Livrarias de rua resistem e se reinventam em Belém
Investimento em acervos específicos, foco no livreiro e em espaços de convivência traz o charme das livrarias de volta
Apesar da crise no mercado do livro no Brasil com o fechamento de grandes livrarias, as chamadas megastores, como a Cultura e a Saraiva, e a livraria Fox, em Belém, o segmento das livrarias de rua tem resistido e procurado se reinventar para atrair público. Além de enfrentar a concorrência da internet das grandes corporações como a Amazon.
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A aposta em acervos mais segmentados e direcionados, investimento nos livreiros e transformação das livrarias como espaços de convivência com cafés tem feito a Livraria Travessia se tornar a queridinha de leitores jovens da capital paraense. Por outro lado, a Livraria IFÁ, no bairro do Marco, conhecida por ser um espaço dedicado à literatura negra e amazônica, resiste e tenta se reencontrar após a pandemia de covid-19.
Localizada em um casarão antigo no nº 1404, na travessa Alcindo Cacela, entre as avenidas Governador José Malcher e Governador Magalhães Barata, a Livraria Travessia convida o público a entrar para conhecer seus dois andares de livros com 12 mil títulos. Mesmo na última quinta-feira de julho, quando a população de Belém começava a disputa na saída da cidade para aproveitar o último final de semana de férias, o fluxo na livraria era intenso.
Ao adentrar no espaço inspirado na obra “Grande Sertão: Veredas” de Guimarães Rosa percebem-se os motivos da Travessia ter se tornado o mais novo local cult da capital paraense. Pensada em cada detalhe pelo proprietário e professor de português Pedro Gama, de 28 anos, apaixonado por literatura, a livraria faz com que realmente entremos no mundo da literatura.
O acervo é dividido em 29 categorias inventivas como “Lamparina acesa” para os livros de terror; “Pindorama” para categoria da literatura brasileira; “Para ler em voz alta” - espaço da poesia; “Vivências e alteridades” livros sobre os povos; e o espaço infantil “Curumins e cunhatãs”.
“O que fez eu investir numa livraria de rua é saber que eu me sentia órfão em muitos sentidos. A Travessia vem em uma configuração de negócio muito diferente de uma grande livraria, do que eram as livrarias que vieram antes da gente, só que ao mesmo tempo, ela recupera uma figura que ficou perdida durante um tempo, o livreiro. Ele é a figura mais importante da Travessia. E, logo em seguida, é o acervo. O acervo que a gente tem, a amarração comercial faz parte de um projeto de negócio diferente de uma livraria de shopping. O que a gente faz aqui é recuperar e investir no livreiro como um farmacêutico, para cada dor ele tem uma história”, explica Pedro.
A livraria atrai muitos jovens pelo ambiente convidativo e, principalmente, pelo sucesso nas redes sociais. Uma dessas leitoras é a profissional de educação física Franciely Soares, de 27 anos. “Eu conheci a livraria através das redes sociais, do TikTok, com esses reels rápidos que tem. Eu sou muito apaixonada por livros. Estou encantada tem café e plantinhas também. É um combo perfeito”, declara.
Resistência
No bairro do Marco, na casa nº 3174, da travessa Barão do Triunfo, entre as avenidas Romulo Maiorana e Almirante Barroso, a Livraria IFÁ resiste como um espaço de conhecimento, literatura e cultura negra. Diferentemente do movimento frenético da livraria da Alcindo Cacela, a IFÁ está vazia na mesma quinta-feira. O proprietário Joares Coqueiro, 77 anos, vem pessoalmente abrir o portão para aqueles que batem em um sino na entrada.
A IFÁ iniciou na praça Batista Campos em 2006, e depois mudou para o bairro do Marco, para a casa do professor e pesquisador aposentado Joares Coqueiro. O conceito da livraria está no nome IFÁ que significa em na língua yoruba a testemunha do destino e o antigo oráculo da terra. A palavra também pode designar todo o conhecimento produzido pelo homem e a organização de pensamento da cultura africana.
“Quando você cria uma livraria e coloca um nome específico nela já começa a resistência, já é uma resistência. Ela tem um lado específico, isso eu faço questão de dizer, não me interessa o comercial, ou colocar qualquer tipo de obra aqui. Ela tem um lado, é daqueles que lutam por um Brasil democrático, justo, contra o racismo, contra a homofobia”, acentua o proprietário Joares Coqueiro.
O principal desafio para Joares e Pedro é concorrer com as grandes corporações como a Amazon que vendem livros mais baratos e na praticidade de casa. A pandemia dificultou ainda mais as coisas com o encerramento de vários projetos culturais que movimentam a IFÁ. O livreiro Joares planeja retomar os saraus, rodas de leitura, lançamento de livros e outras atividades, assim como abrir uma galeria e um café no espaço.
Pedro Gama, que era um dos clientes da IFÁ, resume o diferencial das livrarias de rua para os sites. “Você pode encontrar aquilo que você encontraria em outros lugares, mas eu tenho a certeza que o algoritmo não te recomendaria, aquilo que vou te recomendar. A função do livreiro é principalmente surpreender, mostrar novos caminhos”, assegura.
Conheça as livrarias
Livraria Travessia
Acervo com 12 mil livros, possui café e espaço de convivência
Horário de funcionamento: terça-feira a sábado de 9h às 20h
Livraria IFÁ
Especializada em literatura negra, amazônica, paraense, LGBTQIA+
Horário de funcionamento: segunda-feira a sábado de 9h às 19h
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