ECA faz 35 anos com desafios históricos e urgentes em Belém, aponta pesquisadora da UFPA

Este ano, também está encerrando o prazo para que as novas administrações municipais entreguem os Planos Plurianuais (PPA) com prioridades até 2029.

Bruna Lima e Ayla Ferreira
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Neste domingo (13), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 35 anos. Criado em 1990 como um marco legal de proteção integral à infância, o ECA estabelece a criança e o adolescente como sujeitos de direitos. No entanto, em Belém, a efetivação desses direitos ainda está distante do ideal. É o que aponta a professora Amanda Cristina Ribeiro da Costa, da Faculdade de Serviço Social da UFPA, que analisa a situação a partir de três eixos: diversidade de serviços, qualidade do atendimento e planejamento das políticas públicas.

Segundo Amanda, Belém conta com uma rede diversa de equipamentos voltados ao público infantojuvenil, como CRAS, CREAS, unidades de saúde, escolas e o recém-implementado serviço de Família Acolhedora. Apesar disso, a qualidade dos serviços é fragilizada, principalmente nas áreas de maior vulnerabilidade. “Há precarização em infraestrutura e falta de profissionais em várias frentes. O atendimento em saúde mental, por exemplo, leva meses para ocorrer no único CAPS infantil da cidade”, pontua.

A docente destaca ainda a insuficiência de vagas em creches e escolas de tempo integral, o que afeta diretamente a autonomia das mães trabalhadoras e compromete o desenvolvimento da primeira infância. O financiamento público também é alvo de críticas. “A prioridade absoluta prevista no ECA não se reflete no orçamento municipal. Ainda falta compromisso em estruturar serviços de forma contínua e eficaz”, afirma.

No que diz respeito ao planejamento, Amanda aponta a ausência de planos municipais específicos como um dos principais entraves. “Belém ainda não tem um plano de convivência familiar e comunitária, nem políticas eficazes voltadas à primeira infância e à infância em territórios periféricos e insulares”, explica. Ela ressalta que o município precisa produzir diagnósticos mais precisos sobre temas como exploração sexual, violência doméstica, e o acesso à cultura e ao lazer.

A professora também chama atenção para desigualdades estruturais agravadas pela pobreza. “As crianças que vivem nas áreas de risco em Belém enfrentam múltiplas barreiras: fome, exclusão escolar, ausência de espaços públicos e invisibilidade social. Muitas não conseguem nem acessar uma praça ou quadra de esportes”, relata.

Outro ponto abordado por Amanda é a falta de políticas públicas que considerem a diversidade do público infantojuvenil, como crianças com deficiência, neurodivergentes ou oriundas de comunidades negras e indígenas. Ela defende ações que enfrentem o racismo, o capacitismo e as múltiplas formas de violência de forma transversal.

Além disso, Amanda critica a falta de articulação entre as políticas públicas. Para ela, o sistema de garantia de direitos previsto no ECA está fragilizado pela descontinuidade dos profissionais, pela comunicação ineficiente entre os órgãos e pela fragmentação institucional. “Direitos da criança não podem ser vistos apenas como responsabilidade da assistência social. Precisamos de um trabalho conjunto entre saúde, educação, justiça, cultura e segurança”, avalia.

Ao final da entrevista, a professora reforça que as crianças têm direito não apenas à sobrevivência, mas também à expressão, cultura, arte e participação social. “Belém precisa ser uma cidade amiga da infância. Precisamos parar de fazer políticas sobre crianças e começar a fazer políticas com elas. Escutá-las é fundamental para transformar a realidade”, conclui.

Estabelecido pela Lei nº 8069/1990, promulgada em 13 de julho, que origina a data, o ECA dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente e assegura a liberdade e dignidade, para que o grupo seja o primeiro foco dos recursos do setor público. Este ano, também está encerrando o prazo para que as novas administrações municipais entreguem os Planos Plurianuais (PPA) com prioridades até 2029.

Segundo Patrícia Dias, especialista em advocacia avançada em Direito Processual Civil, o ECA traz uma ruptura em relação ao Código de Menores, pois transforma a criança e os adolescentes em sujeitos de direito. “Essas crianças estavam muito aquém do Estado, com responsabilidade exclusiva dos pais, da família e de outras instituições, com mínima proteção. Já o ECA faz a proteção integral, para que a criança seja reconhecida como humana, com direitos que precisam ser guardados de maneira integral”, afirma.

Um dos desafios é garantir que o Orçamento Criança e Adolescente (OCA) seja completado para assegurar políticas públicas voltadas à infância e adolescência. O OCA é uma metodologia de identificação e monitoramento de ações orçamentárias voltadas às crianças e adolescentes, e permite com que gestores públicos, conselheiros e a sociedade civil acompanhem os recursos destinados a cada município e avaliem de que forma são administrados para garantir os direitos previstos no ECA.

“Ele é extremamente importante para tornar visível, para dar visibilidade, para dar publicidade ao que está sendo feito com o orçamento que vem para a criança e o adolescente. Até porque, para garantir essa prioridade absoluta à infância, eu preciso ter dinheiro para eu poder fazer políticas públicas na área da educação, na área da saúde, na área do lazer, na área do trabalho”, explica Patrícia Dias, especialista em advocacia avançada em Direito Processual Civil.

A Prefeitura de Belém,por meio de nota, informa que o processo de elaboração do Plano Plurianual (PPA) 2026-2029 ainda está em andamento. As propostas apresentadas pela população, tanto nas audiências públicas quanto por meio do site oficial do PPA (ppa.belem.pa.gov.br), estão sendo analisadas para composição dos programas temáticos do plano.

Em relação à participação do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), a Prefeitura esclarece que foram realizadas audiências públicas e uma consulta online abertas à sociedade civil, garantindo ampla participação social.

Em relação aos dados da previsão orçamentária dos anos de 2023, 2024 e 2025, eles são públicos e estão disponíveis para consulta no Portal da Transparência da Prefeitura.

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