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Cuidado com a saúde mental dos colaboradores deve ser foco das empresas

A maioria das políticas de combate às doenças mentais no ambiente corporativo são fracas, diz psicóloga

Elisa Vaz

A saúde mental tem sido, cada vez mais, um foco de preocupação dos trabalhadores. Em uma época em que se discute muito quadros de ansiedade e depressão, além de outras síndromes originadas pelo acúmulo de estresse no trabalho, como é o caso do Burnout, as empresas passam a olhar com mais atenção à saúde mental de seus colaboradores.

Mas as ações criadas para combater as doenças mentais no trabalho ainda são poucas. Um estudo realizado pelo LinkedIn mostra que apenas 37% dos trabalhadores acreditam que as empresas se preocupam com a saúde mental de seus funcionários, mesmo que 54% deles apontem que as organizações oferecem práticas voltadas para a questão. A psicóloga Thaysse Gomes explica que isso ocorre porque as políticas de combate são fracas – mesmo quando existem, não são suficientes.

“Ainda temos uma cultura com uma preocupação muito fraca em relação à saúde mental dentro das empresas. A maioria das políticas que aparecem são fracas e só começaram a surgir porque passamos a falar de Burnout, que o trabalhador pode adoecer e muito, e que isso pesa principalmente no bolso da empresa. E agora elas entendem que é preciso cuidar da saúde mental do trabalhador. Mas, via de regra, isso não é algo que é perpetuado e cultuado dentro das empresas de maneira a aliviar o estresse ou propor técnicas de relaxamento que fazem parte da saúde mental”, avalia.

Ter esse cuidado dentro das organizações é fundamental, diz a psicóloga. Segundo Thaysse, há um impacto notório e absurdo, até mesmo em um curto espaço de tempo. As ações necessárias incluem a proposição de políticas psicoeducativas que ensinem o funcionário sobre certas questões de demanda psicológica e abrir um espaço de escuta para os colaboradores.

“Um dos locais em que mais se desconta demandas pessoais não resolvidas é o trabalho. Então, quando não estou bem em casa, com uma questão pessoal íntima, isso sempre aparece no trabalho, seja porque não estou tão comunicativo – e a gente sabe que ter uma boa relação e saber se comunicar é imprescindível para o trabalhador – seja porque não consigo pedir ajuda, ou porque fico empacado em uma demanda, não consigo ir para frente porque aquilo está me incomodando. Abrir um espaço de diálogo tem impacto alto e rápido nesses casos”, garante a profissional.

Outro ponto fundamental é ter uma equipe qualificada para atuar nesta área. Thaysse destaca que as empresas que querem investir na saúde mental precisam ter psicólogos disponíveis na empresa, seja de maneira fixa ou não. Caso não haja disponibilidade de recursos para isso, a empresa pode investir em rodadas de palestras e dinâmicas esporádicas. Além disso, é bom pensar na criação de um espaço voltado para o descanso ou relaxamento, como uma cantina, venda de lanches, uma sala de descanso com sofá e outras opções.

Nada disso vai adiantar, no entanto, se o funcionário não se sentir acolhido pela empresa. Ainda de acordo com o levantamento, menos da metade dos respondentes (44%) diz que se sente confortável para abordar o assunto no ambiente de trabalho. Mas 91% dos entrevistados acham importante ou muito importante falar sobre saúde mental. “A ideia que a gente tem dentro de uma empresa hoje em dia é a ideia de produtividade, de um sistema capitalista. Então falar de saúde mental é falar de baixa produtividade. Como vou chegar com meu chefe e dizer que não estou bem, que minha saúde mental não está boa, que estou produzindo pouco ou que não estou dando meu máximo de produção? Na cabeça de muitos funcionários, e infelizmente é a realidade, isso é assinar uma carta de demissão. Então é muito importante abrir esses espaços de acolhimento dentro das empresas e deixar os funcionários à vontade para falar sobre esse tipo de assunto, mesmo no ambiente de trabalho”, orienta a psicóloga Thaysse Gomes.

Mulheres sofrem mais pressão

É possível que a pressão e o estresse do trabalho sejam maiores em um grupo específico. Outro dado que a pesquisa mostrou foi que 79% dos entrevistados já sofreram ou sofrem com algum problema relacionado à saúde mental. Neste cenário, as mulheres são mais afetadas - cerca de 86% delas disseram já ter passado por alguma situação do tipo. Já o índice entre os homens é de 72%.

Thaysse explica que existem alguns motivos para que as mulheres se sintam mais pressionadas que os homens. “É só a gente voltar um pouquinho e fazer uma linha histórica. O homem está inserido no mercado de trabalho há muito tempo, se comparado à mulher, que entrou no mercado no século passado. O que isso nos diz? Há um sujeito, uma mulher, que acabou de entrar no meio de trabalho, ou seja, ela precisa conquistar o espaço dela, errado é quem acha que o espaço feminino está conquistado, a gente luta a cada dia para isso, então não adianta fazer X que o homem faz, a mesma quantidade, é preciso fazer mais, melhor, a gente ainda enfrenta muitas barreiras. Isso adoece muito, causa muito estresse”, enfatiza a profissional.

Outro fator que gera um alto nível de estresse nas mulheres, de acordo com Thaysse, é que elas estão expostas a um índice “absurdo” de assédio sexual dentro do ambiente de trabalho. “Sofrer assédio no trabalho não é ter saúde mental, pelo contrário, é muito traumático. As mulheres acabam sendo um grupo de risco, ficam bem mais expostas que os homens em relação a isso”, comenta. Por isso, a psicóloga defende que as empresas pensem em estratégias específicas para o público feminino no ambiente corporativo, realizadas além do 8 de Março, quando é celebrado o Dia Internacional da Mulher.

Dentre tantos problemas mentais que podem surgir em decorrência do trabalho está a mais comum, Síndrome de Burnout, um acúmulo de estresse patológico, mas Thaysse ainda alerta para o aparecimento de depressão e quadros relacionados à ansiedade, tanto de pânico como fobia e crises ansiosas. O principal cuidado que os trabalhadores devem tomar, segundo a psicóloga, é se conhecer a ponto de identificar quando a relação de trabalho está sendo abusiva e saber a hora de parar. “Estamos vindo de um funcionamento pandêmico, onde tudo era feito de forma digital, e agora estamos com dificuldade de estabelecer limites e delimitar horários. Não é normal ficar duas horas a mais no trabalho, ou ficar 24h por dia esperando uma ligação do chefe, atender demandas às 21h da noite. O corpo não aguenta. Precisamos saber a hora de parar”, finaliza Thaysse.

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