Banda de rock paraense Molho Negro lança sexto álbum e fala sobre desafios do tempo digital
Novo disco traz experimentações e reflexões sobre o ritmo da vida moderna, segundo o vocalista João Lemos
A banda paraense Molho Negro lançou, na última sexta-feira (31), o álbum “VIDAMORTECONTEÚDO”, o primeiro pela gravadora Deck e o sexto da carreira. O disco já está disponível em todas as plataformas digitais e marca uma nova etapa do grupo, formado por João Lemos (voz e guitarra), Raony Pinheiros (baixo) e Antonio Fermentão (bateria). O show de lançamento oficial do novo trabalho será realizado no dia 21 de novembro, na Casa Rockambole, em São Paulo.
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Segundo João Lemos, o processo de criação do álbum começou com uma provocação do diretor artístico Rafael Ramos, que sugeriu à banda compor mais músicas do que o habitual antes de definir o repertório, influenciando diretamente o resultado.
“Quando entramos no estúdio para gravar, nós tínhamos muito mais material do que o habitual, isso acabou fazendo bastante diferença na hora de escolher o repertório, e montar a seleção final”, contou o vocalista em entrevista ao Grupo Liberal.
Embora o novo álbum não tenha um tema central, Lemos explica que o pano de fundo do álbum está ligado à vida contemporânea, marcada pela dependência da internet e pelo excesso de telas. “O disco trata da vida que a gente tem levado, muito pautada pela hiper conectividade e pelo que vem com isso, como a precarização do trabalho e outros problemas do nosso tempo”, afirmou João Lemos.
A sonoridade mantém a identidade construída pela banda ao longo de mais de uma década de carreira, mas incorpora novos experimentos. Em “Bombas e Refrigerantes”, por exemplo, aparecem elementos eletrônicos e samples, enquanto “Claustrofobia” traz uma massa sonora mais densa em comparação com os trabalhos anteriores.
Ao longo de mais de uma década de trajetória, João Lemos afirmou que não imaginava que a banda alcançaria a longevidade que tem hoje. Ele disse que nunca pensou em fazer música com prazo de validade ou tentando acompanhar tendências. Para o vocalista, as canções e os projetos da banda seguem existindo enquanto fizerem sentido. “Acho que as coisas vão durar o tempo que elas precisarem durar, e que eu conseguir fazer”, afirmou.
Sobre as referências musicais que influenciam o trabalho do grupo, Lemos destacou que busca se conectar com artistas e obras marcadas pela sinceridade. Ele citou o Nirvana e o Metá Metá como exemplos de bandas que expressam essa autenticidade. “Música sincera, daquelas que você sente o coração na ponta da voz, na ponta da caneta, na ponta do instrumento”, explicou.
Composições
Com treze anos de trajetória, a Molho Negro lança o quarto álbum completo de sua discografia - que inclui os títulos homônimo ‘Molho Negro’ (2012), ‘Lobo’ (2014), ‘Não é nada disso que você pensou’ (2017) e ‘Normal’ (2018), além do single ‘Contracheque’ (2019) e do DVD ‘33’54 - Molho Negro ao Vivo’. O novo disco sucede ‘Estranho’, lançado em 2022.
Questionado sobre os temas que inspiraram as composições, João Lemos cita questões ligadas ao esgotamento e às transformações sociais. “Interligação massiva, precarização do trabalho moderno, seja o trabalho do artista ou não, esgotamento emocional e físico da classe trabalhadora na totalidade. Acho que são coisas que permeiam todos nós, querendo ou não”, pontuou o artista.
Sobre o atual espaço do rock nos grandes festivais do país, Lemos avalia que o gênero enfrenta mudanças. “O rock hoje tem uma cara um pouco mais envelhecida do que antigamente, ele se movimenta mais lento e não se adapta a todas as mudanças. E acho que os festivais, principalmente os grandes, com grandes patrocinadores, acabam concentrando atenção em atrações com apelo mais jovem e midiático”, observou.
Trajetória
Criada em 2012, em Belém do Pará, a Molho Negro surgiu em meio a uma cena musical marcada por ritmos como o brega, o tecnobrega e o carimbó. Segundo João Lemos, o nascimento da banda foi um processo natural, já que capital paraense é uma cidade intensa e diversa, onde diferentes estilos convivem.
Ele recorda que, mesmo com a forte presença dos gêneros populares na cultura local, o grupo sempre manteve um perfil distinto. “Belém é uma metrópole intensa e, mesmo os gêneros populares sendo quase onipresentes, também tem de tudo. A gente sempre teve esse perfil de ser os esquisitos da escola”, afirmou o vocalista.
Mesmo morando fora da cidade há alguns anos, o ele acredita que o vínculo com a região amazônica permanece. “Sem dúvida, mesmo sem ser morador da cidade há alguns anos, é inevitável que o debate nos atinja também. E não se iluda: você sempre será migrante”, disse.
O nome da banda, segundo Lemos, surgiu de maneira despretensiosa. “A banda foi batizada por um amigo nosso, e até hoje eu não perguntei a opinião dele sobre o significado do nome. Eu pedi para usar justamente porque achei que não tinha nenhum significado intrínseco, que poderia passar a significar o nome da minha banda”, contou em uma entrevista anterior.
Ao refletir sobre o momento atual, Lemos define a experiência de manter uma banda de rock hoje como um ato de insistência. “Acho que é um pouco de coragem inconsequente querer fazer arte nessa avalanche de conteúdo que vivemos, mas, ao mesmo tempo, para mim é inevitável, então eu aceito”, disse.
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