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Por Marco Antônio Moreira

Coluna assinada pelo presidente da Associação dos Críticos de Cinema do Pará (ACCPA), membro-fundador da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (ABRACCINE) e membro da Academia Paraense de Ciências (APC). Doutor em Artes pelo PPGARTES/UFPA; Mestre em Artes pela UFPA. Professor de Cinema em várias instituições de ensino, coordenador-geral do Centro de Estudos Cinematográficos (CEC), crítico de cinema e pesquisador.

Werner Herzog e o Cinema como Realidade

Marco Antonio Moreira
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O cineasta alemão Werner Herzog completou 79 anos este mês. É importantíssimo evidenciar a obra cinematográfica deste artista, que fez inúmeras loucuras para realizar seus filmes com atos que criaram momentos antológicos de criação, inspiração e reflexão nos espectadores que acompanham e admiram seu talento. Herzog faz parte do novo cinema alemão que surgiu no final dos anos 1960 ao lado de cineastas como Win Wenders, Rainer Werner Fassbinder, Margarethe Von Trotta e Volker Schlöndorff, entre outros. 

Com preferência por protagonistas com sonhos e atitudes impossíveis e à margem da normalidade imposta pela sociedade, Herzog filmou Hércules, seu primeiro filme, em 1962. Mas seu trabalho ficou em evidência a partir do final dos anos 1960, com o lançamento de Sinais de Vida (1968). Este filme mostra a história de quatro personagens que se refugiam, durante a guerra, num forte isolado e vazio. Herzog desenvolveu uma carreira com realizações de filmes de ficção e documentário mesclando sua atividade entre estes dois gêneros de maneira brilhante e constante.

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O primeiro filme que assisti de Herzog foi o extraordinário O Enigma de Kaspar Hauser (1975). Este filme me impressionou pela maneira como o diretor escolheu para contar uma história profunda e reveladora das naturezas do ser humano. O filme é baseado no livro de Jakob Wassermann publicado em 1908, que revela o caso de um adolescente encarcerado na Alemanha do século XIX. Ele só teve contato com pessoas aos 16 anos. Muitas pessoas tentam ajudá-lo na aprendizagem verbal ou social e acompanhamos sua trajetória surpreendente em um filme impactante.

Posteriormente, tive a oportunidade de assistir Coração de Cristal (1976) no Cinema 1. Esta produção foi filmada com os atores hipnotizados com o objetivo de criar uma atuação misteriosa em uma história que se passa no século XVIII em um vilarejo que vive economicamente da produção de vidro. Quando o único homem que conhecia o segredo para a produção de vidro morre, a cidade entra em crise e um vendedor dos produtos procurar descobrir o segredo de fabricação dos vidros de rubi. Felizmente, em uma época de distribuidoras de filmes de arte e cineclube, tive acesso a outras obras de Herzog como Os Anões também começaram pequenos (1970), Aguirre A Cólera dos Deuses (1972), Stroszek (1977) e a maravilhosa refilmagem de Nosferatu (1979).

Para surpresa dos cinemaníacos paraenses, Herzog esteve em Belém no início dos anos 1980 para buscar informações e locações para Fitzcarraldo (1982), um ambicioso projeto sobre um homem determinado que queria construir uma casa de ópera no meio da floresta amazônica . Estive presente em um inesquecível encontro de Herzog com a crítica cinematográfica local. Falando em espanhol, ele comentou sobre seu novo filme e deixou boas memórias para aqueles que tiveram a oportunidade de conversar com ele. 

Entre tantas obras singulares em sua carreira, entendo que é preciso destacar também os documentários que Herzog realizou com a mesma maestria dos filmes de ficção. Entre seus melhores momentos neste gênero, destaco Fata Morgana (1971) com imagens e reflexões sobre o deserto do Saara, Terra da Luz e Escuridão (1971) sobre a história de Fini Straubinger (que ficou cega e surda após uma queda aos nove anos), O Homem-Urso (2005), sobre a vida e a morte do ambientalista Timothy Treadwell, Encontros no Fim do Mundo (2007), realizado na Antártida, A Caverna dos Sonhos Esquecidos (2010), realizado nas cavernas de Chauvet, na França, onde estão as pinturas mais antigas feitas pelo homem com desenhos há 30 mil anos, e Into the Abyss (2011) sobre presos condenados ao Corredor da Morte nos EUA.

Herzog tem trabalhado, eventualmente, como ator. Segundo ele, não se pode perder oportunidades de conseguir recursos para seus projetos. Sua verdadeira paixão é dirigir filmes, se encontrar nas loucuras de seus personagens, na dinâmica de produzir uma obra cinematográfica. Um dos exemplos mais marcantes de seu ímpeto criativo foi na produção do documentário La Soufrière (1977). Um vulcão estava prestes a entrar em erupção na ilha francesa de Basse-Terre, em Guadalupe. Herzog viu a notícia em um telejornal na Alemanha, chamou seu cameraman e viajou para a ilha com o objetivo de filmar a erupção. Depois de se arriscar as filmagens, ele reclamou que o vulcão não entrou em erupção. Certamente, ele queria filmar esse momento único.

Entendo que a atitude de levar suas ideias ao limite para gerar um cinema influente ao espectador é digna de admiração. A proposta de construir um cinema questionador por meio da realidade ou ficção de maneira surpreendente (estética e culturalmente) é sem dúvida uma das características mais marcantes de um artista no Cinema. E Herzog merece todo respeito pelo modo como conseguiu elaborar sua trajetória no cinema. Em recente entrevista, Herzog foi questionado se existe algo que ele queira filmar após diversas experiências. Ele respondeu: “eu gostaria de estar numa estação espacial. Ou na Lua, ou em uma visita a Marte, se isso for possível um dia”. Esse é Werner Herzog! Para entender sua obra, sugiro dois livros: Werner Herzog O Cinema como realidade (1991) de Lúcia Nagib e Caminhando no Gelo (relatos de Herzog sobre uma viagem que ele fez na Alemanha). Viva Herzog!

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