Professora questiona se o sistema eleitoral brasileiro ainda garante a plena democracia, em Belém
Durante o Fórum Nacional Verdemocracia, professora alertou sobre os riscos das novas tecnologias aos pilares da democracia e defendeu o voto livre como cláusula essencial do sistema

No segundo dia do Fórum Nacional Verdemocracia, realizado nesta terça-feira (16/09), em Belém (PA), Marilda Silveira, profssora do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), trouxe uma reflexão incisiva sobre os impactos das novas tecnologias no sistema eleitoral brasileiro. Durante o painel “Processo Eleitoral e Novas Tecnologias”, promovido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em parceria com o Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE-PA), a professora questionou se o atual modelo democrático ainda é capaz de cumprir a promessa feita pela Constituição de 1988.
Democracia em xeque: “uma máquina dentro da máquina”
Ao iniciar a fala, Marilda Silveira propôs uma metáfora provocadora sobre o sistema eleitoral.
“A máquina do processo eleitoral é uma máquina que entrega cadeiras quando a gente coloca voto. É a convenção da nossa comunidade em cadeiras. A minha pergunta é: essa máquina ainda funciona nesse mundo novo?”, questionou.
Segundo ela, o desafio atual é compreender se o sistema político-eleitoral, desenhado há mais de três décadas, ainda dá conta de garantir os fundamentos da democracia diante da avalanche de inovações tecnológicas e seus impactos sociais e informacionais.
Liberdade do voto: cláusula não dita, mas essencial
Marilda lembrou que, embora a liberdade do voto não esteja explicitamente descrita como cláusula pétrea na Constituição, ela é o alicerce do sistema democrático.
“A gente tinha tanta confiança na liberdade do voto, que, se vocês forem olhar lá nas cláusulas pétreas, só fala que o voto periódico é cláusula pétrea. Mas o voto periódico só faz sentido se ele for livre”, afirmou.
A professora defendeu que essa liberdade deve ser entendida como pressuposto da democracia, sobretudo em tempos em que a manipulação de informações e os usos questionáveis da inteligência artificial ameaçam a autonomia do eleitor.
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Impactos, valores e a crise do discernimento
Durante sua explanação, Marilda destacou a importância de separar fato de valor — uma distinção fundamental, segundo ela, para entender como as novas tecnologias interferem na democracia.
“Quando a gente fala que a chuva é boa, eu tenho um fato, que é a chuva. E eu tenho um valor, que é o ‘boa’. Esse ‘boa’ muda com o tempo. É um exemplo que eu aprendi com a professora Marilena Chauí”, disse.
Ela afirmou que o maior desafio talvez não seja apenas combater a desinformação, mas compreender como essas tecnologias moldam os valores das pessoas.
“A gente está muito obcecado em tentar encontrar formas de entregar para as pessoas fatos verdadeiros. Isso é importante? É. Mas talvez seja a tarefa mais fácil. A mais difícil é lidar com os valores — porque eles formam quem nós somos e as decisões que nós tomamos”, refletiu.
Entre poder e violência: qual o remédio certo?
Ao final, Marilda fez uma distinção crucial entre os conceitos de poder e violência, alertando que as novas ferramentas digitais, se mal utilizadas, podem confundir os dois.
“Poder é conseguir convencer o outro de fazer o que eu quero. Eu também consigo fazer o outro fazer o que eu quero com uma arma, mas isso não chama poder. Isso chama violência. E o remédio para lidar com o poder e o remédio para lidar com a violência são remédios diferentes”, analisou.
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