Profissionais da saúde esperam colaboração
Batalha - Quem vê de perto as perdas causadas pela covid-19 diz que falta compromisso da população com as medidas preventivas
Karina Lopes já recebeu a primeira dose da Coronavac, no último dia 21 (Foto: Arquivo Pessoal) O Pará possui 120.181 profissionais em saúde na linha de frente de combate à covid-19 e que fazem parte da primeira fase da Campanha Paraense de Vacinação. Deste total, 37.205 já foram vacinados, até a noite de quinta-feira (28), segundo informa a Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa). Há mais de dez meses, eles atuam contra a pandemia dentro dos hospitais, dos centros de atendimento de urgências e nas Unidades de Terapias Intensivas (UTIs).
Na sexta-feira (29), o Brasil já somava 221.547 mortes e 9.058.687 casos da covid-19. Destas, 7.564 mortes e 325.562 casos ocorreram no Pará. E ainda hoje essa guerra contra o novo coronavírus (Síndrome Respiratória Aguda Grave - Sars-Cov-2) parece longe do fim.
Porém, o início da vacinação e a experiência acumulada ao logo desse tempo levam mais esperança a esses profissionais para vencer a covid-19. Mas eles relatam que precisam contar com apoio também da população quanto aos cuidados e prevenção contra a doença.
“O volume grande e intenso de trabalho, insuficiência ou inadequação de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), em especial nos meses de março, abril e maio de 2020, e agora voltou a ser escassas. Além das mortes em volume muito elevado, colegas próximos morrendo ou sendo infectados, familiares infectados e falta de estrutura física, principalmente no que se refere a manter os pacientes não adoecidos por covid, separados daqueles que não estão com vírus”.
Esse é o relato da técnica em radiologia Karina Lopes, 41 anos, que atua como membro do Conselho Nacional dos Técnicos em Radiologia e está na linha de frente desde o início da pandemia, em março de 2020. Ao longo desse tempo, para ela, outro ponto também ainda difícil é a falta de compromisso da própria população com o comportamento preventivo.
“Os cuidados preventivos são determinantes para que o vírus não alcance tanta gente ao mesmo tempo. As eleições, as festas do fim de ano, o retorno para as escolas, as praias e os espaços públicos abertos, o Enem, tudo isso vem concorrendo a favor do vírus e atrapalhando nosso trabalho, as pessoas estão morrendo e vêm piorando. Hoje estamos na bandeira laranja e eu acredito que teremos tempos piores. A cepa está mais forte, temo pelo que possa acontecer. Se a população não se prevenir, não iremos dar conta”, afirma a profissional, a qual já perdeu um irmão, um tio, uma tia e muitos conhecidos e colegas para a covid-19.
Ela pede ainda que a população não tenha medo da vacina. “Ela (vacina) é nossa aliada. Temos que fazer o isolamento, usar máscaras, a higiene das mãos, porque não temos condições estruturais, de pessoal, remédios, os equipamentos (tomografia), oxigênio, estão sobrecarregados. E isso pode nos causar a necessidade de escolher entre quem terá uma chance de viver, sem garantia, inclusive. Precisamos de união e trabalhar como um grande exército. Nosso inimigo é o vírus. Temos que lutar contra ele e não a favor dele”, pede Karina Lopes, que já recebeu a primeira dose da Coronavac, no último dia 21, e tem 19 anos de atuação na radiologia.
Médica pede paciência e trabalho em conjunto
Outra profissional que também está na batalha diária para derrotar o vírus é a médica Luciana Corrêa, 26 anos. Ela atua como plantonista também em atendimento de urgência e emergência e conta um pouco sobre a rotina atual de trabalho frente à pandemia.
“No dia a dia de todo médico plantonista há surpresas, como é de se esperar. Há plantões tranquilos, onde a complexidade dos casos é baixa, com pessoas buscando atendimentos logo nos primeiros sintomas e recebendo as orientações e cuidados devidos. Entretanto, ainda há dias conturbados, quando surgem pessoas que precisam de medidas imediatas para que sua vida seja mantida. No último mês, em um dos serviços do qual faço parte, foi percebido um aumento considerável dos atendimentos por síndromes gripais, aos quais tentamos fazer uma espécie de ‘triagem’, a fim de diferenciar os pacientes suspeitos de covid-19 e orientar tanto paciente quanto família”.
Ainda hoje a médica lembra dos momentos difíceis que viveu na primeira onda da doença. ”Foram vários dias difíceis, não só pra mim, mas para as equipes que trabalhei, porque nos envolvíamos mesmo sem querer, na história de cada paciente. Acredito que isso tenha sido necessário para ambos os lados: o paciente conseguia ver que tinha alguém ali que faria de tudo por ele e, do outro lado da máscara, um profissional de saúde que fazia tudo para o paciente, mas pensando que poderia ser um familiar seu ali, na mesma situação. O medo tomou conta de todos, mas quem estava na linha de frente não poderia se dar ao luxo de se render a ele e nem sucumbir às incessantes perdas”, lembra.
Contudo, para ela, foi fácil perceber a importância do toque, do abraço, do sorriso das pessoas. Luciana Corrêa considera difícil ter outra experiência que a faça aprender a importância e necessidade da humanização e empatia. Ela pede cuidados e paciência à população.
“Nada disso poderia ser feito, se não tivéssemos aprendido o que é literalmente ser humano. E isso nenhum livro ensina. A palavra de ordem é esperança e é nela que me agarro diariamente para continuar. Se todos forem conscientes e trabalharem em conjunto, pensando em si e no outro, a vida voltará aos eixos aos poucos. Basta ter paciência, cuidados e acreditar nas orientações dadas por órgãos sérios e dedicados a controlar e minimizar os danos já causados”, solicita a médica, que, ansiosa, ainda aguarda pela vacinação.
Enfermeira ainda tem esperança de ano melhor
Desde abril de 2020, a enfermeira Kelly Haiol, que trabalha há 18 anos na área da saúde, está na linha de frente de combate à covid-19. “Na urgência e emergência e no pico da pandemia vivi experiências desafiadoras e desesperadoras. Mas, ao mesmo tempo em que eu colocava minha vida e da minha família em risco, eu precisava ajudar as pessoas. Tivemos muitas perdas e conseguimos salvar algumas delas”.
A enfermeira Kelly Haiol avalia que muitas pessoas diminuíram os cuidados (Foto: Thiago Gomes / O Liberal) A enfermeira, que já recebeu a primeira dose da vacina Coronavac, diz que tem esperanças de que 2021 seja um ano melhor. “Hoje ainda é difícil dar calor aos familiares e pacientes devido à pandemia, mas estou confiante de que a vacina veio para nos dar novas alegrias e esperanças. Mas vejo que muitas pessoas relaxaram com os cuidados e não deram muita importância ao uso da máscara e álcool em gel e ao distanciamento social, e evitar o compartilhamento de objetos. Mas ainda precisamos manter isso, porque o vírus teve mutação, ele é letal e leva à morte, e ainda está aí... Então, todos estamos propícios a nos contaminar”, orienta a enfermeira Kelly Haiol.
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