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Arqueóloga e designer cria marca que resgata ancestralidade amazônica na produção de joias

"Hoje, eu sou mais arqueóloga que antes, mas sou uma arqueóloga que trabalha com arte”, explica Cristiane Martins

Caio Oliveira
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Nada é por acaso quando falamos do ser humano. Por mais que hoje em dia, o uso de acessórios como joias tenha perdido bastante de seu significado, algumas pessoas ainda acreditam na proteção que é representada por uma figa ou a fertilidade que um amuleto como o muiraquitã amazônico evoca. Para resgatar essa ancestralidade e simbolismo, a mestre em arqueologia e designer de joias Cristiane Martins apresenta sua marca, Amazônia Ancestral, que usa como base de suas criações os conhecimentos acadêmicos e técnicos acumulados ao longo de dezenove anos de pesquisa sobre nossa região.

Depois de uma carreira na arqueologia, Cristiane conta que decidiu mudar de ares e trabalhar com arte, se dedicando ao design. Contudo, em um ano difícil para os empreendedores, ela percebeu que podia aliar as duas coisas e criar um projeto único. “Na pandemia, eu tive que encontrar um diferencial para o meu trabalho, algo que justificasse a continuidade da minha marca e do meu projeto. Aí, eu mergulhei na arqueologia profundamente. A minha produção de 2020 é diferente do que eu fazia antes, por conta de eu ter trazido mais essas referências acadêmicas. Hoje, eu sou mais arqueóloga que antes, mas sou uma arqueóloga que trabalha com arte”, explica.

Em sua jornada para compreender melhor a complexidade da cultura amazônica, Cristiane aprendeu a marchetaria -  técnica de ornamentar superfícies planas, principalmente, a madeira - em Rio Branco, no Acre, onde viveu por sete anos. Sua marca nasceu em 2018 a partir desse conhecimento, com base ainda em suas imersões nos círculos de mulheres e em rituais com as medicinas tradicionais dos povos indígenas. Essas vivências indicaram outras direções e olhares para seus estudos sobre a ancestralidade amazônica, e ela investiu na magia que envolve a arte de se adornar com os elementos da natureza.

“Eu sou designer de joias, então, eu estou comunicando, desenhando beleza e a estética feminina através das joias. Hoje, eu encontro na arqueologia uma referência, uma base substanciada para falar de ancestralidade e de uso de recursos da floresta, do que se produz aqui em termos de manualidade. Acaba que eu embasei minha produção de joias no que se produz aqui na floresta, ancestralmente. Hoje, eu acho que não fiz uma transição de carreira, mas sim uma adição de carreira, e isso é muito legal”, comemora a arqueóloga e designer.

Ainda explicando sua produção, Cristiane reforça que realmente acredita nas funções originais dos amuletos, e em sua última coleção, investiu nos saberes tradicionais para ressignificar o uso de acessórios como fivelas. “Eu gosto de falar de energia nos meus trabalhos, de falar da posição das joias no corpo da mulher; não só como decoração, mas que tenha um significado, pois eu trabalho com o conhecimento popular e tradicional, também”, conta Cristiane, ao dar alguns exemplos. “As mulheres indígenas e de outras culturas ancestrais de outros lugares do mundo usavam muito as faixas para proteger o umbigo, que é uma prática muito antiga. Essas fivelas são os amuletos para a gente carregar no estômago, coisas que outras culturas antigas fizeram. Então eu trago muito essas referências para o meu trabalho”, conta Cristiane. Outro elemento muito comum em suas peças são as lanças, que além de proteção, também simbolizam poder.

Para a empreendedora, é recompensador resgatar esse conhecimento tão antigo e apresentar essa maneira de se relacionar com os objetos para seu público. “Eu acho bacana trazer isso para esse contexto contemporâneo, trazer o que os povos originários praticaram antes, e isso que é legal da arqueologia. A gente pesquisa como essas pessoas consideravam os objetos especiais, o que é completamente diferente da nossa sociedade moderna, em que as pessoas estão tão acostumadas a consumir e acumular coisas”, conta Cristiane Martins.

A paraense reproduz esse consumo consciente não apenas no conteúdo, mas na forma de suas peças: a matéria-prima da Amazônia Ancestral são os metais como a prata e a madeira de reuso, e Cristiane utiliza principalmente fragmentos de móveis antigos que são descartados. Para ela, os móveis produzidos com a madeira imbuia - principal espécie usada em suas criações - carregam muita história por causa de sua durabilidade e por isso, quando são descartados, vem com muita energia acumulada para ser retrabalhada.

“Eu gosto de escrever sobre isso no meu Instagram (@amazoniaancestral), sobre essas práticas antigas, sobre como antigamente, as pessoas usavam os objetos, e que não era só para decorar os corpos. O mercado das joias impulsiona muito as pessoas para a compra desenfreada, mas eu gosto de falar que antes, as pessoas usavam o objeto com uma certa inteligência, uma função, que não era só para decorar o corpo. A joia tem que ter uma história para se conectar com as mulheres, e eu vendo uma joia, mas entrego também um conteúdo histórico”, finaliza a artista.

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Cultura
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