TJPA determina que Semas retome licenciamento ambiental para instalação de aterro sanitário no Acará
A decisão foi proferida na última terça-feira (22) pelo desembargador Luiz Gonzaga da Costa Neto, da 2ª Turma de Direito Público do TJPA
Em decisão proferida na última terça-feira (22), o Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) determinou que a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) dê prosseguimento ao processo de licenciamento ambiental para avaliação da instalação de um aterro sanitário no município de Acará, no nordeste paraense. A determinação, do desembargador Luiz Gonzaga da Costa Neto, da 2ª Turma de Direito Público do TJPA, estabelecia o prazo de 24 horas para o cumprimento da medida, conforme as recomendações apresentadas pela equipe técnica do Juízo e com a concordância do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA).
Na decisão, a qual o Grupo Liberal teve acesso, de acordo com o magistrado, os atos administrativos que resultaram no indeferimento da licença ambiental anteriormente estavam “eivados de ilegalidade, por vício de motivação”. O desembargador destacou que o indeferimento da Semas “não corresponde à realidade fática constante dos autos”, uma vez que tanto a consultoria técnica pericial quanto o Ministério Público apontaram a viabilidade ambiental do empreendimento.
"Com o objetivo de verificar se a motivação do ato de indeferimento locacional corresponde ao caso concreto, este relator nomeou Consultoria Técnica Pericial, no sentido de assessorá-lo tecnicamente no acompanhamento do pedido de licenciamento encaminhado pela Ciclus, vencedora do processo licitatório, ao qual, até então, está vinculado o desiderato do presente processo, tendo em vista que o aterro de Marituba se encontra próximo da exaustão", detalha a decisão.
O projeto em análise é de responsabilidade da empresa Ciclus Amazônia. vencedora do processo licitatório para implantação da Central de Tratamento de Resíduos Sólidos (CTR Ciclus) em Acará. Segundo o parecer da consultoria técnica pericial do TJPA, os estudos apresentados pela empresa “são adequados e apresentam informações técnicas que, de acordo com a legislação e as normas vigentes, permitem à Semas aprovar a localização e a concepção da Central de Tratamento de Resíduos Sólidos”
O desembargador ressaltou que os pareceres constantes nos autos indicam a viabilidade técnica do empreendimento, “desde que observadas as recomendações da equipe técnica e os condicionantes legais aplicáveis”. Ainda conforme a decisão, a Semas deve adotar as providências “de acordo com as sugestões apresentadas pela equipe de técnicos desse Juízo, com a devida concordância do MPPA”.
A equipe de perícia reforçou ainda que os documentos do Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) permitem “atestar a viabilidade ambiental da solicitação de implantação desse empreendimento no município do Acará” e estabelecer “requisitos básicos e condicionantes necessários para o prosseguimento do processo da Licença Prévia”, conforme o artigo 8º da Resolução Conama nº 237/1997.
Continuidade do processo
O Grupo de Apoio Técnico Interdisciplinar do Ministério Público do Pará (GATI/MPPA) também se manifestou favorável à continuidade do processo. No parecer técnico citado na decisão, o órgão concluiu que o EIA apresentado pela Ciclus possui apenas “fragilidades pontuais” que podem ser corrigidas, e que “o indeferimento integral do EIA/RIMA, como manifestado pela Semas, não se mostra a medida mais adequada”. O MP sugeriu que fossem impostas “complementações e condicionantes rigorosas” para que o licenciamento ambiental prossiga.
Na decisão, o desembargador Luiz Gonzaga reforçou que “não se está conferindo de plano a licença ambiental à Ciclus”, mas determinou que a Semas adote as providências necessárias para dar continuidade ao processo no prazo de 24 horas, com base nas orientações dos técnicos do juízo e com a concordância do Ministério Público. Ele determinou ainda que a empresa deverá cumprir os requisitos legais e as condicionantes estabelecidas para obter a licença.
Para o relator, a decisão visa corrigir um impasse que “se arrasta por anos” e que exige uma solução técnica, equilibrando a necessidade de manejo adequado dos resíduos sólidos da Região Metropolitana de Belém com a preservação ambiental. “Faz-se necessária a exigência de complementações e condicionantes rigorosas para a continuidade do processo de licenciamento ambiental”, pontua o magistrado ao encerrar a decisão.
Posicionamento
Em nota assinada pelo prefeito municipal de Acará, Pedro Paulo Moraes, a prefeitura detalhou que “vem a público se manifestar sobre a recente decisão judicial que determinou a retomada do processo de licenciamento ambiental da empresa Ciclus Amazônia S.A., no que se refere à pretensão de instalação de aterro sanitário no território neste município”.
“A decisão judicial em questão não autoriza a instalação do aterro sanitário em Acará. Trata-se, exclusivamente, da determinação para que o processo de licenciamento ambiental tenha prosseguimento, o que inclui a imposição de condicionantes e complementações técnicas a serem analisadas pela SEMAS/PA. A Prefeitura de Acará manifesta total contrariedade à instalação de aterro sanitário no município”, detalha o comunicado.
A prefeitura também afirmou que todas as medidas legais cabíveis estão sendo adotadas para impedir a iniciativa e que recorrerá da decisão judicial, por considerar que a localização do empreendimento é incompatível com a realidade socioambiental do Baixo Acará e ameaça o modo de vida das comunidades locais, conforme parecer técnico da Secretaria Estadual do Meio Ambiente.
“É importante ressaltar que a Prefeitura sempre atuou com responsabilidade e transparência, defendendo o interesse coletivo e a preservação ambiental. O processo de licenciamento ambiental, embora esteja sendo retomado por força de decisão judicial, depende de rigorosa análise técnica, estudos complementares e do cumprimento de requisitos legais que ainda não foram superados. Portanto, não há decisão definitiva sobre a instalação do aterro”, acrescenta a nota.
A prefeitura pontuou, ainda, que “está ao lado das comunidades do Baixo Acará e permanecerá vigilante, mobilizada e atuando juridicamente para impedir que o município se torne receptor dos resíduos sólidos da Região Metropolitana de Belém”. “Reiteramos o nosso compromisso com o desenvolvimento sustentável, a proteção do meio ambiente e a qualidade de vida da população de Acará. O governo municipal continuará firme na defesa do nosso território e das futuras gerações”, completa.
Também por meio de nota, a Ciclus Amazônia informou que o processo de licenciamento da Central de Tratamento de Resíduos no Acará está em fase de análise pelos órgãos competentes. "Todos os estudos técnicos e legais apresentados demonstram que o empreendimento está bem estruturado e cumpre rigorosamente as exigências ambientais e legais", frisa.
"É importante destacar que o projeto é estruturado para promover uma solução para os resíduos da região, a qual será regulada, pública e reversível, bem como utilizará das melhores práticas de engenharia e seguirá todas as normas técnicas voltadas para o tratamento e valorização dos resíduos, garantindo a segurança ambiental e sanitária, tornando-se uma solução definitiva ao problema que assola há décadas a região metropolitana", completa a Ciclus.
O comunicado ainda pontua que "a concessionária reforça seu compromisso com o diálogo, o cumprimento da legislação e a transparência, estando à disposição para esclarecer dúvidas junto aos órgãos competentes, lideranças e comunidades".
A Prefeitura de Belém esclareceu que os estudos de impacto ambiental foram aceitos pelo órgão ambiental ao Governo do Estado, por meio da Semas. O projeto não incide em nenhuma área habitada, de acordo com a gestão municipal. Todo o processo de licenciamento segue a legislação ambiental, realizado de forma correta e dentro das normas como determinam os órgãos de fiscalização, compreendendo projeto civil, diagnóstico ambiental, social da área de influência do projeto, bem como programas e controles ambientais.
"Por fim, a Prefeitura de Belém orienta que a reportagem procure a Prefeitura de Bujaru para comentar o assunto, uma vez que a permissão e a instalação do aterro sanitário é de responsabilidade da referida Prefeitura", frisa a nota.
A Redação Integrada de O Liberal solicitou posicionamento ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) sobre a decisão judicial e ao Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) para que detalhem se acompanham os desdobramentos do caso.
E ainda, o Grupo Liberal também buscou as prefeituras Ananindeua e Marituba para detalharem sobre a possível destinação dos resíduos desses municípios para o "novo aterro sanitário". A reportagem aguarda retorno.
Histórico
As discussões sobre a possível instalação de um aterro sanitário entre Acará e o município vizinho de Bujaru, no interior do Pará, ganharam repercussão ainda em 2023. À época, o Ministério Público do Pará e a Defensoria Pública do Estado (DPE) começaram a acompanhar de perto o processo para esclarecer as questões ambientais, territoriais e sociais envolvidas. O projeto da instalação do aterro no Acará se intensificou por conta da necessidade de um novo local para destinação de resíduos sólidos da Região Metropolitana de Belém, após incertezas nas atividades no aterro de Marituba.
Em setembro de 2023, o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), por meio das Promotorias de Justiça de Acará e Bujaru, informou que seguia apurando, em fase de instrução de inquérito civil, a possível instalação de aterros sanitários nos quilômetros 19 e 33 da Alça Viária, área onde vivem comunidades tradicionais, como quilombolas. As Promotorias aguardavam respostas da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), que ainda não havia apresentado os estudos de impacto ambiental solicitados.
Na mesma época, o Ministério Público Federal (MPF) também acompanhava o caso e havia aberto um inquérito civil em fase inicial para definir se a competência de atuação era federal ou estadual. O órgão destacou que o tema envolvia a ausência de consulta prévia, livre e informada às comunidades afetadas - um direito garantido a povos tradicionais - e compartilhou as informações do inquérito com gabinetes especializados do MPF. O Ibama informou que monitorava a situação.
A Semas declarou, ainda em setembro de 2023, que o pedido para instalação do aterro em Acará estava sendo analisado conforme os procedimentos legais e com transparência. Já a Prefeitura de Acará afirmou não ter sido informada oficialmente sobre o andamento do processo, destacando que a responsabilidade pelo licenciamento é exclusiva do governo estadual. O prefeito Pedro Moraes manifestou oposição à iniciativa, alegando que o projeto poderia causar danos ambientais e sociais, atingindo agricultores, nascentes, igarapés e o ecoturismo local.
No município de Bujaru, a Câmara Municipal havia aprovado, em 2022, uma lei que proíbe o recebimento de resíduos de outros municípios. O secretário municipal de Meio Ambiente, Diogo Almeida, também se posicionou contra o projeto, afirmando que o local previsto para o aterro ficava próximo a áreas sensíveis. À época, a Prefeitura de Belém informou que o Tribunal de Contas dos Municípios e o Tribunal de Justiça do Pará já haviam autorizado o prosseguimento da licitação da nova Central de Tratamento de Resíduos Sólidos da capital, e que aguardava a retomada da análise das propostas técnicas para avançar no projeto.
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA