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Zeneida Lima completa 86 anos e anuncia lançamento de livro e produção audiovisual

Novo projeto terá músicas autorais que serão gravadas por Gal Costa, Fafá de Belém, Leila Pinheiro e Dona Onete, além de Dira Paes, que fará a narração, e de outros artistas ainda não confirmados

Enize Vidigal
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A pajé, escritora, compositora e educadora Zeneida Lima completa 86 anos nesta terça-feira, 21. Dona de uma memória e disposição invejáveis, ela prepara o primeiro álbum audiovisual com músicas autorais que serão gravadas por Gal Costa, Fafá de Belém, Leila Pinheiro e Dona Onete, além de Dira Paes, que fará a narração do projeto, e de outros artistas ainda não confirmados.

Além disso, Zeneida está com o livro pronto para lançar após a pandemia, "Meus Caruanas", uma edição ampliada da biografia "O Mundo Místico dos Caruanas da Ilha do Marajó", obra que inspirou o enredo campeão da Beija-Flor no carnaval carioca de 1998 e também o filme "Encantados", de Tizuka Yamasaki, de 2017.

Nacionalmente conhecida pelo aspecto místico, pouca gente conhece o talento autoral de Zeneida Lima, que possui mais de 300 músicas, entre pajelanças, canções "mundanas" - como classifica - e também no dialeto africano Fon, sendo algumas delas registradas na Sony Music.

Quatro delas foram gravadas por Leila Pinheiro - "Nosso ar", "A lua", "Eu agradeço o céu" e "Água do Mar" no disco "Raiz", de 2011, e, mais recentemente, Nazaré Pereira gravou "Marajó é minha terra" no recém-lançado disco dela, "Meus Caminhos, Meu Destino".

As músicas de Zeneida trazem mensagens de defesa e valorização do meio ambiente. "Ela (Zeneida) é uma mulher muito forte, que senta no chão e canta, foi o que ela fez comigo debaixo de uma árvore, fui até lá (...) Ela fala da natureza, de uma forma muito bonita", descreveu Leila Pinheiro no vídeo de divulgação de Raiz. 

O projeto está ganhando arranjos de Luiz Pardal, Manoel Cordeiro e Jacinto Kahwage, sob a direção musical do primeiro, e a produção de Meg Martins. Outros grandes artistas da cena nacional estão sendo contatados para participar do disco, como o sertanejo Daniel. Ainda, será gravado um videoclipe com o medley do álbum e a participação de todos esses artistas.

Zeneida não é cantora profissional e nem toca instrumento, mas conta que a inspiração vem dos espíritos protetores da floresta, os Caruanas: "Tem músicas que eu faço, que eu escuto um órgão (teclado), são músicas da natureza. E vem a letra na minha cabeça e eu anoto. Quando acabo de escrever fico com aquela música na cabeça", conta Zeneida em entrevista exclusiva.

"Eu fui lá no estúdio do Pardal, gravar as minhas músicas, e depois de três dias ele me ligou dizendo que faltava uma música para ser o carro-chefe. Logo em seguida fiquei sentada e, de repente, ouvi aquele órgão tocando, peguei o papel, anotei a letra e mandei pra ele. Ele disse (demonstrando surpresa): 'Zeneida, você é filha da natureza'", recordou.

Apesar de ser uma pajé praticante, que reproduz conhecimentos ancestrais indígenas, Zeneida Lima foi criada no Catolicismo - a mãe foi aluna interna do Colégio Gentil Bittencourt e lia a Bíblia com os filhos - e possui uma composição dedicada à Virgem de Nazaré: "Ô mãe amorosa, cheia de luz, eterno espírito, segredo de Deus, benditos rios, espelhos do sol, caminha suave chegando no céu. Ave Maria, Ave Maria, bendita sejas, Ave Maria", diz a letra. "Mãe amorosa, Rainha de Nazaré, abençoa teus filhos cheios de fé, abre as flores cantam os anjos antes da santa chegar", completa a artista. 

Livro

Já o livro "Meus Caruanas" (Ed. Dialeto, de SP) está publicado e tinha previsão de lançamento em março deste ano, quando os planos tiveram que ser adiados em razão da pandemia pela covid-19. Trata-se de uma ampliação da biografia original, que conquistou a Marquês de Sapucaí com o enredo "O Mundo Místico dos Aruanas nas Águas do Patuanu", da Beija-Flor, e o romance "Encantados", estrelado por Carolina Oliveira, Thiago Martins, Letícia Sabatella, Dira Paes, José Mayer, Ângelo Antônio, Laura Cardoso, Fafá de Belém e Cássia Kiss.

Se na obra original, Zeneida narrou a infância, a adolescência e o "despertar" dos talentos da pajelança em Soure, no Marajó, em um enredo cercado de misticismo e elementos da natureza, neste novo livro de 395 páginas ela acrescenta outras fases da vida dela: os 27 anos em que residiu no Rio de Janeiro, para onde se mudou junto com o marido e teve quatro filhos naturais e outros seis adotivos; e a volta ao Marajó, onde fundou o Instituto Caruanas do Marajó Cultura e Ecologia.

"Apesar do pai ter dinheiro (fazendeiro no Marajó), passei dificuldade, virei garçonete, costureira e empregada doméstica para criar os filhos. Se sou o que sou é porque tive todo esse aprendizado", descreve.

"Fui para o Rio porque o meu marido era da Marinha e me levou. Nunca me apartei dos Caruanas. Lá, eu fazia a pajelança. Eu sentia uma saudade do Marajó, uma coisa louca, que arrebentava a minha alma, o meu peito, Vim embora (de volta para casa) quando fiquei viúva. Sempre com a ideia de fazer algo pelos menos favorecidos. Os filhos vieram comigo e trabalham na ONG". O livro ainda está sem data de lançamento.

Instituto

O Instituto Caruanas do Marajó Cultura e Ecologia, fundado por ela há 20 anos, em Soure, atende 240 crianças em ensino fundamental. "Foi uma inspiração da minha infância. O meu pai tinha crianças que trabalhavam para ele na fazenda. E quando elas não faziam o trabalho direito, ele batia nelas. Eu prometi que ia cuidar dessas crianças", revela.

O espaço possui cinco módulos de salas de aula, além de módulos com salas de informática, de costura e de música, refeitório, banheiros, academia, piscina, campo de futebol, dois barracões de festa e de atividades com cerâmica, onde as crianças recebem aula regular com ensinamento ambiental.

O projeto começou a virar realidade quando Zeneida ganhou um terreno de 195 hectares, doado por uma norte-americana que foi buscar tratamento de saúde com a pajé. Ali, ela fundou o "Mundo Místico dos Caruanas", onde se encontra inserido o instituto.

"As crianças me chamam de avó. Elas dizem que a escola é bonita. Eu respondo que não é minha, mas deles, e que eles precisam cuidar, não jogar lixo no chão. Alguns chegam aqui e não sabem nem usar o vaso sanitário. Você pode educar as crianças se fizer as coisas com amor, você muda o jeito da pessoa ser".

Ao longo dos anos, vários parceiros se somaram para a construção, manutenção e ampliação do instituto, como a própria Beija-Flor, o governo do estado e o Criança Esperança, da Globo. "Tivemos um curso de costura e crochê, pelo Criança Esperança, que, hoje, possibilita a sobrevivência de um grupo de jovens de 17, 18 anos, que fazem colchas belíssimas", conta.

Nesse Mundo Místico existe uma vasta área de vegetação preservada, onde Zeneida exerce a pajelança. "A coisa que mais adoro é a minha mata. Eu converso com quem tenta entrar para tirar algo. Aqui tem ervas medicinais, árvores sagradas e a casa da pajé, onde faço rituais para a chuva, arco sagrado e maracá e outros. Fico tão feliz quando olho. Tenho verdadeira adoração pela natureza".

Coronavírus

"O coronavírus foi a reação forte e violenta da natureza", descreve Zeneida Lima. "Nós precisamos nos unir, refletir e mudar o nosso modo de agir e de viver no planeta, ter mais consciência, saber que somos parte da natureza, não podemos maltratá-la".

A pajé afirma que  pandemia vai demorar, mas vai passar e que nunca mais a humanidade será a mesma. "Precisamos pedir socorro a Deus e trabalhar para melhorar o nosso planeta que está doente".

"Quando eu era criança, a natureza era mais exuberante. Nosso ar era menos poluído, as nossas árvores davam frutos nas épocas certas, a gente colhia mais. Hoje, vejo uma destruição do planeta, as árvores recebem bastante química para os frutos crescerem mais depressa para dar mais lucro. Nós sem a natureza não somos ninguém. Vejo essa destruição, que me dá agonia e muita tristeza. Precisamos repensar o nosso comportamento sobre a terra se a gente quiser ter uma vida melhor".

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