logo jornal amazonia

Pará registra 34 processos de importunação sexual em janeiro de 2021

No mesmo período, em 2020, um único processo havia sido registrado. Lei nº 13.718/2018, que alterou o Código Penal, pune a prática de atos libidinosos e divulgação de cenas de estupro.

Ana Carolina Matos
fonte

Anteriormente considerado uma contravenção penal - uma infração com aplicação de multa ou, no máximo, uma "prisão simples" - o ato de importunar sexualmente alguém foi criminalizado há pouco mais de dois anos. Desde então, a prática de atos libidinosos com a intenção de satisfazer a lascívia (prazer sexual) próprio ou de terceiros, sem a autorização da vítima, passou a ser passível de pena por conta do artigo 215 da Lei nº 13.718/2018, que alterou o Código Penal.

No Pará, a lei tem se mostrado cada vez mais necessária no enfrentamento aos abusos contra os corpos das mulheres - e também de crianças. Em janeiro de 2021, o Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) registrou 34 processos de importunação sexual. No mesmo período, em 2020, um único processo havia sido demandado no Tribunal. Em dezembro de 2020, foram 31 processos. No mesmo período de 2019, foram apenas dois. Antes disso, nenhum dado sobre o tema foi encontrado na base do TJPA.

A juíza criminal Cristina Collyer ressalta a importância da tipificação e penalização de crimes de importunação sexual. "A importância crucial é porque antes comportamentos invasivos terminavam sem qualquer tipo de punição, já que tais condutas eram consideradas apenas simples contravenção penal. Ter a previsão expressa no Código Penal para que condutas tão invasivas à liberdade sexual da mulher sejam reconhecidas como crimes, com previsão de pena de reclusão de 1 a 5 anos, foi um avanço significativo em nossa legislação", acrescenta.

Para a magistrada, os abusos já são corriqueiros e conhecidos de boa parte das mulheres, que enfrentam diariamente situações invasivas e constrangedoras, de cunho sexual. "Essas práticas de atos libidinosos estão presentes no dia-a-dia das mulheres. Ou seja, encoxar a mulher sem a permissão dela, assim como 'roubar' o beijo de uma mulher sem consentimento, passar a mão em suas partes íntimas ou outro local com alguma conotação sexual, puxar o cabelo da vítima, ejacular no corpo da ofendida...", exemplifica. 

Não só a tipificação é importante para coibir crimes como este. A denúncia é crucial para evitar que abusadores se sintam confortáveis em continuar invadindo os corpos das vítimas. "Quando uma conduta é tipificada como crime, é de suma importância que a vítima denuncie para que sirva de exemplo, de modo a inibir a prática de novos crimes", reforça a juíza criminal. "Caso ocorra alguma das condutas acima descritas, o ofensor estará em flagrante delito. A vítima deve procurar imediatamente um agente policial (se for possível) ou uma patrulha que esteja próxima ao local para comunicar a ocorrência da conduta, ou ainda se dirigir direto à delegacia para comunicar a ocorrência e lavrar Boletim de Ocorrência. O ideal é que a comunicação seja feita o mais rápido possível, logo depois do crime", conclui.

Apesar do caminho simples para a denúncia, a naturalização dos abusos, reiterada por diversas construções sociais, acende um debate sobre a visão de propriedade sobre corpos femininos. "É imprescindível que se diga também que a grande dificuldade de punir e denunciar esses casos, e a grande tranquilidade com que os homens seguem praticando esses atos, é justamente a noção da subalternização das mulheres que, nesta sociedade - alicerçada em comportamentos machistas - faz com que as mulheres sejam objetos para o bel prazer dos homens", ressalta a ativista, advogada e fundadora do Política para Mulheres, Natasha Vasconcelos.

Segundo ela, é necessário fazer com que "as legislações não mais tenham os corpos das mulheres como objeto da lei e sim como sujeito da legislação". Para a jurista, são esses paradigmas sociais que precisam ser quebrados para ampliar a discussão e combater crimes que cerceiem a liberdade das mulheres. "Essa é grande ruptura legal e jurídica que a gente ainda precisa fazer na sociedade pra que cada vez mais esses debates sejam normalizados e pra que os homens se coloquem no papel de entender que as mulheres - não importa a roupa ou o contexto em que houve uma reciprocidade - quando o 'não' é dito, aquilo ali precisa acabar naquele momento. A autorização de acesso a esses corpos precisa de um grande debate social até mesmo pra que as mulheres entendam que não podem estar à mercê dessa sociedade patriarcal e desse poder que é exercido pelos homens", destaca.

Lei também tipifica divulgação de cenas de estupro

 

Não só os crimes de importunação sexual foram tipificados com a Lei nº 13.718/2018. Também há previsão de punições para quem divulgar cenas de estupro, assim como aumento de penas para o estupro coletivo e o estupro corretivo. Até a chamada "pornografia de vingança" - quando o divulgador das imagens manteve ou mantém relação íntima de afeto com a vítima e comete o crime por vingança ou para humilhação - também é passível de aumento de pena. 

Para Vasconcelos, a inserção destes conceitos representa um avanço para que as várias formas de invasão dos corpos femininos entrem em discussão. "É uma resposta a crimes contra a liberdade sexual de mulheres. A legislação vem, na verdade, preencher uma lacuna legislativa entre os casos de assédio sexual e estupro. Falta muito, ainda precisa de muitas medidas pra provocar uma transformação dessa ordem patriarcal, que faz com que os corpos das mulheres, corpos femininos, sejam mais sexualizados, objetificados e explorados. Nesse sentido, um dos maiores avanços da legislação é trazer para o debate político social diversos conceitos atualíssimos que acabam vitimando muitas mulheres", enfatiza.

Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Polícia
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!

RELACIONADAS EM POLÍCIA

MAIS LIDAS EM POLÍCIA