Pará tem 55 mil casos de gravidez precoce entre 10 e 19 anos; Marajó lidera número de casos

Gravidez precoce têm impactos físicos, emocionais e socioeconômicos e é uma questão de saúde pública

Emanuele Corrêa
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Gravidez precoce é uma questão de educação e saúde pública. Como consequências há o abandono escolar, atraso no ingresso ao mercado de trabalho e uma continuidade do ciclo intergeracional de pobreza. No Pará, em 2020, foram registrados mais de 55 mil bebês nascidos de mães adolescentes ou jovens, entre 10 e 19 anos. Destes, 5.908 casos no arquipélago do Marajó, de acordo com dados da Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará. O projeto "Saúde das Manas", do Fundo de População da ONU (UNFPA) em parceria com o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (Cosems/PA), busca fortalecer o sistema de saúde local e atender mais de 80 mil mulheres em idade reprodutiva em sete municípios do Marajó.

Anna Cunha, oficial do programa em saúde sexual e reprodutiva da UNFPA, afirma que são vários desafios envolvendo a gravidez não intencional. O primeiro deles é o acesso a informação. "Por isso precisamos seguir investido para que eles possam estar informados, trabalhar habilidades e empoderá-los para negociar uma camisinha numa relação afetiva. Para que tomem decisões informadas sobre sexualidade e reprodução. Trabalhar a questão da informação qualificada e assegurar o acesso a insumos de saúde reprodutiva, contraceptivos, etc. É um direito", assegura.

Com a chegada da menarca - primeira menstruação - também inicia a ovulação. Desta forma teoricamente o sistema reprodutivo está apto para engravidar, é o que explica Luciana Monteiro, obstetra do Cosems/PA. "Isto não significa que ela deva engravidar, pois esta adolescente ainda precisa completar todo o seu crescimento, sobretudo, dos ossos da bacia. Dois anos após a menarca o corpo já está totalmente pronto, sendo mais recomendável após os 18 a 20 anos", orienta a especialista.

A mestre em psicologia Rosana Lemos Faraon explica que adolescentes e jovens ainda não estão preparados psicologicamente para serem pais e mães, visto que, é uma etapa da vida que constrói a identidade e personalidade. "A própria formação do cérebro ainda não está completa, nem do corpo. Além disso, os adolescentes não estão preparados para tamanha responsabilidade e doação de vida. Por isso, é muito comum as grávidas adolescentes desenvolvendo depressão e ansiedade ao longo da gestação, bem como a depressão pós-parto que é caracterizada por uma forte rejeição ao bebê", reforça Rosana.

image Santa Cruz do Arari, um dos municípios com mais desafios de desenvolvimento do Marajó, região que concentra cerca de 10% dos partos oriundos de gravidez precoce (Divulgação / Projeto Saúde das Manas)

 

Gravidez precoce traz risco à saúde

As implicações físicas para um corpo jovem que engravida precocemente pode ocasionar até a morte de quem gesta, pois este corpo necessita de muitos nutrientes, tais como ferro e cálcio, o que pode gerar eclâmpsia - principal causa de mortalidade materna no Brasil. "Se ela engravidar, o feto passa a competir com ela por esses nutrientes, por isso elas desenvolvem mais anemias, ganho de peso inadequado para mãe e feto. Na gestação apresentam maiores taxas de aborto, anemia, hipertensão, que complicam com pré-eclâmpsia e eclampsia e também para o feto com baixo peso e prematuridade", disse Luciana.

Sobre o acesso à saúde reprodutiva e planejamento familiar, a obstetra acredita ser escasso e carregado de tabus. "Do contrário, o Brasil não teria taxas de gravidez entre adolescentes acima da média mundial. Educação. Educação Sexual e Reprodutiva. Essa educação deve abranger o ambiente familiar sempre que possível. Mas, uma vez estando grávida, deve receber apoio multiprofissional: médicos, enfermeiros, agentes comunitários de saúde, educadores, dentistas e em alguns casos até parteiras tradicionais e assistentes sociais", ratifica Luciana.

Mayara da Silva Palheta tem 23 anos, mora em Melgaço, no Marajó, e relata que engravidou aos 15 anos de maneira planejada e teve o apoio da família. Mas foi na gestação que percebeu que o psicológico não estava preparado. "Eu queria ser mãe, mas eu não sabia que seria uma responsabilidade tão grande. Então meu psicológico começou a palpitar, se eu daria conta de ter aquela criança, cuidar sozinha. Depois de um tempo eu fui vendo que dava conta. Meu filho hoje tem sete anos e outra 5 anos. São meu tudo, amo e jamais os abandonaria", comenta.

Aos 18 anos e ainda amamentando, Mayara foi surpreendida com uma gravidez não planejada. Ela conta que só descobriu porque o seu filho teve uma reação ao mamar, fez o teste de sangue que deu positivo. A jovem gostaria de mais políticas de educação e saúde sexual, para evitar gravidez precoce. "Aí eu tive um desespero, por temer pela vida do meu bebê e por ser pega de surpresa... Por isso eu gostaria que mais jovens pudessem ter acesso a políticas sexuais. Eu acho que acesso a política educacional, é essencial. Se na minha época tivesse, eu teria evitado engravidar, eu já mais consciência, o que poderia causar ao meu filho. Eu não reclamo de ter a minha filha, só naquele momento de ter visto meu filho doente", relembra.

"As pessoas ficavam falando coisas por eu ter engravidado tão nova. Mas eu superei tudo e cuido dos meus filhos. Não é fácil engravidar na adolescência. Orientem-se mais, conversem e se aprofundem no assunto, para evitar uma gravidez precoce, que é uma criança cuidando de outra criança. Graças a deus eu tive o apoio da minha família, meus filhos estão grandes. Inclusive, eu pretendo conversar com eles sobre o assunto quando for a hora", completou.

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