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Capacitismo e arte: os desafios da representação e representatividade no entretenimento

Discussão sobre o preconceito sofrido por pessoas com deficiência caminha a passos lentos, mas arte mostra caminhos possíveis

Lucas Costa
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Capacitismo pode parecer uma palavra nova no universo, mas trata-se de uma realidade enfrentada por muitos brasileiros ao longo de toda a vida. O termo refere-se ao preconceito sofrido por pessoas com deficiência, que se perpetua por conta da discussão sobre ele sempre caminhar a passos lentos.

O capacitismo se mostra em praticamente todos os setores da sociedade, inclusive na arte. Recentemente um caso de repercussão mundial revelou o tamanho do desinteresse em desconstruir tal preconceito, quando a Warner Bros teve que se desculpar após acusações de capacitismo no filme “Convenção das Bruxas”.

A nova adaptação do clássico romance infantil de Roald Dahl, de 1983, retrata pessoas com deficiências físicas como bruxas, e a associação não foi bem recebida por muitos telespectadores, que argumentaram que o traço ajudava a perpetuar uma antiga e opressiva noção de que pessoas com deficiência física são, de alguma forma, malignas e/ou assustadoras.

Um dos possíveis caminhos para entender a perpetuação do capacitismo em expressões como o audiovisual, por exemplo, é o mesmo que leva a uma lista de outros preconceitos: a falta de representatividade. O ator e jornalista Leandro Oliveira, 32, tem sindactilia e malformação congênita em uma das mãos, e conta como se entender uma pessoa com deficiência dentro das artes cênicas foi “um processo tortuoso”.

“Dentro do teatro, independente das áreas que eu atuei, nunca senti de fato o capacitismo. Porque o teatro é um espaço de maior liberdade para artistas(...). É um espaço em que nunca senti o capacitismo me imobilizando de qualquer forma, coisa que não aconteceu com as minhas experiências como audiovisual; eles sempre penderam para tornar a minha deficiência física um empecilho", relembra Leandro.

“Eu já fui claramente recusado em testes por conta da deficiência, seja ela por motivos estéticos, ou provavelmente pela minha deficiência ser na mão, e eles acharem que eu não poderia carregar alguém ou fazer tal coisa. Enfim, já aconteceu em comerciais, gravações de clipe, curtas… e é muito doido porque acaba sendo um reflexo que eu sinto enquanto pessoa com deficiência”, conta.

Leandro fala ainda sobre uma característica do audiovisual que exclui pessoas com deficiência até mesmo quando há a tentativa de representá-las. “Normalmente pessoas sem deficiência são escaladas para papéis de pessoas com deficiência, e sempre tem esse apagamento dentro do audiovisual. Nas artes cênicas existe, existiu para mim, esse abismo entre o que eu faço no teatro e o que faço no audiovisual”, diz.

Um caso que gerou grande repercussão na mídia, e trouxe a falta de tal representatividade para o centro do debate, ocorreu em 2016. A campanha “Somos Todos Paralímpicos” trazia como estrelas os atores Paulinho Vilhena e Cleo Pires, em fotos com montagens que mostravam seus corpos com alguma deficiência, sob o intuito de dar visibilidade aos paratletas brasileiros naquele ano.

Próximo ato

Se estender o debate para o humor, é possível perceber que o capacitismo ainda é, muitas vezes, a própria piada. Em um vídeo recente do canal “Vai Uma Mãozinha Aí?”, a youtuber Mariana Torquato, falou sobre a responsabilidade de humoristas que, ainda hoje, fazem piada com pessoas com deficiência, sob a desculpa de inclusão.

Mariana sugere que, em vez de tornar deficiências o centro do riso, que os humoristas se preocupassem em trazer pessoas com deficiência humoristas para se apresentar. O caminho é parecido com o sugerido por Leandro.

“Por muito tempo, de fato, as deficiências, especialmente físicas, foram usadas com humor depreciativo, bem problemático. Mas ao mesmo tempo a gente pode caminhar para não rir dessas pessoas, mas para rir com elas”, defende Leandro.

Leandro cita como exemplo a humorista Lorrane Silva, 24, mais conhecida como Pequena Lô, que produz conteúdo para redes sociais como Instagram e TikTok. A jovem mineira nasceu com membros curtos devido a uma síndrome não identificada, associada a displasia óssea, e usa muletas e uma scooter para se locomover.

“Ela [Pequena Lo] consegue fazer um humor em que sua deficiência está lá, ela é um fato, um acontecimento, às vezes utilizado no modo dela fazer humor pelo TikTok. Mas ela é uma pessoa com deficiência, com um humor para muito além da sua deficiência. Então acho que quando a sociedade caminha para normalizar a deficiência no seio dela, o humor caminha junto, e isso é legal”, diz.

O caminho mais importante para o fim do capacitismo é a normalização dos corpos de pessoas com deficiência por pessoas sem deficiência, defende Leandro, que também reitera que tal discussão é antiga e caminha a passos muito lentos. “A partir do momento em que a pessoa sem deficiência começam a estar mais abertos para nos ouvir da maneira como nós nos expressamos, muitas vezes com dificuldade de fala, ou a inexistência dela, ou mesmo de gestos e afins; a partir daí a gente tem uma discussão maior sobre quem nós somos e o que a gente espera para a sociedade. Pessoas com deficiência são, acima de tudo, pessoas”, defende.

Para acompanhar:

Leandro compartilha sua lista de pessoas para seguir e ficar por dentro do assunto:

- Lorrane Silva - @_pequenalo no Instagram

- Victor Di Marco - @victordimarco no Instagram

- Nathalia Santos - @nathaliasantos no Instagram

- Kitana Dreams - no YouTube

- Mariana Torquato - canal “Vai Uma Mãozinha Aí” no YouTube

- Mateus Baptistella - canal "Virei Adulto" no YouTube

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Cultura
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