Leis de inclusão não acabam com a invisibilidade

Legislação é letra morta quando não há políticas públicas municipais que a tornem realidade

Valeria Barros
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A Lei Brasileira de Inclusão define pessoas com deficiência como aquelas que têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas. No Brasil, são mais de 12,5 milhões, ou 6,7% da população com grande ou total dificuldade para enxergar, ouvir, caminhar ou subir degraus, além dos que declararam ter deficiência mental ou intelectual. Em Belém, 388 mil pessoas enfrentam as dificuldades de viver numa cidade que não se adaptou.

 “Em pleno século 21, ainda estamos lutando para sermos vistos pelo poder público e pela sociedade. Continuamos na invisibilidade. Temos legislação. Só falta sair do papel, deixar de ser letra morta e tornar o deficiente protagonista e sujeito de sua própria história”, diz o assistente social e diretor técnico da Associação das Pessoas Portadoras de Deficiência (APPD) em Belém, Jordeci Santa Brígida, 59 anos.

Ele explica que todo processo de acessibilidade, ao longo dos 35 anos de APPD, é uma conquista do movimento, a exemplo da Lei Brasileira de inclusão de 2015, do Decreto 3298, da Convenção Internacional dos Direitos das PCD e do Decreto 5226, legislações que tratam do princípio fundamental para a inclusão e a acessibilidade das pessoas com deficiência.

“O que falta é um poder municipal que se preocupe com políticas efetivas de inclusão e acessibilidade para as pessoas com os diversos tipos de deficiência. No mercado de trabalho, por exemplo, as empresas contratam apenas para cumprir cotas, para fugir das multas. No transporte coletivo, só existe a gratuidade porque a APPD fez uma emenda à Lei Orgânica de Belém, garantindo a gratuidade nos transportes rodoviários e aquaviários. E ainda assim, embora tenhamos o direito, falta a humanização desses trabalhadores”, afirma.

BOA VONTADE

Aliny Santa Rosa, 34 anos, estudante de pedagogia e farmácia depende de cadeira de rodas para se locomover. Aos 18 anos, ela foi diagnosticada com dermatopomiosite, doença idiopática inflamatória crônica, que afeta a musculatura estriada, a pele e outros órgãos e a impede de ficar em pé e caminhar. No dia a dia, ela dribla o descaso e a falta de humanidade das pessoas, em uma cidade inacessível em todos os aspectos.

“Eu pego quatro ônibus diariamente e durante dois anos eu nunca tive a sorte de pegar um ônibus com acessibilidade. Quando vou entrar nos coletivos preciso ser carregada, dependo da boa vontade das pessoas”.

“Construíram o BRT sem ouvir o segmento. Então operam no corredor central sem pensar na travessia das pessoas com deficiência, sobretudo em Icoaraci. Não tem sinalização, nem rampa de acesso. Não tem nada, completa Jordeci”,

Na opinião de Aliny, quem elabora as políticas públicas deve lembrar que pessoas com deficiência também fazem esporte, passeios, frequentam restaurantes, cinemas, estádios etc.

“Os estabelecimentos em Belém, quando têm rampa para entrar, o banheiro não é adaptado. A cidade vem se modificando lentamente nesse sentido e, mesmo quando faz, não segue as regras da ABNT. Tenho amigos autistas que vivem constantes constrangimentos. E mesmo para as leis que já existem, não há fiscalização. Só conseguimos alguma coisa quando entramos com uma ação no Ministério Público”, desabafa.

Na área educacional, Jordeci lembra que a APPD lutou a vida toda por uma educação inclusiva, mas agora o presidente da República revogou tudo e criou a Política Nacional de Educação Especial.

“Isso é segregação. Nós não aceitamos ficar no cercadinho com arame farpado, como se a deficiência fosse uma doença contagiosa. Não aceitamos isso! Queremos a inclusão no ensino regular”, protesta.

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