Antes de Marta: conheça a paraense Cebola, a primeira grande jogadora de futebol feminino do Brasil

Segundo historiadora Letícia Magalhães, atleta foi destaque da Seleção no primeiro torneio mundial da modalidade e chegou a ser chamada pela mídia internacional de “Pelé de Saias”.

Caio Maia
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A Seleção Brasileira feminina deu adeus à Copa do Mundo nesta semana. Após o empate em 0 a 0 com a Jamaica, as Guerreiras do Brasil deixaram a competição ainda na fase de grupos. Além da esperança pelo título inédito, despede-se do Mundial uma referência global do futebol de mulheres: a Rainha Marta.

Dona de seis títulos de Melhor do Mundo - sendo cinco deles consecutivos - a jogadora do Orlando Pride-EUA é aclamada ao redor do planeta como a jogadora mais importante da história do esporte. Além de ídolo mundial, Marta é referência nacional, sobretudo para uma nova geração de meninas que desejam viver do futebol.

A história de Marta é recheada de vários adjetivos, no entanto as referências do futebol de mulheres no Brasil não se restringem à ela. Quem começou essa caminhada, no período pós-descriminalização do esporte, foi uma paraense. Lucilene Marinho, conhecida como Cebola, foi o primeiro grande ícone do esporte do país. Ela foi artilheira da Seleção no primeiro Mundial da categoria - ainda não oficial - em 1988, na China.

Quem conta um pouco mais sobre a história de Cebola é a historiadora Letícia Magalhães, que pesquisa sobre as origens do futebol feminino no Pará. Segundo ela, Lucilene é amplamente reconhecida como o primeiro ídolo do esporte no Brasil. Além disso, ela conta que, no torneio, a jogadora paraense ganhou, da mídia internacional, o apelido de "Pelé de Saias".

image Seleção Brasileira feminina que participou do Mundial Experimental de 1988, na China (Divulgação)

"Participou da Seleção Brasileira no torneio experimental da China e, em 1991, da primeira Copa do Mundo. A Cebola jogou na Seleção se destacando por suas habilidades. Foi citada no exterior como uma das melhores jogadoras do time, sendo chamada de 'Pelé de Saias'. Ela foi a primeira grande artilheira do futebol feminino brasileiro", disse.

Segundo Letícia, Cebola viveu um período muito difícil do futebol feminino no Brasil. Ela jogou na década de 80, anos seguintes à descriminalização do esporte, em dois dos três maiores clubes do estado: Remo e Tuna Luso. Após campanhas de destaque no recém-criado Campeonato Paraense, rumou para o Rio de Janeiro, onde atuou pelo Vasco e o Radar, equipe pioneira no futebol para mulheres no país.

"Jogou no Remo em 1984, no Parazão feminino. Jogou pela Tuna, Independente, Seleção Paraense, pelo Radar-RJ, Vasco da Gama-RJ e Fluminense-RJ. Jogar no Vasco e Seleção Brasileira abre o espaço desse território então masculino. Ela abriu portas para mulheres na época que o esporte era amador. As jogadoras quase não tinham direitos. A Cebola vem como elemento importante para a carreira de outras jovens", salientou.

image Seleção Paraense, de Cebola, venceu o Radar, principal time do futebol feminino do Brasil na década de 1980. (Divulgação)

O primeiro do Brasil?

O pioneirismo paraense no futebol feminino não se dá somente pela naturalidade da primeira grande craque da Seleção. Além disso, há a possibilidade de que o estado tenha abrigado o primeiro time exclusivo para mulheres do Brasil. No entanto, segundo Letícia Magalhães, a afirmativa ainda não é precisa e carece de mais investigação.

"Há a possibilidade do Pará ter abrigado o primeiro time de mulheres do Brasil. Não há confirmação de que seja, mas também não podemos afirmar que não é. De forma geral, a existência de uma equipe no Pará, em 1924, já é histórica", explicou.

O clube em questão é o Bloco das Palmeiras - nome que remete ao período do Carnaval. A agremiação era formada exclusivamente por mulheres e era sediada na rua 16 de Novembro, no bairro da Cidade Velha. Letícia conta que as atletas, que jogavam de forma amadora, costumavam treinar no Largo de São José, onde hoje fica o São José Liberto.

image Largo de São José, local onde hoje fica o Espaço São José Liberto, abrigou os primeiros jogos do Bloco das Palmeiras (Agência Pará)

"O esporte era tipicamente masculino, mas isso não quer dizer que elas não praticavam. Tanto que em 1924 houve um clube feminino do Pará, chamado de Bloco das Palmeiras, que fica na 16 de Novembro. Anterior a isso, os homens faziam "brincadeiras' e jogavam o chamado 'futebol travesti', que consistia em homens trajados com roupas femininas, jogando futebol, em festas comemorativas. Apesar disso, as mulheres não jogavam inicialmente. Estavam nas arquibancadas, torcendo, mas não jogavam. Então, o Bloco das Palmeiras mostrou que as mulheres sabiam jogar, mas com grande menosprezo dos homens", contou.

Apesar disso, a modalidade passou a ganhar adeptos pelo estado, até a criminalização do futebol feminino, decretada pelo presidente Getúlio Vargas, em 1941. No entanto, o esporte continuou sendo praticado, de forma clandestina, em todo o Brasil. Segundo Letícia, por conta dessa natureza combativa do esporte, o futebol de mulheres até hoje é um instrumento de luta social. 

“Mesmo com a aplicação dessa lei, as mulheres continuaram a jogar. Existem fortes indícios disso. Existiam jogadoras que até completavam times masculinos. Esse fôlego das mulheres, não só no esporte, me fez pesquisar sobre o futebol feminino. Sempre questionei esse lugar de subserviência e busquei pelo meu espaço, a minha independencia financeira. Queria saber como os embates sociais estão incluídos nesse espaço. De longe parece só um esporte, mas na verdade é uma relação de poderes”, finalizou.

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