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Cerca de 30 denúncias de violações de direitos humanos são registradas por dia no Pará

Nesta terça-feira (12/8), é celebrado o Dia Nacional dos Direitos Humanos e que reforça o compromisso do Brasil com a proteção e a promoção dos direitos fundamentais de todos os cidadãos

Saul Anjos

Cerca de 30 denúncias por dia de violação de direitos humanos foram registradas de janeiro deste ano até segunda-feira (11/8), no Pará. Os números são do painel de dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, que engloba a quantidade desse tipo de situação envolvendo uma vítima e um suspeito, que pode conter uma ou mais violações na mesma denúncia. Ao todo, 6.792 denúncias foram computadas neste período. O Dia Nacional dos Direitos Humanos, criado em homenagem à líder sindical Margarida Maria Alves, é celebrado nesta terça (12/8) e reforça o compromisso do Brasil com a proteção e a promoção dos direitos fundamentais de todos os cidadãos.

A advogada Suena Carvalho Mourão, especialista em direito administrativo e ex-presidente da Comissão Nacional de Promoção da Igualdade do Conselho Federal (CFOAB), conta que esta data lembra que, no Brasil, “defender direitos básicos pode custar a própria vida, e que a violência contra quem se levanta contra injustiças ainda é uma realidade”. Segundo ela, os direitos precisam ser protegidos todos os dias.

“Todos deveríamos ter acesso pleno ao direito à vida digna, à igualdade de oportunidades, à educação de qualidade, à saúde integral e à liberdade de ser e existir sem medo. Esses direitos são indivisíveis e interdependentes: negar um é fragilizar todos. Na prática, isso significa garantir segurança alimentar, acesso à moradia, combate à discriminação, inclusão social e respeito à diversidade. Não se trata apenas de um ideal, mas de uma obrigação legal e ética do Estado e da sociedade”, explicou.

Suena ressalta também que as maiores violações de direitos humanos ocorrem com a população negra, povos indígenas, mulheres, comunidade LGBTQIA+, PCDs, pessoas em situação de rua, imigrantes e pessoas que vivem em áreas periféricas.

“São grupos que enfrentam não apenas a ausência de políticas públicas adequadas, mas também o peso histórico do racismo, do machismo e de outras formas estruturais de opressão. Para mudar esse cenário, precisamos de políticas afirmativas robustas, orçamento público comprometido e fiscalização efetiva. É fundamental incluir essas populações na formulação das políticas que lhes dizem respeito: nada sobre nós sem nós”, afirmou.

A advogada ponderou avanços importantes na asseguração do tema, como, por exemplo: ampliação do arcabouço legal de proteção, como a Lei Maria da Penha, o Estatuto da Igualdade Racial, o reconhecimento jurídico das uniões homoafetivas e a criação de políticas afirmativas em universidades e concursos públicos.  “Essas conquistas nasceram de décadas de luta de movimentos sociais e da pressão por um Estado mais inclusivo”, explicou.

O trabalho da Seirdh

Em nota, a Secretaria de Estado de Igualdade Racial e Direitos Humanos (Seirdh) informou que, em 2025, atendeu 47 denúncias de violações de direitos humanos no Pará. Em 2024, a Seirdh atendeu 77 demandas. Segundo a Secretaria, as principais demandas tratam sobre luta pela posse da terra, racismo, racismo religioso, violação de direitos e violência contra a população LGBTQI+.

A Seirdh, que foi criada em abril de 2023 com a missão de planejar e executar políticas públicas voltadas à proteção de diversos grupos vulneráveis e ao combate a violações, comunicou também que vem desenvolvendo iniciativas inovadoras e estruturadas em múltiplos eixos para a promoção dos direitos humanos.

Entre os principais projetos e políticas atuais da Seirdh, estão: Direitos Humanos nas Escolas, Juventude Empreendedora, Funtrad - Projeto Resgata Pará, Empodera, Observatório de Direitos Humanos do Pará, Educação do Olhar Inclusivo, Interiorização das Políticas e Leis para Educação Quilombola e Antirracista, Política de Memória, Verdade e Reparação, Conferências Estaduais, Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM).

A Seirdh abriga atualmente nove conselhos estaduais, tendo sido responsável pela implantação do décimo conselho, voltado à promoção de políticas para comunidades pela reativação de alguns que estavam paralisados, e está em processo de quilombolas, conforme Decreto nº 4.372/2024.

De acordo com a Secretaria, A atuação desses conselhos é paritária, envolvendo representantes do Governo do Estado e da sociedade civil, e contribui de forma decisiva para o avanço das pautas de direitos humanos, igualdade racial, juventude, diversidade sexual, combate à tortura e trabalho escravo no Pará.

As principais violações

A Seirdh informou que o Pará é o estado com maior número de conflitos de terra do Brasil, liderando em massacres e mortes no campo. “Os principais provocadores dos conflitos são fazendeiros, grileiros e garimpeiros, o que coloca comunidades indígenas, quilombolas e pequenos agricultores sob constante ameaça de invasão, intimidação e violência armada”, disse.

“Há aumento expressivo nas denúncias de racismo, principalmente após a expansão de canais de combate a crimes discriminatórios. O Pará é o único estado da Amazônia com delegacia especializada para esse tipo de crime. Casos de injúria racial entre estudantes, principalmente cotistas, em universidades e escolas, têm gerado mobilização e protestos por providências”, destacou.

Ainda conforme a Seirdh, o estado registra centenas de denúncias anuais de violência contra idosos, sendo a violência financeira a mais comum, seguida por agressões físicas e negligência, sendo a maior parte dos casos em Belém.

Com relação à população LGBTQIA+, a Secretaria apontou o enfrentamento de violações em múltiplos setores: na saúde (dificuldade de acesso a tratamentos, como para HIV), na educação (discriminação no uso de banheiros universitários e hostilidade nas salas de aula) e no sistema carcerário (transferência para presídios de maior risco, falta de assistência médica e respeito à identidade de gênero).

Além disso, a Seirdh falou também sobre feminicídio e violência contra a mulher. “Municípios como Ananindeua lideram estatísticas nacionais de feminicídio, com alta vulnerabilidade para mulheres negras e periféricas. O cenário demanda ações conjuntas de políticas públicas e apoio internacional”, frisou.

A Secretaria, por fim, comentou que a violência contra defensores de direitos humanos também está entre os principais registros. “O Pará é o estado com o maior número de violações contra defensores de direitos humanos: entre 2019 e 2022, foram registradas 143 ocorrências, inclusive assassinatos. A maior parte relacionada à defesa de territórios, meio ambiente e populações tradicionais”, pontuou.

Avanços nas políticas públicas

A Secretaria de Igualdade Racial e Direitos Humanos reforçou que, nos últimos anos, o Pará tem promovido avanços significativos nas políticas públicas de direitos humanos. Entre eles, a Seirdh destacou a criação da própria secretaria, que permitiu maior foco e eficiência no atendimento a grupos vulneráveis, e o fortalecimento da participação social por meio de conferências e reativação de conselhos.

“Houve ampliação de ações de promoção da igualdade racial, inclusão social da população LGBTQIA+ com programas como o EMPODERA+, e iniciativas voltadas à geração de emprego e renda para a juventude. A criação do Observatório de Direitos Humanos trouxe maior produção e transparência de dados, enquanto políticas para pessoas com deficiência, como a ‘Educação do Olhar Inclusivo’, reforçaram a inclusão e o combate ao capacitismo. Também ocorreu a interiorização das políticas para alcançar municípios do interior e o fortalecimento da articulação com órgãos federais e sociedade civil, consolidando o Pará como referência nacional em iniciativas intersetoriais e inclusivas”, observou.

O planejamento

Para este ano e 2026, a Secretaria contou que planeja dar continuidade ao investimento em atendimento direto à população e na ampliação das ações educativas voltadas para a promoção e defesa dos direitos humanos.

Entre as iniciativas previstas, há o lançamento de uma pós-graduação voltada à temática dos direitos humanos e igualdade racial, fruto de uma parceria estratégica com a Escola de Governança Pública do Estado do Pará (EGPA). O protocolo de intenção para viabilizar o curso será assinado nesta terça-feira (12/8), na sede da própria secretaria, marcando um passo importante para a capacitação de servidores e lideranças sociais.

“Além disso, a SEIRDH pretende fortalecer programas já existentes, ampliar a interiorização das políticas públicas, intensificar campanhas educativas contra discriminação e violência, e aprimorar a produção de dados por meio do Observatório de Direitos Humanos, garantindo que as ações cheguem a todos os municípios paraenses de forma integrada e participativa. A SEIRDH também tem como meta para este período consolidar e ampliar parcerias estratégicas com as comunidades quilombolas, fortalecendo as políticas públicas voltadas a esses territórios tradicionais”, relatou.  

“Nesse sentido, está previsto o lançamento do Conselho Estadual Quilombola, que funcionará como espaço permanente de diálogo, formulação e monitoramento de ações específicas para a promoção da igualdade racial, garantia de direitos territoriais e valorização cultural. A iniciativa busca assegurar que as demandas apresentadas pelas lideranças quilombolas sejam incorporadas ao planejamento estadual, impulsionando o desenvolvimento sustentável, a proteção do patrimônio histórico e a preservação das tradições desses povos”, finalizou.

Proteção aos mais vulneráveis

“É muito simbólica a data que faz memória a uma mulher em um país que mata as mulheres nessa estrutura machista e patriarcal”, afirmou Eliana Fonseca, coordenadora geral da Sociedade Paraense em Defesa dos Direitos Humanos (SDDH).

Segundo ela, a lei que criou a data é um instrumento de conscientização e reflexão sobre a importância da promoção e defesa dos direitos humanos, especialmente para os mais vulneráveis. “Persiste a necessidade de lutarmos pela dignidade da pessoa humana em sua integralidade, como o direito à terra, à moradia, à cultura, ao lazer e de enfrentar todas as formas de violência contra mulheres, crianças, a juventude da periferia e a comunidade LGBTPIAPN+”, declarou.

A SDDH, fundada em 1977 por lideranças como Paulo Fonteles, atua historicamente na resistência contra violações ocorridas durante a ditadura militar. Hoje, a instituição mantém ações voltadas à formação e engajamento de lideranças por meio do curso anual de Direitos Humanos, que reúne trabalhadores rurais, indígenas, militantes do movimento negro e representantes de comunidades urbanas. Também articula uma rede de comunicadores e publica semestralmente o Jornal Resistência, fundado há 47 anos.

No campo jurídico, a entidade acompanha conflitos agrários, impactos das mudanças climáticas e casos de violações cometidas por agentes do Estado ou terceiros. Em 2024, divulgou o Cadernos da Resistência, revelando que 142 defensores e defensoras de direitos humanos estão ameaçados no Pará.

Entre os grupos mais vulneráveis, Eliana cita povos do campo, das águas e das florestas, mulheres, crianças e adolescentes. Ela destaca dados do Atlas da Violência que mostram salto de 35 mil para mais de 115 mil casos de violência contra crianças e adolescentes entre 2013 e 2023. “A violência tem várias facetas, do abandono à violência física, psicológica e sexual”, pontuou.

Ao avaliar avanços e retrocessos, a coordenadora lembrou conquistas como o voto feminino, a Constituição de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, mas alertou para perdas recentes. “Enfrentamos retrocessos, como mudanças na legislação ambiental, no ECA e nas leis trabalhistas, além de ameaças à liberdade de imprensa”, observou.

Para ela, o maior obstáculo atual para efetivar políticas públicas é o avanço da extrema direita no Congresso Nacional. “Todas as conquistas históricas sofrem ataques desses grupos. A democracia, conquistada a custo de sangue de tantos mártires, sofre ameaça de pessoas que recentemente tentaram dar um golpe para voltar aos tempos de autoritarismo”, concluiu.

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