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Por Marco Antônio Moreira

Coluna assinada pelo presidente da Associação dos Críticos de Cinema do Pará (ACCPA), membro-fundador da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (ABRACCINE) e membro da Academia Paraense de Ciências (APC). Doutor em Artes pelo PPGARTES/UFPA; Mestre em Artes pela UFPA. Professor de Cinema em várias instituições de ensino, coordenador-geral do Centro de Estudos Cinematográficos (CEC), crítico de cinema e pesquisador.

'Zona de Interesse' e os horrores da guerra e do alheamento

Marco Antonio Moreira
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O cinema, uma das formas de arte mais influentes dos séculos XX e XXI, não apenas entretém, mas também serve como um espelho para refletir sobre diferentes realidades e questões humanas, especialmente aquelas relacionadas às guerras, que se tornaram temas recorrentes na sétima arte. Nas últimas décadas, diversos cineastas têm se destacado ao explorar aspectos da guerra de forma aprofundada, transcendendo visões simplistas ou maniqueístas.

"Zona de Interesse", dirigido por Jonathan Glazer e atualmente em exibição nos cinemas, se destaca como uma obra expressiva que aborda de forma admirável questões fundamentais relacionadas aos conflitos durante a segunda guerra mundial. O filme é baseado na vida de Rudolf Höss, um dos administradores do campo de concentração de Auschwitz, que junto com sua família leva uma vida aparentemente perfeita em uma casa próxima ao campo de concentração. Enquanto desfrutam de uma rotina familiar aparentemente normal, não se preocupam com os horrores ao seu redor. O filme retrata de maneira metafórica a banalidade do mal por meio do alheamento dos personagens principais dessa família. Veja o trailler:

Rudolf e sua esposa Hedwig transmitem seu alheamento em relação aos fatos ao seu redor, retratados como personagens que enxergam o mundo apenas através de suas próprias perspectivas e desejos. Enquanto Rudolf busca promoção em sua carreira dentro do Terceiro Reich, Hedwig se concentra em criar um ambiente doméstico perfeito, ignorando o que acontece além dos limites de sua casa. No entanto, outros personagens surgem brevemente, mas de forma significativa, como a mãe de Hedwig, que silenciosamente se incomoda com a percepção desse suposto mundo perfeito.

O diretor Glazer retrata a falta de senso ético e humano por meio de diversas situações, buscando provocar no espectador um incômodo diante de tanta apatia. O final enigmático e transcendental do filme não apenas fecha a narrativa de forma magistral, mas também serve como um lembrete didático necessário. Num mundo em que há quem questione a veracidade do Holocausto, é crucial evidenciar essa triste página da história da humanidade do século passado.

Ao testemunharmos a indiferença dos personagens principais em relação ao que os cerca, somos confrontados com paralelos perturbadores com nossa própria sociedade contemporânea. Os saltos temporais, avançando e retrocedendo no final do filme, reforçam a alienação de uma sociedade em relação às violências presentes em nosso cotidiano e suas consequências.

Do ponto de vista estético, "Zona de Interesse" revela a poderosa força do cinema como meio audiovisual. O diretor emprega de forma diferenciada imagens e sons. A violência não é explicitamente mostrada; ela é sugerida pelos tiros e gritos que ecoam; é vista pela fumaça que surge do campo de concentração. Desde a cena inicial do filme, com uma tela escura e um som alto que evoca a sensação de um ritual, até momentos cruciais em que a imagem se torna completamente vermelha acompanhada de um som ensurdecedor, cada elemento é utilizado com maestria para criar impacto.

Um exemplo marcante é a personagem da mãe de Hedwig, cujo silêncio e repulsa a violência tão próxima da casa são expressos através das imagens, como quando ela é mostrada deitada no quintal e se levanta ao perceber a fumaça e ouvir os tiros, tudo sem a necessidade de diálogos ou palavras, apenas através de imagens e sons.

"Zona de Interesse" é uma obra que provoca múltiplas interpretações. Com atuações fantásticas de Christian Friedel (conhecido por "A Fita Branca") e Sandra  Hüller (reconhecida por "Anatomia de uma Queda"), esta adaptação do livro homônimo de 2014, escrito por Martin Amis, reafirma o papel crucial do cinema como arte que nos convida a refletir sobre os caminhos da humanidade. Especialmente nos confronta com os horrores da guerra e as cumplicidades daqueles que a perpetuam por meio de suas indiferenças e apatias.

Dicas de filme para a semana de 23/02 a 01/03 

- “Pobres Criaturas” de Yorgos Lanthimos com Emma Stone, Willem Dafoe e Mark Ruffalo e “Ferrari” de Michael Mann com Adam Driver e Penélope Cruz (Circuito Comercial).

- “Zona de Interesse” de Jonathan Glazer, “Anatomia de uma Queda” de Justine Triet e “Vidas Passadas” de Celine Song (Cine Líbero Luxardo).

- "Casamento ou Luxo” (Uma Mulher em Paris) de Charles Chaplin. Com Edna Purviance e Carl Miller. Acompanhamento musical ao vivo com Paulo José Campos de Mello (Cineclube SINDMEPA. Terça-feira, dia 27/02, às 19h. Entrada gratuita).

 

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