Livrarias se reinventam após queda de 43% no faturamento do setor editorial
Com retração nas vendas, livrarias de Belém apostam na formação de público e em ações culturais para resistir à crise do mercado editorial

A leitura é um hábito que estimula o desenvolvimento emocional, a criatividade, amplia o vocabulário e melhora a comunicação. No entanto, o setor responsável por abastecer as estantes dos leitores brasileiros enfrenta uma retração de 43% no faturamento real das vendas ao mercado entre 2006 e 2024, segundo a Pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro, divulgada em julho.

Na capital paraense, os desafios se repetem. Uma das poucas livrarias de rua de Belém busca estratégias para atrair novos leitores e manter o mercado aquecido. Pedro Gama, diretor do espaço, afirma que o foco está na formação de público:“Investimos em bons livreiros, em uma curadoria cuidadosa e pensada para atrair novos leitores. Além disso, desenvolvemos projetos que mostram que, embora a leitura seja um ato solitário, ela não precisa acontecer no isolamento".
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Livros digitais ganham espaço
Apesar da queda nas vendas de livros físicos, os livros digitais e os audiobooks registraram crescimento expressivo. Nos últimos cinco anos, o segmento cresceu 158%. Em 2023, o faturamento real das editoras com conteúdos digitais teve alta de 32,7% em relação ao ano anterior.
Mesmo com esse avanço, muitos leitores continuam fiéis ao impresso. A estudante de Geografia Maria Eduarda relata: “Eu prefiro livros físicos, muito por influência do meu pai. Já li muitos livros digitais, especialmente na universidade, mas nada substitui a experiência de estar em uma livraria, tocar os livros, ler as sinopses, sentir a capa. Comprar online não tem o mesmo impacto".

Pedro Gama acredita que a escolha entre físico e digital está mais ligada ao comportamento do público do que à tecnologia em si.“As pesquisas mostram que há públicos distintos: alguns consomem apenas audiobooks, outros apenas e-books. Mas a maioria das pessoas consome os três formatos — físico, digital e em áudio. Com o aumento do uso de telas e o cansaço digital, o livro impresso se torna uma alternativa mais saudável".
Desafios para manter livrarias ativas
Para que uma livraria de rua se mantenha ativa, é necessário enfrentar grandes obstáculos, como a concorrência com plataformas internacionais.“Essas empresas usam a venda de livros como isca para coletar dados e alimentar algoritmos, o que cria uma competição desigual”, afirma Pedro.
Outro ponto sensível é a percepção de que o livro é caro.“Muitas pessoas acham o livro caro e, considerando a desigualdade social do Brasil, isso pode até fazer sentido. Mas, quando refletimos que o preço médio de um livro — entre R$ 59,90 e R$ 69,90 — é semelhante ao de uma pizza, uma blusa ou uma ida ao bar, essa percepção se mostra equivocada. O livro tem um valor simbólico e cultural que precisa ser reconhecido".
Há ainda os desafios logísticos. O frete elevado para trazer livros do Sudeste, principalmente de São Paulo e Rio de Janeiro, encarece ainda mais a operação. Mas, para Gama, o maior problema está na base: “A maior dificuldade é a mesma enfrentada no Brasil inteiro: a queda no número de leitores. Para que uma livraria como a nossa continue existindo, precisamos formar e manter leitores constantes".
Para manter os consumidores interessados e ativos, o local investe em clubes de leitura, rodas de conversa e leituras de poesia em voz alta — ações que reforçam seu papel como centro cultural e espaço de convivência. “A livraria não é apenas um espaço comercial; é um lugar de mediação cultural. O livreiro, acima de tudo, é um mediador cultural”, conclui Pedro Gama.
*Thaline Silva, estagiária de jornalismo, sob supervisão de Keila Ferreira, coordenadora do núcleo de Política e Economia
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