Meninas na robótica: projeto da UFPA destaca protagonismo feminino na tecnologia
Grupo Iaçá reúne meninas de diversos cursos de graduação de exatas para projetos robóticos de diversos tipos, provando que pode existir protagonismo feminino na área de tecnologia
Quando o assunto é construção de robôs, o imaginário popular costuma lembrar de protótipos humanoides desenvolvidos por cientistas, quase sempre homens. O Grupo Iaçá: Robótica Feminina é um projeto da Universidade Federal do Pará (UFPA) que quebra esse estereótipo ao reunir mulheres, alunas de diferentes cursos da área de exatas, para criar robôs de variados tipos e finalidades, provando que pode existir protagonismo feminino nas áreas de engenharia e tecnologia.
O projeto de extensão é formado por 25 graduandas, coordenadas pela professora do Instituto de Tecnologia da UFPA, Ana Carolina Müller, que falou sobre a importância do protagonismo feminino em uma área “dominada” por homens.
“O projeto visa ser um suporte para as alunas de cursos de engenharia e ciências exatas como um vetor propagador de conhecimento em robótica. A gente busca ser um auxílio, uma rede de apoio para as alunas que já estão matriculadas, para que elas não se sintam desestimuladas, para que elas consigam começar e terminar os seus cursos. É um projeto desenvolvido por mulheres, para mulheres. Foi uma iniciativa das alunas, por volta de 2019, que sentiam falta desse suporte dentro dos seus cursos que têm, muitas vezes, uma presença masculina muito grande, o que faz com que elas se sintam muito sozinhas e desprestigiadas”, explicou.
O grupo não foca apenas na criação de robôs humanoides. As graduandas já desenvolveram diferentes tipos de projetos, como um piano robótico, por exemplo. Segundo a professora, a robótica é um campo vasto, e as alunas se dedicam com entusiasmo à exploração dessas múltiplas possibilidades, muitas vezes aliando a inovação com a sustentabilidade.
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“São projetos mais simples, por exemplo, um robô que anda, que desvia de algum obstáculo ou anda em um percurso determinado, tudo isso construído a partir do Arduino, que é uma placa de comando dos sistemas, e dos sensores que são acoplados a ele. Então, não são só robôs que andam, também pode ser um piano que toque uma música, um sensor de temperatura que faz com que ligue ou desligue um ar-condicionado, tudo isso é robótica, ainda que não seja um robô humanoide. A gente tenta trabalhar também com sustentabilidade, então também usamos elementos reaproveitados, como um papelão, um canudo, para mostrar também que a gente consegue adaptar coisas do dia a dia na tecnologia”, disse.
Financeiro impacta
Embora o grupo conte com 25 integrantes, apenas uma aluna recebe bolsa auxílio pela participação no projeto. As demais atuam de forma totalmente voluntária. Segundo a professora, a principal dificuldade para a expansão da iniciativa está justamente na falta de recursos financeiros.
“Toda a compra de equipamentos, as viagens em congresso ou que as meninas fazem, são todas feitas via campanha de arrecadação. Então, o que falta para a gente talvez conseguir avançar ainda mais é mesmo essa questão de financiamento. Por mais que a gente tente, todas essas ações ao longo dos anos são sempre muito difíceis, é sempre muito batalhado. Mas essa é a realidade, acho que de todos os projetos de extensão, não é exclusividade do nosso”, contou.
“Mas, investimos em divulgação, com trabalhos no Instagram, temos parceria com outros projetos para propagação, para divulgação, em eventos locais como Ciência na Ilha, por exemplo, a gente sempre faz questão de participar e divulgar o nosso projeto para trazer não só mais meninas, mas também maior visibilidade para ele”, completou.
Incentivo a meninas na tecnologia
Assim como acontece em diversos projetos de extensão universitária, o Grupo Iaçá também desenvolve ações voltadas à comunidade fora do ambiente acadêmico. Um dos principais focos é o trabalho com alunas do ensino médio, promovendo o incentivo à tecnologia e despertando o interesse de meninas em fase de formação com o “Clube de Ciências”.
“Então elas tiveram essa ideia de contribuir primeiro com o projeto para elas e depois estender fora da universidade. Então, foi criado através do Clube de Ciências, o nosso principal projeto, que visa mostrar para as meninas do ensino médio que a robótica também é para elas, para que elas tenham acesso a essa tecnologia que, muitas vezes, é desconhecida, muitas vezes sofre a barreira do preconceito de que ciências e engenharia não são para mulheres, e é sim. Então a gente tem esses dois pilares dentro do projeto”, explicou a professora.
Projeto também atrai meninas de fora
O Grupo Iaçá é dividido em quatro subgrupos: marketing, administrativo, técnico e eletromecânica. As graduandas, além da coordenação da professora Ana Carolina, também contam com a liderança da aluna Fernanda Soares, de 20 anos, do curso de Engenharia Elétrica da UFPA, que atua como coordenadora discente do projeto. Para ela, o projeto abriu portas dentro da universidade e no universo da engenharia.
“Quando eu entrei na UFPA, o meu irmão viu que eu tinha um semestre inteiro livre e me incentivou a entrar para o grupo, já que ele conhecia o projeto e algumas meninas. Ele disse que elas poderiam me ajudar a conhecer um pouco mais do curso. E aí eu vi que o Iaçá estava com o processo seletivo aberto e entrei. Foi mais por curiosidade, por querer conhecer um pouco mais de mulheres do meu curso e de vários outros, porque eu ia acessar vários cursos, além de conhecer mais a engenharia”, contou.
Para Fernanda, a própria timidez foi a maior dificuldade enfrentada no início da graduação, o que foi melhorando com as apresentações dos projetos de robótica com o Grupo Iaçá fora da universidade.
“Como é um projeto de extensão, a gente lida com pessoas de fora da universidade, em palestras e aulas, e eu ficava meio nervosa. Mas foi algo que consegui desenvolver muito bem, e hoje eu sou muito mais tranquila na hora das aulas, na hora das palestras. Já dei várias sobre o Iaçá, além de escrever artigos e participar de congressos, o que é muito legal”, disse.
A robótica e outras áreas da tecnologia já despertam o interesse de alunas de fora da UFPA, incluindo a Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) e instituições particulares. Segundo a professora Ana Carolina Müller, a meta é ampliar o projeto para que essas graduandas também possam participar. Para Fernanda, o grande atrativo está na oportunidade de vivenciar a prática profissional ainda durante a graduação.
“Eu quero seguir na engenharia, não pretendo seguir na área acadêmica, mas o Iaçá é realmente importante para botar a mão na prática, lidar com os problemas do uso físico, porque na sala de aula a gente lida muito com simuladores. E é em projetos que a gente realmente lida com a montagem, com as dificuldades, com todos esses problemas. O Iaçá ajuda muito nisso”, completou.
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