‘O Pará está na moda’: expressão vira movimento que une moda e cultura
O boom cultural que tomou conta das ruas e das redes revela o protagonismo da estética amazônica e impulsiona o turismo e o empreendedorismo criativo

De eventos culturais à publicação nas redes sociais, passando por entrevistas com artistas, autoridades e até conversas do dia a dia, uma frase tem se espalhado com orgulho: “O Pará está na moda.” E não é apenas uma força de expressão. Cada vez mais, é comum ver pessoas usando blusas com a estampa da bandeira do estado, além de acessórios, bonés e bolsas inspirados na culinária e em elementos locais. O movimento reflete a valorização crescente da identidade paraense, impulsionada pela visibilidade que o estado tem conquistado com a preparação para a COP 30, que será sediada em Belém neste ano.
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Mas, para quem vive e produz no Pará, esse orgulho por pertencer à região e, literalmente, vestir a camisa da terra não é de hoje. Antes de virar tendência, nomes como Joelma, Zaynara, Gaby Amarantos, Viviane Batidão e Valéria Paiva já incorporavam a bandeira do Pará em seus figurinos como expressão de identidade artística e afirmação cultural. O que agora desperta o olhar do Brasil e do mundo sempre esteve presente no cotidiano, no modo de vestir, cantar e se expressar de quem cresceu no território amazônico.
A influenciadora e produtora de conteúdo Pamela Caroline Barbosa, de 25 anos, acumula 131 mil seguidores no Instagram. Atuando há oito anos na internet, ela viu na produção de vídeos com tutoriais de maquiagem e dicas de autoestima uma oportunidade de valorizar a própria identidade.
Pamela conta que, desde os primeiros vídeos, escolheu usar trilhas sonoras de brega e carimbó, ritmos que cresceu ouvindo. Ela viu nisso uma forma de tornar seu trabalho mais natural e próximo da realidade que vive. “Sempre busquei trazer minha rotina de forma orgânica, para trabalhar com marcas e atrair parcerias, mas sem abrir mão daquilo que o meu público já gostava: os challenges com maquiagem e música regional”, disse.
Segundo Pamela, o sucesso da ‘estética paraense’ não é surpresa. “Quando a gente tem orgulho de onde veio, de como fala, do que come e ouve, tudo flui mais fácil. Eu consigo mostrar minha maquiagem inspirada no Arraial do Pavulagem, falar do meu jeito e valorizar o lugar onde estou. Isso deixa tudo mais verdadeiro”, afirmou.
Para ela, o “hype” atual é importante, mas também é uma oportunidade de aprofundar as raízes. “O Pará estar em evidência é maravilhoso. A gente tem que aproveitar isso para mostrar ainda mais sobre a nossa cultura, com conteúdos sobre gastronomia, lugares, maquiagem, looks. Tudo remetendo ao que somos”, completa.
Moda como ferramenta de pertencimento
Esse movimento de valorização não se restringe às redes sociais. O setor de moda também vive um momento de efervescência criativa, refletindo o orgulho de origem e o resgate de símbolos culturais.
A empreendedora Luiza Marins, do ramo de semijoias personalizadas, acompanha essa ascensão com coleções inspiradas em elementos do cotidiano paraense. Entre as peças criadas por ela, há brincos e colares com desenhos de guaraná, o tacacá, a gíria “égua” e até letras estilizadas inspiradas nos letreiros de barcos da região.
Luiza explica que o movimento começou com uma coleção autoral lançada em 2016, inspirada no Círio de Nazaré. “Busquei elementos simbólicos como o manto de Nossa Senhora, a corda, a Catedral da Sé, tudo que representa nossa cultura”, contou.
A partir disso, vieram novos lançamentos, como a bandeira do Pará na estética do “raio-que-o-parta” - um estilo arquitetônico de décadas passadas, formado por mosaicos coloridos com fragmentos de cerâmica nas fachadas.
Para a designer, a moda é mais do que estética; ela é uma ferramenta de afirmação cultural. “Nós vivemos em uma região cheia de cores, cheiros, sabores. Tudo isso pode ser traduzido em acessórios e roupas, com significado. A peça não é só bonita, ela precisa carregar um sentimento”, acrescentou.
Do Marajó para o mundo
No município de Soure, na Ilha do Marajó, o empreendedor Madson Santos encontrou na moda uma forma de divulgar a cultura local. Conhecido como “Embaixador do Marajó”, ele atua há mais de 20 anos promovendo o turismo da região e, desde 2022, comanda uma marca de roupas com identidade marajoara.
A ideia surgiu após receber um boné personalizado de uma amiga, o que o inspirou a criar versões com o nome “Marajó”. As primeiras unidades foram vendidas em dois dias, apenas para moradores da ilha. O sucesso impulsionou o negócio, que hoje inclui camisetas com estampas das quatro raças de búfalo da região e grafismos marajoaras em estilo minimalista. “Quis criar uma malha confortável, com qualidade, para que o nome ‘Marajó’ fosse usado pelo mundo todo”, relatou.
Artistas regionais e nacionais como Gretchen e Esdras, Claudia Abreu, Alane Dias, Lia Sophia, Carolina Oliveira, a cantora Nazaré Pereira, Naieme, a top model Emilly Nunes e a cantora Liniker comparam camisetas na loja do empreender como forma de abraçar a cultura local.
Segundo ele, 60% dos clientes são turistas e 40% moradores. “É muito gratificante ver as pessoas da ilha usando algo que fala sobre onde vivem, e os visitantes levando uma parte da nossa cultura para outros lugares do Brasil”, disse.
Para Madson, o crescimento da visibilidade do Pará é um reflexo de um trabalho coletivo que já dura anos. “A COP 30 reforça esse movimento, mas a valorização da nossa cultura vem de longe. Eu estou nas redes sociais há 15 anos mostrando o Marajó. Ver esse reconhecimento hoje é emocionante”, afirmou.
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