Dia seguinte à abolição da escravidão é o "Dia do Abandono", diz ativista

Cinco atos do Mocambo no Pará ressaltam o lema "Vidas Negras Vivas"

Victor Furtado
fonte

No dia 13 de maio de 1888, a escravidão foi abolida no Brasil. Desde então, por 133 anos, a população preta do Brasil vem enfrentando o racismo. Algo que negros, por todo o planeta, seguem enfrentando. Mas algo que o Movimento Afrodescendente do Pará (Mocambo) destaca é que o dia seguinte à publicação da Lei Áurea, assinada pela princesa imperial Isabel, acabou com toda a esperança que aquilo significava. O dia 14 de maio de 1888 é considerado o "Dia do Abandono" e o primeiro dia do "racismo à brasileira".

Neste dia 13, o Mocambo promoveu cinco atos no Pará, sendo dois em Belém, um em Ananindeua, um em Bragança e um em Tomé-Açu. Na capital, um dos atos foi no complexo comercial do Jurunas. A programação visava o diálogo com uma comunidade, num ponto de alto fluxo de pessoas, que é predominantemente negra. É também o bairro sede do Mocambo. Esse diálogo, em pouco tempo, se mostrou necessário. Houve duas manifestações racistas durante o ato. Ao menos durante a presença dos jornalistas da Redação Integrada de O Liberal. À noite, o ato foi na praça da República.

O professor Domingos Conceição — escritor, pesquisador, especialista em estética negra e fundador do Mocambo — destaca que tudo o que é público precisa de planejamento e compromisso social. Do contrário, pode não haver participação popular. E foi assim que se deu a abolição da escravidão. "Apenas disseram que não havia mais escravidão. Naquele momento, foi esperança e alegria. No dia seguinte, foi abandono. Desde então, não temos nada a comemorar no 13 de maio. O dia precisa ser de protesto, de mostrar não só que 'Vidas Negras Importam'. 'Vidas Negras Vivas', vivendo, existindo e que precisam de respeito!", disse.

Enquanto Domingos falava, um homem não identificado gritou "Ainda tá falando aí, macaco?". O professor respirou fundo, mostrou uma expressão de desalento por debaixo da máscara e então seguiu: "É por isso que precisamos desse diálogo. Esse tipo de fala lamentável continua acontecendo. Pouco antes um um homem negro chegou para mim, aqui na feira, e me disse que não gostava de preto. A vítima da violência se vê nessa condição em que não gosta de si mesmo e não consegue se aceitar. O complexo do Jurunas foi um dos locais escolhidos até para saber como mobilizar essas pessoas da área", comentou.

image Domingos Conceição, membro fundador do Mocambo, ressalta que a luta pelo fim do racismo é longa e diuturna. E precisa, algumas vezes, ocorrer com a conscientização da própria população negra, que de tanto ser vítima do racismo , acaba reproduzindo a violência que sofre (Akira Onuma / O Liberal)

Para o membro fundador do Mocambo, a solução passa pela necessidade de respeito e percepção que pessoas negras são os alvos da violência e não são minoria. Para o ato, o Mocambo destaca que 56% da população brasileira é composta por pretos e pardos. Em Belém, a representatividade populacional é de 73%. Entre as vítimas de violência, 70% são jovens negros; pessoas que estão nas periferias, com os trabalhos mais mal remunerados, com os serviços públicos de menor qualidade e cercados por uma sociedade racista.

"Todas essas situações desfavoráveis são marcas do racismo estrutural. Só podemos reverter isso com um intenso trabalho de educação e conscientização. Podem achar que não, mas o racismo ainda é muito presente na nossa sociedade. Uma sociedade que não foi preparada para acolher essas pessoas negras, que viviam nas piores condições, com políticas públicas, com emprego, com respeito. E isso só muda com luta e agindo diuturnamente. As vidas negras estão vivas e precisam ficar vivas. Essa é nossa mensagem", concluiu Domingos Conceição.

Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Pará
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!

RELACIONADAS EM PARÁ

MAIS LIDAS EM PARÁ