Expansão da Starlink acelera inclusão digital em áreas rurais na Amazônia

Da educação digital em comunidades indígenas e quilombolas a serviços públicos, a conectividade via satélite reduz desigualdades históricas

Fabyo Cruz
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A expansão da internet via satélite na Amazônia tem provocado mudanças profundas na forma como moradores de áreas rurais, ribeirinhas, indígenas e quilombolas acessam educação, serviços públicos e oportunidades econômicas. No Pará e em outros estados da região Norte, a tecnologia da Starlink passou a ocupar um papel estratégico tanto em políticas públicas de conectividade quanto em iniciativas comunitárias e empreendedoras, reduzindo desigualdades históricas de acesso à informação e aproximando territórios antes isolados do ambiente digital.

Até poucos anos atrás, a exclusão digital era uma realidade predominante no campo. Em 2016, apenas cerca de uma em cada três pessoas que viviam em áreas rurais brasileiras utilizava a internet. Em 2024, esse cenário mudou de forma significativa: o acesso chegou a aproximadamente 84% da população rural, um crescimento de quase 150% no período, segundo dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O avanço é atribuído a uma combinação de fatores, como a ampliação das redes móveis, políticas públicas de conectividade e, de forma cada vez mais relevante, o uso de internet banda larga via satélite em regiões onde a infraestrutura tradicional não chega. 

No Pará, a presença da Starlink se espalhou rapidamente por cidades grandes e pequenas, vilas e comunidades mais isoladas.  Os dados mais recentes disponíveis em nível estadual, de alguns meses atrás, indicam que o Pará já ultrapassa a marca de 50 mil usuários da tecnologia, com uma distribuição bastante ampla pelo território. Essa capilaridade tem permitido que escolas, postos de saúde, associações comunitárias e pequenos empreendimentos passem a operar com maior estabilidade de conexão, mesmo em áreas de difícil acesso.

A conectividade também tem transformado a realidade de comunidades quilombolas próximas aos centros urbanos, mas historicamente mal atendidas pelas operadoras tradicionais. No Quilombo do Abacatal, em Ananindeua, na Região Metropolitana de Belém (RMB), a liderança afro-religiosa Turi Omonibo, de 39 anos, relata que o sinal de internet sempre foi precário devido à densa cobertura vegetal do território. “A gente não tem cobertura de internet convencional. O sinal sempre foi muito fraco, especialmente na sede comunitária, onde acontecem reuniões e eventos”, conta.

A chegada da Starlink ocorreu por meio de um projeto voltado a povos e comunidades tradicionais, com a instalação do equipamento em um espaço coletivo da associação de moradores. “Foi muito bem aceita. Em eventos grandes, com muita gente usando ao mesmo tempo, a conexão não caía e a velocidade não reduzia tanto”, relata Turi. Segundo ela, a internet passou a ser usada para pagamentos via Pix, ligações, videoaulas, reuniões online e conferências. “Para nós, foi uma excelente oportunidade, porque hoje quase tudo depende da internet”, afirma.

Além de facilitar atividades cotidianas, a conectividade fortalece a organização comunitária e a autonomia econômica. Em eventos culturais e reuniões, a possibilidade de realizar transações digitais e transmissões online amplia a visibilidade do território e reduz barreiras logísticas. “A Starlink foi muito boa para a nossa realidade. Cada território tem suas especificidades, mas, para nós, funcionou muito bem”, avalia a liderança quilombola.

Realidade no Amazonas

Um exemplo concreto desse impacto vem da educação digital. O professor empreendedor João Águila, 33 anos, é fundador e CEO de uma startup que atua com formação em tecnologia para jovens, adultos e crianças de comunidades indígenas, ribeirinhas e rurais da Amazônia. A iniciativa surgiu a partir de sua própria trajetória. “Quando criança, não encontrei escolas que ensinassem informática na minha cidade. Tive que aprender sozinho. Anos depois, comecei a ensinar informática no Cetam e percebi que muitas crianças ainda não tinham essa oportunidade”, relata.

Atualmente sediada em Benjamin Constant, no Amazonas, a Águila Hikari mantém uma escola física e uma plataforma digital que atende toda a região do Alto Solimões e do Vale do Javari. Em dois anos, cerca de 170 alunos já foram formados. Segundo Águila, a conectividade via satélite foi essencial desde o início do projeto. “Antes, a internet tradicional era instável ou simplesmente inexistente em muitas comunidades. Nossos cursos eram quase totalmente presenciais, o que limitava muito o alcance. Com a Starlink, conseguimos desenvolver a plataforma, operar sem travamentos e oferecer modalidades híbridas e EAD”, afirma.

O impacto foi imediato. Hoje, a startup atende estudantes que vivem a mais de 500 quilômetros de distância, incluindo professores e alunos de aldeias no Vale do Javari. “Temos estudantes indígenas que acessam a plataforma pelo notebook ou celular, algo impensável alguns anos atrás. A melhoria da conexão aumentou o engajamento, permitiu o uso de conteúdos sobre inteligência artificial, editores de texto e ferramentas digitais, além de tornar a aprendizagem mais dinâmica”, explica. A iniciativa também avança no respeito às especificidades culturais, com o desenvolvimento de cursos em Língua Ticuna e Espanhol.

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