Do flanelinha ao home office: Pará tem 60% de trabalhadores informais
Supervisor técnico do Dieese, Everson Cardoso, defende regulação de novos modelos de trabalho

No Pará, quase 60% dos trabalhadores atuam na informalidade, segundo levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese-PA), realizado em fevereiro deste ano. O supervisor técnico da entidade, Everson Cardoso, defende que esse cenário reflete a modernização dos modelos de trabalho, que ainda precisam de regulação, além de fatores como a falta de qualificação. A aceitação desses novos modelos tem crescido entre os trabalhadores paraenses, mas a regulamentação de alguns deles ainda é essencial.
O estudo do Dieese utiliza dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados indicam que o percentual de informalidade no estado supera o da Região Norte e dos demais estados brasileiros. Até o fim do ano passado, cerca de 4 milhões de paraenses estavam no mercado de trabalho; desse total, 2,3 milhões eram informais.
Cardoso destaca o crescimento da uberização trabalho, comum nas novas atividades informais, impulsionadas por tecnologias recentes. Trabalhadores de aplicativos, como entregadores de comida e motoristas, ilustram essa realidade. Nesse contexto, falta uma regulação específica que proteja ou garanta direitos trabalhistas a essa nova categoria, impulsionada, em especial, pela pandemia da Covid 19.
“As plataformas ainda caminham para serem legalizadas e compreendidas aqui no âmbito da legislação trabalhista. Temos milhares de trabalhadores nessa modalidade, como mototáxi, trabalhadores por aplicativo, aqueles que fazem as entregas. É uma realidade nova desse mundo do trabalho, mas uma realidade precarizada porque ela entra no formato de trabalho que até então a legislação trabalhista não previa”, avalia o supervisor.
Ele também aponta fatores como a falta de qualificação da mão de obra e o debate ambiental. Na sua avaliação, muitos desses elementos foram intensificados pela pandemia, resultando em formatos mais flexíveis, porém com menos qualidade.
“Esse reflexo da informalidade aliado a todo esse movimento é fruto dessas mudanças que vivemos na pandemia, fruto dessa flexibilização, fruto da reforma trabalhista, mas, acima de tudo, trazendo para um recorte regional, falando de um mercado de trabalho amazônico, nós temos grandes déficits educacionais, com uma baixa qualificação de mão de obra”, afirma Cardoso.
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Na prática
Márcio Seixas, flanelinha há 25 anos em Belém, reflete o cenário descrito pelo Dieese. O autônomo já trabalhou com carteira assinada, mas prefere sua rotina atual, já que, no modelo tradicional, enfrentou chefes abusivos. Agora, prioriza flexibilidade de horários, mesmo sem benefícios legais.
“Trabalho para ajudar minha família. Fiquei um ano com carteira assinada em uma pizzaria, mas não quero mais isso. A gente sofre muita humilhação. Meu dinheiro tem sido abençoado. Não tenho benefícios, mas faço meus horários: começo às 7h, paro para almoçar e volto à noite”, conta.
Outro exemplo é o home office, que dispensou a presença física nas empresas. Luiz Rosa, analista de redes e mídias sociais de uma rede de beleza, em contratação formal com carteira assinada, adotou o modelo na pandemia e o mantém desde então. Ele destaca a ausência de deslocamentos, a troca com profissionais de diferentes regiões e a melhora na qualidade de vida.
“Prefiro o trabalho remoto. Ele me proporciona mais qualidade de vida. O simples fato de não passar horas preso no trânsito já melhora meu humor, minha saúde e meu rendimento. Além disso, tem a liberdade geográfica, que é um dos maiores benefícios. Já trabalhei enquanto estava no Chile e meus colegas espalhados em diferentes estados do país, isso cria uma troca cultural e profissional muito rica, que seria bem mais difícil de acontecer num modelo presencial”, explica.
Sua primeira experiência remota foi durante a pandemia, quando a empresa adotou o modelo devido ao fechamento dos serviços. “Percebi o quanto esse modelo fazia sentido para mim. Infelizmente, em meados de 2021, houve uma decisão de retorno obrigatório ao presencial, e isso me fez repensar completamente o que eu queria para o meu futuro profissional”. Desde então, migrou para um trabalho totalmente remoto.
“No presencial, a gente acaba perdendo muito tempo, e energia, no trânsito ou em transporte público lotado, especialmente em cidades grandes. No home office, esse tempo vira descanso, atividade física, café da manhã com calma ou até uma entrega feita com mais foco e menos estresse”, conclui.
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