Promotora de Justiça define como 'irresponsável e desumana' gestão da Pró-Saúde no Hospital Galileu

O Ministério Público do Estado do Pará pediu a indisponibilidade de R$ 14,5 milhões, dinheiro repassado pelo Estado e que deveria ter sido aplicado para cuidar da saúde da população paraense

Dilson Pimentel
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A gestão da Pró-Saúde no Hospital Galileu, em Belém, foi classificada como ‘irresponsável, desumana e dolosa com todas essas pessoas que necessitam do SUS’, segundo a avaliação da promotora Helena Muniz, do Ministério Público do Estado do Pará. O juízo sobre a atuação da organização social (OSS) daquele hospital resultou no pedido do MPPA de indisponibilidade de R$ 14,5 milhões, o que foi aceito pela Justiça.

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Esse dinheiro deveria ter sido aplicado para cuidar da saúde da população paraense. “São R$ 14,5 milhões de prejuízo à sociedade, ao estado. Esse dinheiro não foi revestido em serviços de saúde à população”, disse. Ainda segundo a promotora, o governo fez um investimento alto para essa OSS gerir aquele hospital.

“Eles têm todo um equipamento. Era só gerir com lisura, moralidade administrativa e não fazer o que fizeram com irresponsabilidade e dolo. Quando você assina um termo aditivo, autoriza um empréstimo, autoriza uma doação de recursos, situações que não estão previstas no contrato original, você está desassistindo o povo paraense, que ficou sem hemodiálise e outros serviços”, afirmou.

“Uma das coisas mais chocantes que detectamos é que os termos aditivos eram justamente para serviços que já estavam previstos no contrato (original). E, no contrato, estava muito claro o que eles tinham que fazer: prestar toda a assistência a usuários do SUS, ao povo paraense, na entrada e na saída do hospital. Isso envolvia serviços de fisioterapia, hemodiálise, atendimento médico, ambulatorial. Tudo”, afirmou a promotora Helena Muniz, que atua na Promotoria de Justiça de Tutela das Fundações Privadas, Associações de Interesse Social, Falência e Recuperação Judicial e Extrajudicial contra a Pró-Saúde Associação Beneficente de Assistência Hospitalar.

“E uma coisa interessante: até hoje o MPPA tem vitória. Porque, até hoje, esses R$ 14,5 milhões estão ‘presos’ na justiça. Eles entraram com 19 agravos de instrumentos e todos foram derrubados. O Judiciário paraense acatou a tese do MPPA, de que realmente essas pessoas agiram dolosamente, desviando recursos da saúde do povo brasileiro, de forma dolosa”, afirmou.

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Recursos públicos foram usados para pagar celulares e contas telefônicas particulares

Os recursos públicos foram usados, por exemplo, para pagar dois celulares dos diretores da organização (pouco mais de R$ 5 mil) e, também, para despesas com aluguel (mais de R$ 63 mil) para receber o pessoal que vinha de São Paulo, onde fica a sede administrativa da Pró-Saúde. “Não está previsto no contrato que o povo paraense vai pagar aluguel para o pessoal da Pró-Saúde”, disse.

Por essa razão, o MPPA ingressou, em outubro de 2020, com ação civil pública por ato de improbidade administrativa cumulada com pedido de indisponibilidade de bens. O objetivo da ação do MPPA, cujo processo está em andamento na Justiça, é obter a condenação de 13 pessoas e o ressarcimento dos valores ao erário público...., “em razão do desvio de finalidade e malversação das verbas do contrato de gestão número 11/Sespa/2014, recebidas pela OSS Pró-Saúde-Hospital Galileu, no ano-calendário de 2016”. A ação pretende também obter a condenação por danos morais coletivos, “em razão dos prejuízos causados à sociedade pelo desvio de recursos públicos vinculados”.

Esse contrato foi no valor de R$ 38 milhões. Só que, em vez de usar o dinheiro apenas no Galileu, a Pró-Saúde fez um “empréstimo” de R$ 11,5 milhões para os hospitais que, à época, ele administrava e, também, para a sede administrativa da entidade, em São Paulo.

 “Esses empréstimos não retornaram para o hospital Galileu em forma de ações e serviços para a população paraense”, disse a promotora Helena Muniz.

Os empréstimos foram feitos, à época, para o Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência, Hospital Oncológico Infantil, também em Belém, para os hospitais de Altamira e Marabá e para a sede administrativa da Pró-Saúde em São Paulo, que, aliás, recebeu a maior parte dos 11,5 milhões: R$ 6, 2 milhões.

O valor total do contrato para o hospital Galileu era R$ 38.171.200,00. Desse montante, R$ 34.171.200,00 deveriam ser destinados à remuneração do serviço de gestão da assistência em saúde e R$ 4 milhões para investimento na ampliação da estrutura física e aquisição de bens para melhoria do serviço ofertado à sociedade paraense. A assistência à saúde prestada em regime de hospitalização compreende o conjunto de atendimentos oferecidos ao paciente, segundo a patologia atendida, desde a sua admissão no hospital até a sua alta hospitalar.

Nesse contexto estão incluídos todos os atendimentos e procedimentos necessários para obter ou contemplar o diagnóstico e as terapêuticas necessárias para o tratamento no âmbito hospitalar, inclusive às relacionadas a todos os tipos de órtese, próteses e materiais. Assim como procedimentos de anestesia e procedimentos especiais de alto custo, como hemodiálise, fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional.

Ou seja: o contrato era para gerenciamento, operacionalização e execução de ações e serviços de saúde no Hospital Galileu, em regime de 24 horas por dia, assegurando assistência universal e gratuita exclusiva aos usuários do SUS.

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Prestação de contas da Pró-Saúde deu origem às investigações do MPPA

Em 2017, a Pró-Saúde prestou contas ao MPPA. Foi quando o setor contábil da instituição detectou as “inconsistências”, dando origem aos procedimentos na Justiça. “Detectamos empréstimos irregulares desses recursos que eram destinados à população paraense em serviços, em ações, em compra de materiais, em próteses, próteses. Mas esses recursos foram emprestados ou praticamente doados para outras unidades da Pró-Saúde aqui mesmo dentro do Pará e fora na administração da Pró-Saúde em São Paulo”, afirmou.

Outro detalhe: os diretores contratavam empresas para prestar serviços nesses hospitais. “O contrato não previa empréstimos irregulares”, disse. “Esses 14,5 milhões não foram utilizados para beneficiar a população. Os diretores contratavam suas próprias empresas para prestar serviço no próprio hospital, o que é uma imoralidade administrativa. Se você é um diretor de uma organização social, você não pode contratar sua própria empresa para prestar serviço na própria OSS”, afirmou.

A promotora também investiga a gestão da Pró-Saúde no Hospital Metropolitano, mas essa apuração está bem na fase inicial - ainda não há um parecer contábil, portanto.

A Secretaria de Saúde Pública (Sespa) informou que atualmente não há hospitais estaduais geridos pela Pró-Saúde no Pará. A atuação da organização social no Estado foi na gestão anterior ao governo atual, afirmou.

O que diz a Pró-Saúde

"A Pró-Saúde informa que realiza suas prestações de contas regularmente e segue rigorosos padrões de integridade e transparência. A instituição desconhece apuração em andamento sobre a gestão realizada no Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência”.

“Em relação ao Hospital Público Estadual Galileu, a entidade ressalta que já comprovou sua idoneidade em denúncia arquivada por falta de provas. A ação de improbidade citada está em fase inicial e não constitui prova de ilegalidade. O uso de recursos entre hospitais do mesmo Estado era transparente e de total ciência do contratante, que validava as prestações de contas mensalmente. Os empréstimos eram realizados em decorrência do atraso no repasso mensal feito pelo contratante, e assegurava que nenhum hospital tivesse suas atividades prejudicadas junto ao público assistido”.

“A Pró-Saúde ressalta, também, que a competência técnica para avaliação das contas da entidade cabe ao Tribuna de Contas e não aos demais órgãos”.

“Sobre os processos judiciais de cobrança citados, esclarece que são decorrentes da inadimplência de seus contratantes públicos”.

“É fundamental ressaltar que os contratos no Pará foram cumpridos integralmente dentro do prazo estabelecido. Em alguns casos, a entidade decidiu não participar do novo processo de concorrência para contratação do serviço”.

“Ao longo de mais de 25 anos, a Pró-Saúde construiu, em parceria com poder público e a iniciativa privada, uma história de sucesso no Pará. Gerenciando 11 unidades públicas e privadas ao longo dos anos, a entidade filantrópica realizou neste período mais de 31,8 milhões de atendimentos”.

“Segundo o Datafolha, um dos mais respeitados institutos de pesquisa do Brasil, nove em cada dez pacientes atendidos em hospitais sob gestão da Pró-Saúde aprovaram o serviço. A Pró-Saúde certificou, por meio da Organização Nacional de Acreditação (ONA) – a mais importante e respeitada entidade avaliadora da qualidade dos serviços de saúde do Brasil –, sete unidades paraenses, das quais cinco com nível máximo de excelência”.

“Entre as conquistas de destaque das unidades gerenciadas pela Pró-Saúde no Pará estão o primeiro lugar geral do Prêmio InovaSUS 2019, do Ministério da Saúde, para o Laboratório de Tecnologia Assistiva (Labta) do HMUE. No entanto, o maior case da Pró-Saúde é a gestão do Hospital de Campanha do Hangar. Principal referência para atendimento de casos graves da covid-19 no Norte do país, a unidade funcionou por cerca de 550 dias e atendeu mais de 7 mil pessoas, das quais 4,9 mil receberam alta”.

 

Desvio e uso indevido dos recursos públicos:

Despesas com aluguel – R$ 63.586,20

Compra de dois celulares – R$ 5.379,00

Despesas com contas telefônicas particulares – R$ 24.146,84

Empréstimos para outras unidades geridas pela Pró-Saúde e para a sede administrativa da organização, em São Paulo: R$ 11.590.347,53

Dinheiro que deveria ser investido no hospital Galileu e que foi desviado para outras finalidades: R$ 14.524,663,37

Todas essas despesas não estavam no contrato.

Fonte: MPPA

Pró-Saúde também é alvo de seis procedimentos no MPT Pará

O Ministério Público do Trabalho no Pará e Amapá informou que tem seis procedimentos ativos em que a Pró-saúde é parte. São eles: - Pró-Saúde (Associação Beneficente de Assistência Social e Hospitalar): 2 procedimentos judiciais ativos; Pró-Saúde (Associação Beneficente de Assistência Social e Hospitalar, cujo nome fantasia é A M S S Escritório Central): 3 procedimentos em fase de investigação (inquérito civil) e 1 procedimento judicial. Ainda segundo o MPT-PA/AP, os temas variam. “Há procedimentos sobre desvirtuamento de pessoa jurídica, Equipamentos de Proteção Individual e Coletiva, jornada, condições sanitárias no ambiente de trabalho, pagamento de verbas rescisórias e outros”.

Relembre decisões e protestos dos trabalhadores contra a Pró-Saúde:

Junho de 2023:

Em junho, após uma audiência de conciliação que durou uma hora e meia, representantes do Ministério Público do Trabalho do Pará, do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos e Serviços da Rede Privada de Saúde das Redes Sul e Sudeste (Sinthosma), do Sindicato dos Enfermeiros do Estado do Pará e da Pró-Saúde chegaram a um acordo para o pagamento imediato de R$ 10 milhões destinados aos 700 trabalhadores que foram dispensados, em abril deste ano, do Hospital Regional do Sul e Sudeste do Pará.

A desembargadora Francisca Oliveira Formigosa, coordenadora do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais e Solução de Disputa, explicou que a ação civil pública movida pelo Estado do Pará visava a depositar os valores referentes ao contrato de gestão 001/Sespa/2017 em juízo, a fim de efetuar o pagamento das verbas trabalhistas aos 700 funcionários dispensados do hospital.

29 de março de 2023:

Ex-funcionários da empresa Pró-Saúde interditaram parcialmente um trecho da travessa Lomas Valentina, entre as avenidas Romulo Maiorana e Almirante Barroso, em Belém, para cobrar salários atrasados. Com cartazes em mãos, os trabalhadores gritavam e cobravam o pagamento dos valores pendentes.

Segundo os ex-trabalhadores da Pró-Saúde, que administrava o Hospital Materno-Infantil de Barcarena Dra. Anna Turan (HMIB), após a rescisão contratual da Secretaria de Estado da Saúde do Pará (Sespa) com a terceirizada, o repasse do pagamento dos funcionários ainda não foi realizado e estaria atrasado há quatro meses.

1º de fevereiro de 2022:

No dia 1º de fevereiro de 2022, uma manifestação convocada pelo Sindicato dos Enfermeiros do Estado do Pará (Senpa) foi realizada em frente ao Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência, em Ananindeua, na Região Metropolitana de Belém. De acordo com a entidade que representa os trabalhadores, a categoria está há dois anos sem reajuste salarial.

O ato reuniu profissionais que atuam no próprio Metropolitano e no Hospital Oncológico Infantil Octávio Lobo, mas as reivindicações alcançam todos as seis unidades gerenciadas pela Pró-Saúde. Além dessas duas unidades, a organização social também administra o Hospital Regional do Baixo Amazonas, em Santarém, o Hospital Regional da Transamazônica, em Altamira, o Hospital Público do Sudeste, em Marabá e o Hospital Materno Infantil, em Barcarena.

7 de dezembro de 2022

Funcionários da empresa Pró-Saúde interditaram parcialmente a rodovia BR-316, para cobrar salários atrasados e parte do 13º. De acordo com os manifestantes, nenhuma posição foi dada sobre o prazo em que a situação será normalizada. Com cartazes em mãos, os manifestantes gritavam e cobravam o pagamento dos valores pendentes.

De acordo com quem participou do ato, a OS não estaria cumprindo com o pagamento dos colaboradores e faltando com os direitos trabalhistas após a demissão em massa que ocorreu no início de novembro. Salário do mês vigente, 13º salário, prazo e, até mesmo, as carteiras de trabalho estão desaparecidas das mãos dos ex-funcionários.

 

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Belém
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