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Desenvolvimento econômico aliado à preservação ambiental será desafio de Lula no Pará

Especialistas veem o meio ambiente como pauta principal do próximo governo, mas que deve ser aliada à expansão do agronegócio, indústria e exportações

Elisa Vaz
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A economia do Pará pode ser impactada pela vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas urnas. Com o fim da disputa e o período de transição entre os governos, que segue até a posse do novo eleito, o setor produtivo se prepara para um novo mandato, que exigirá um esforço extra do petista: conciliar os interesses dos setores econômicos e a agenda de retomada econômica após a pandemia com a garantia da preservação ambiental.

Em relação ao agronegócio e à indústria, o economista Mário Tito Almeida acha que a abordagem do próximo governo será diferente do atual, mas não prejudicial. Ele diz que o agro teve um grande impulso nos últimos tempos e vai continuar tendo, mas deve haver uma redução do financiamento dos setores enquanto fator preponderante da balança comercial em detrimento da agricultura familiar. "A proposta do governo que vai entrar não se dá com a diminuição do agronegócio, mas com a valorização da agricultura familiar, mostrando que é possível trabalhar nas duas frentes. Eu não vejo uma diminuição do impacto do agronegócio na balança comercial ou no superávit, porque, ao contrário do que se fala, haverá uma demanda muito mais forte pelo agronegócio, desde que ele tenha todo o respeito pelo meio ambiente", avalia.

Meio ambiente será essencial, diz economista

O fator ambiental vai ser um dos pontos mais importantes a serem tratados pelo próximo governo, diz o economista. Ele ainda destaca que Lula vai tentar organizar e finalizar o acordo entre Mercosul e União Europeia, travado exatamente por questões ambientais. A equipe do presidente eleito já confirmou que ele participará da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27) na terceira semana de novembro, no Egito, e a "nova cara" ambiental do Brasil, segundo Tito, deve ajudar no destravamento desse acordo, o que vai beneficiar fortemente o agronegócio, desde que o setor passe a respeitar as questões ambientais. O mesmo vale para a indústria - o economista acredita que haverá incentivos fiscais para o segmento no próximo mandato.

Nesse sentido, a exportação deve continuar como um fator importante no balanço de pagamento brasileiro pelos próximos quatro anos e, portanto, a economia paraense não deve ser afetada negativamente. Basta lembrar que deve haver mais participação social no controle da sustentabilidade ambiental, seja do ponto de vista do agronegócio ou da questão mineral. Tito acha que os empresários desses ramos já têm consciência dessa realidade. A reportagem tentou contato com a Federação da Indústria do Pará (Fiepa) para falar sobre o setor industrial e a exportação, mas a entidade preferiu se pronunciar apenas quando a equipe do presidente eleito estiver definida.

"Argumento ambientalista romântico é de que, quando faz estrada, gera desmatamento"

Com uma visão diferente, o economista Mário Ribeiro acredita que o Pará deve sofrer impacto negativo com a vitória de Lula à Presidência. Ele se diz preocupado que o petista siga uma agenda ambientalista "romântica" e defende a criação de projetos estruturais na região, como novas rodovias e que a Ferrogrão saia do papel. "O argumento ambientalista romântico é de que, quando faz estrada, gera desmatamento. O Pará tem 23 milhões de hectares de terras degradadas que pode compensar. Então, se eu vou aumentar, para fazer uma estrada, 100 mil toneladas de dióxido de carbono, eu dou uma margem, faço uma conta de 200 mil, vou fazer o dobro. Faço, por exemplo, um sistema agroflorestal sustentável em uma dessas áreas degradadas, com plantação de cacau, açaí, é uma coisa muito boa porque pode ter população ocupada no meio. Pode colocar cultura de ciclo longo e de ciclos menores. Essa tecnologia nós dominamos, só não temos o recurso para ela".

Ribeiro também opina a favor do trabalho e diz que a "mitigação em si é suicida", falando ainda sobre a agenda ambiental. "Não posso trabalhar só a mitigação. Preciso do trabalho, ocupar as pessoas que estão aqui. Se eu for fazer restrição à atividade econômica e não permitir a integração da Amazônia ao resto da economia brasileira, a região vai ficar nessa situação que está há décadas, e nós ficamos nessa estagnação", diz. Ainda sobre a Amazônia, o economista afirmou que é preciso considerar que não vivem na região apenas povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas, mas outras milhões de pessoas que também precisam ser governadas.

Exportações

O economista Mário Ribeiro ainda diz que a nova política econômica pode impactar negativamente as exportações. Ele cita possíveis mudanças na taxa básica de juros, a Selic, o que poderia provocar uma alteração no câmbio. "Todas as vezes que a taxa de juros sobe o real tende a valorizar. Quando o real fica mais forte acontece um fenômeno normal em uma economia que tem um regime de câmbio flexível: o real fica mais forte, todo mundo começa a procurar o real e isso tende a alterar a posição do câmbio. O dólar deveria cair e o real subir, mas outra força afasta isso: o gasto público. Se aumenta essa despesa e não reajusta a taxa de juros, você tem um problema. Então o Banco Central faz isso para não ter a desvalorização do real, protegendo a moeda. Mas se o governo continuar gastando, não vai haver equilíbrio. Isso afeta as exportações", garante.

Agronegócio paraense tem tido um crescimento consistente

O zootecnista Guilherme Minssen, diretor da Federação da Agricultura e Pecuária do Pará (Faepa), ressalta que o agronegócio paraense tem tido um crescimento consistente nos últimos anos, resultado de uma base "bastante forte" de tecnologia, crescimento e, principalmente, apoio de diferentes setores da sociedade. "Nós não acreditamos que vão ser rompidos os principais elos dessa produção, até porque ela se faz necessária para uma coisa mais importante de tudo, que é a segurança alimentar. O agronegócio paraense vai continuar respondendo, tendo todo o cuidado de mercado e respeitando todas as leis de comércio, principalmente para abastecimento de todas as nossas prateleiras, como fizemos em um dos piores momentos, no período em que enfrentamos uma pandemia e, mesmo assim, o agronegócio continuou trabalhando e, tanto na parte da pecuária como na da agricultura, continuou sendo bastante eficiente", destaca.

Nos próximos anos, não deve haver redução na segurança fundiária, na opinião de Minssen. O zootecnista diz que esse é um fator essencial para o investimento do produtor. Segundo ele, o setor espera que as regras continuem claras, principalmente no que diz respeito ao direito da terra e na defesa da propriedade privada. Quanto à exportação, o diretor da Faepa acredita que a atividade vai continuar, principalmente a venda de boi em pé, na pecuária, e de frutas, como açaí e cacau. Um desafio, para Guilherme, é a revitalização dos preços, que estão aquém do mercado internacional. Mas, com um agronegócio diversificado e competitivo, o Pará deve continuar exportando com grande vantagem.

Despesas

Outra preocupação do economista Mário Ribeiro quanto ao próximo governo é com o gasto público. Isso porque uma equipe debate criar um espaço fiscal de R$ 200 bilhões no próximo ano, para que seja garantido o repasse mensal de R$ 600 aos cidadãos e o aumento real do salário mínimo, acima da inflação - as duas propostas estavam entre as principais promessas de campanha do petista, mas não estão previstas no orçamento preparado este ano. 

Segundo o profissional, todas as vezes que há uma mudança na questão fiscal, existe um impacto nos juros e no câmbio, portanto, em toda a economia. "Os dois, durante os debates, anunciaram que iam fazer algumas alterações para caber no orçamento o que se pretendia. No governo do presidente Bolsonaro, havia a previsão de um espaço de R$ 64 bilhões, e o governo do presidente Lula pede R$ 200 bilhões. É natural o novo governo acomodar as suas preferências e o que quer fazer, mas é um gasto muito alto para a situação econômica que o país tem. A pergunta que fica é: o país tem condições para isso?", questiona. Pela primeira vez na história, existe um fenômeno generalizado de inflação global, de acordo com Ribeiro, sobretudo nas grandes potências e nos maiores países emergentes, o que torna o problema estrutural e não passageiro.

"Não existe dinheiro público. Essa é a primeira regra de economia. Existe dinheiro do contribuinte; é seu, meu, dos trabalhadores, dos empresários. Segundo princípio econômico fundamental: o governo não cria riqueza, ele transfere riqueza. Tira do Joaquim, passa para o Manuel, tira do Pedro, passa para o João, ou ele então tira da poupança da iniciativa privada e financia seus gastos. Isso não pode ser feito, basta olhar a lição da história da economia da América Latina nos últimos 15 anos. Desastrosa, inclusive agora. Eu acredito que essa nova aliança tem consciência disso. Tem que ter o programa do presidente, mas também com o rosto da aliança que ele compõe. Ele tem uma aliança com o PSDB, então precisa respeitar isso. Se você colocar toda essa quantidade de gasto, caminha para uma hiperinflação", argumenta Mário.

Comércio

No setor do comércio, o impacto da nova gestão deve ser positivo para o Estado paraense. Segundo Mário Tito Almeida, deve haver um esforço "muito grande" para que o governo incentive uma demanda agregada, ou seja, do lado da demanda vão haver facilitações, como já houve no primeiro e segundo governo de Lula, ao poder de compra da população, seja pelas transferências do governo ou também pelo incentivo e aumento do emprego. Um exemplo é a proposta de reajustar o salário mínimo acima da inflação, o que dá real poder de compra aos brasileiros, diferente do que vem ocorrendo nos últimos anos. Com dinheiro "sobrando", porque há uma folga acima do reajuste inflacionário, o trabalhador tem mais disponibilidade no salário para fazer compras, por exemplo.

Ao mesmo tempo, Tito acha que será necessário um incentivo para a produção. "Não adianta nada você aumentar o poder de compra se não incentiva a produção. Isso pode significar inflação. Então, uma sintonia fina vai ter que ser dada exatamente no aumento do poder de compra ao lado da demanda e, por outro lado, no aumento da capacidade produtiva e operacional da indústria, também com estímulo do governo pelo lado da oferta. É nesse sentido que isso vai aquecer a economia e não vai gerar inflação", explica o especialista.

O vice-presidente da Federação do Comércio do Pará (Fecomércio), Felipe Chamma, vê com bons olhos a eleição do presidente Lula. Embora a ausência de uma equipe econômica definida limite as avaliações, ele afirma que uma das propostas mais importantes do futuro presidente para o comércio é o incentivo da pequena e da média empresa. "Isso me alegrou bastante porque nosso setor é o que mais emprega no Brasil e a gente sabe que é importante que ele cresça. Na medida em que o presidente sinaliza que vai incentivar esse crescimento, a economia vai crescer".

Quanto à proposta de aumento real do salário mínimo, Chamma afirma que essa preocupação deve ser permanente porque é necessário e justo que o trabalhador seja dignamente remunerado. Na opinião do vice-presidente da Fecomércio, a ideia é boa e vai refletir em uma melhor condição do empregado e também no comércio, já que, com mais dinheiro, as pessoas compram mais. Ele ainda disse que agora Lula é um homem "com mais vivência" e está "mais capacitado" para evitar os erros cometidos por administrações passadas.

Investimentos

O cenário para quem é investidor deve ser instável no próximo ano, não só pela atual situação política e econômica do Brasil, mas pelo panorama internacional, com alta de juros e inflação elevada. O assessor de investimentos Idean Alves diz que a expectativa do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central é de reduzir a Selic, taxa básica de juros do Brasil, a partir do ano que vem, se a inflação cair. Caso continue em alta, a tendência é manter a mesma taxa, hoje fixada em 13,75%.

Segundo ele, o cenário é "muito bom" para quem investe em renda fixa, já que consegue ganhar mais, e quando se fala em aplicações que pagam 100% do CDI (sigla para Comprovante de Depósito Interbancário, uma taxa que segue a Selic de perto). "O mercado já entende que, em algum momento, essa queda vai ter que acontecer. Então, já tem essa expectativa e o mercado está preparado para reposicionar os investimentos", afirma. Para o ano que vem, as aplicações em renda fixa devem continuar em alta, tanto pré-fixadas como pós-fixadas.

Já para a Bolsa de Valores acaba não sendo tão positivo, segundo Idean. "Temos as empresas exportadoras, que podem se beneficiar com o dólar elevado, na faixa de R$ 5,3 e podendo subir um pouco mais. Da mesma forma, vai ser interessante para as empresas que se beneficiam do consumo em alta, como as varejistas e os próprios bancos, com o aumento do crédito, bem como a construção civil. Esse setor, provavelmente, deve ser incentivado", adianta o especialista.

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