a força de uma mulher que amava profundamente sua terra e sua história. “Ela nunca saiu de lá. Educou os filhos com bondade, passou isso pra gente. Eu queria que ela fosse lembrada assim: por falar bem do lugar, dos filhos, por lutar para que Colares não fosse esquecida”, conclui.
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