Psica 2025: Dona Onete canta encantarias da Amazônia em 'Quatro Contas'
Show inédito recheado de atrações será neste domingo (14), no Mangueirão, como parte do festival, vai focar no lado místico da rainha do carimbó chamegado, e suas lembranças e ainda terá seus grandes sucessos
O show da cantora e compositora paraense Dona Onete, 86 anos, vai mostrar ao público do Festival Psica 2025 hoje (14) à noite, a partir das 20h no estádio Mangueirão, no Palco Güera Mercado Livre, apresenta-se como um convite ao público para percorrer as veredas encantadas da Amazônia. Isso porque a artista irá revelar muito de sua religiosidade em meio a canções inéditas e sucessos que marcam a sua carreira como uma das principais vozes do canto desse bioma. Essa viagem sonora e mística começa no tempo em que Onete, ainda criança, morou na casa de sua Tia Salu (Salustiana, hoje com 90 anos), na travessa da Vileta, no bairro da Pedreira, em Belém. Foi nesse imóvel que a cantora conheceu o intercâmbio com entidades de religiões afro-brasileiras/encantarias amazônicas, o que provocaria uma transformação radical na vida dessa senhora. Uma cabocla avisou Onete a voltar de Igarapé Miri onde morava para Belém, porque a felicidade a estava chamando. Ela veio e, aos 62 anos, se tornou a artista que é hoje.
O show inédito se chama "Quatro Contas" em referência e homenagem a quatro caboclas que sempre protegem Onete: Mariana, Jarina, Erundina e Jurema. Em um dos quatro blocos da apresentação, Dona Onete vai mostrar essa relação forte com as encantarias, além das músicas que a consagraram como a rainha do carimbó chamegado. Nesse clima, ela fez questão de que toda a ambientação prévia do concerto em que vai apresentar canções inéditas fosse feita na casa onde morou na travessa Vileta. Lá, a artista se reuniu com a anfitriã a Tia Salu, de 90 anos, com a prima Bené, a sobrinha Ester Sá, a neta Josivana Rodrigues, além da equipe.
Na casa de Tia Salu, Dona Onete viveu grande parte de sua vida. "Foi aqui que nasceu toda essa Dona Onete", conta a cantora. Ela acrescenta: "Foi aqui que começou toda a minha história, foi aqui que eu me criei, foi aqui que a minha infância foi a mais feliz do mundo".
Encantarias
Como relata Dona Onete, na travessa Humaitá, próximo da casa, havia um batuque (espaço de religião afro-brasileira) do senhor chamado Raimundo Silva, vendedor de peixe no Mercado da Pedreira. Onete conta que quando era menina ia com familiares e amigos até esse local. No dia 23 de abril, as pessoas nesse espaço celebravam Ogum e serviam um mingau em cuia ao público, inclusive, à própria Onete. Ela lembra muito bem desse momento.
Tempos depois, Dona Onete foi morar com a Tia Dadá, que chegou a atuar como curandeira. "Então, quando seu João da Mata baixou na cabeça de seu Linésio, lá pra banda do Guamá. Ele mandou acordar a gente que estava dormindo pra ir benzer, o seu João da Mata, na cabeça dele. Aí, nos acordaram, e a gente foi toda se balançando. E quando ele foi benzendo, disse: "Opa! Aqui eu encontrei Quatro Contas. Eu encontrei Mariana, Jarina, Erundina e Jurema". Ele disse as cores correspondentes a cada entidade. Onete tinha quase 11 anos de idade na época. O tempo passou, e a jovem esqueceu isso.
Mas, lá um dia, Dona Onete estava em um batuque em Igarapé Miri. Ela havia comprado um chapéu em Belém. E a entidade Mariana passou (em manifestação em uma mulher) e disse: "Ei! Manda buscar o meu chapéu!". Aí, Dona Onete deu o item para Mariana, que disse a ela as cores das entidades, e, então, a jovem entendeu o que havia acontecido com ela.
Tempos depois, Dona Onete já aposentada (atuou como professora) queria voltar para Belém, mas estava sem coragem, como relata. Porém, uma senhora de prenome Kátia, conhecida como curandeira, disse: "Olha, Dona Onete, a Caboca Jupira baixou ontem e disse que é para a senhora ir embora, que a felicidade está lhe esperando, a felicidade vai buscar a senhora!". Após algum tempo, Onete veio morar no bairro do Umarizal, em Belém, e, em sequência, mudou-se para o bairro da Pedreira, passando a residir na passagem Álvaro Adolfo.
Foi nesse bairro que ela começou a virada de vida. Conheceu o Coletivo Rádio Cipó e o Carimbó do Sancari (grupo tradicional desse gênero musical), onde deu uma canja, e aí descobriram a voz e gingado dela. Gradativamente, então, Onete foi se consolidando como a grande artista que é.
"A felicidade era isso. Eu tinha que vir buscar o que era meu", destaca a artista. Ela fez uma canção sobre essa passagem marcante na vida. Ela observa que as Quatro Contas a protegem desde menina: a vermelha é Mariana, a amarela é Jarina, a branca é Jurema e a verde é Erundina. A música "Quatro Contas" fala dessa relação da cantora com as encantadas. Além dessa, já lançada, tem ainda "Cobra Grande do Jatuíra" e "Festa no Reino da Encantaria", ambas não lançadas oficialmente.
Lisonjeada por ser a grande homenageada no festival neste ano, Dona Onete pretende transformar o show em um ritual cênico e sensorial, guiado pelos quatro elementos da natureza: água, fogo, terra e ar. A musicalidade dessa artista se mistura com poesia, cenas de filmes, performances e memórias.
Devota de Nossa Senhora de Nazaré, a cantora sabe também da força das encantarias amazônicas. E esse lado religioso muito presente na vida de Dona Onete é o que o público vai ter a oportunidade de ver mais de perto no show deste domingo (14).
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