Mais de 90% das revendas de gás no Pará são clandestinas, aponta sindicato
Presidente da entidade denuncia ausência de fiscalização e alerta que consumidor é o principal prejudicado com a informalidade
A maioria das revendas de gás de cozinha que operam no Pará não possui autorização legal para funcionar. A estimativa é do Sindicato das Empresas Revendedoras de Gás Liquefeito de Petróleo do Pará, que denuncia a falta de fiscalização por parte da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e alerta para os riscos ao consumidor.
"Na última avaliação que nós fizemos, quando fizemos as últimas comunicações com a ANP, no ano passado, a gente imaginava que, para cada revendedor legal, existissem pelo menos 10 pessoas trabalhando na informalidade", afirma o presidente do sindicato, Francinaldo Oliveira.
Ele explica que a venda clandestina ganhou novas formas e se descentralizou: "Como a ANP limitou a cinco botijões a quantidade que uma pessoa pode ter em casa, o revendedor clandestino que tem um ponto fixo compra os cinco, guarda como se fosse para uso próprio e vai vendendo através do telefone com ímã que distribui na região onde ele pretende atuar." Segundo ele, também é comum o uso de motocicletas e o apoio indireto de revendedores formais que abastecem esses pontos ilegais.
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Risco ao consumidor
Além da concorrência desleal, os riscos para o consumidor são elevados. "O principal risco para o consumidor é que, se o botijão apresentar algum problema, ele não vai ter a quem recorrer. E hoje, com um botijão custando entre R$ 130 e R$ 140, para uma família de baixa renda, ele faz muita falta. O principal agente exposto aos riscos é o próprio consumidor", alerta Francinaldo.
Em Belém, atualmente existem cerca de 300 revendas autorizadas, de um total de 2.269 no estado, segundo dados atualizados de 2024. Ananindeua concentra 150. Mesmo com esse número expressivo, o presidente da entidade afirma que a fiscalização é ineficaz: "Nós não temos notícias de que a ANP esteja despendendo alguma energia para combater esse mercado clandestino." E completa: "Infelizmente, a revenda de GLP está jogada à própria sorte por um órgão de fiscalização tão inoperante e irresponsável como a Agência Nacional do Petróleo."
Prejuízos e riscos para quem atua na legalidade
David Nascimento, revendedor autorizado há 15 anos em Belém, afirma que a concorrência com os clandestinos afeta diretamente a sustentabilidade das empresas regularizadas. "A gente paga licenciamento, vistoria, faz recarga dos extintores… uma série de gastos. Só com legalização e documentação, minha revenda gasta cerca de R$ 8 mil por ano", relata.
Para ele, a diferença de custos entre quem está regular e quem atua na informalidade cria uma competição injusta. "O clandestino não informa nada, vende sem nota, negocia o preço que quiser. A gente vende a R$ 120 e ele vende a R$ 115, até R$ 110. E ele compra de revendedor legal, na porta da empresa, e revende", explica.
David também destaca o perigo de armazenamento incorreto: "Tem clandestino que armazena vários botijões dentro de casa. Se tiver um vazamento num local fechado, pode causar uma tragédia. A gente que é autorizado tem uma área ventilada para armazenamento, extintores, tudo regularizado", compara.
O revendedor reitera a fala do sindicato sobre a falta de fiscalização. "A última vez que eu fui fiscalizado foi em 2019. Peguei três multas. Enquanto isso, quem está clandestino segue trabalhando sem ser incomodado", lamenta. "O consumidor também corre risco, porque está deixando entrar qualquer pessoa na casa dele", acrescenta.
Situação trabalhista preocupa, mas denúncias são raras
O Ministério Público do Trabalho no Pará e Amapá (MPT-PA/AP) informou que, atualmente, existem cinco procedimentos ativos relacionados ao comércio de GLP na região de atuação do órgão nos dois estados. Os temas envolvem anotação de carteira de trabalho, meio ambiente do trabalho, trabalho infantil e condições degradantes. No entanto, o MPT reforça que atua apenas a partir de denúncias e que o número de ações ligadas ao setor ainda é pequeno, sem novos procedimentos sobre sindicatos desde 2018.
Fiscalizações e penalidades
Segundo a ANP, a atividade de revenda pode ser feita somente por pessoa jurídica autorizada pela Agência, que atenda, em caráter permanente, aos requisitos estabelecidos na Resolução ANP nº 958/2023 e às condições mínimas de armazenamento de recipientes transportáveis conforme as normas da ABNT.
Como a ANP não possui poder de polícia judiciária, visto que exerce função administrativa, não pode entrar em residências ou agir contra agentes não regulados sem apoio da autoridade policial. A atuação em locais não autorizados, em geral, ocorre junto à polícia.
A revenda de GLP sem autorização é crime e sujeita os responsáveis às sanções previstas na Lei nº 8.176/1991, que prevê até cinco anos de reclusão, sem direito a fiança. Nas fiscalizações, que também são feitas mediante denúncias, ocorre autuação e apreensão de mercadorias, incluindo botijões cheios e vazios.
A ANP tem a atribuição legal de fiscalizar os agentes econômicos regularizados, autorizados perante a Agência, e pode aplicar autuações e interdições em casos de venda para clandestinos, seja o agente distribuidor ou revendedor.
A interdição do agente autorizado perdura até a apresentação e análise da documentação que comprove a movimentação real dos produtos. Os valores de multa variam de R$ 20 mil a R$ 5 milhões.
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