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Por Marco Antônio Moreira

Coluna assinada pelo presidente da Associação dos Críticos de Cinema do Pará (ACCPA), membro-fundador da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (ABRACCINE) e membro da Academia Paraense de Ciências (APC). Doutor em Artes pelo PPGARTES/UFPA; Mestre em Artes pela UFPA. Professor de Cinema em várias instituições de ensino, coordenador-geral do Centro de Estudos Cinematográficos (CEC), crítico de cinema e pesquisador.

Paulo José e Tarcísio Meira: talentos que inspiram

Marco Antonio Moreira

Paulo José e Tarcísio Meira tornaram-se imortais na semana passada. Certamente, os dois estão entre alguns dos mestres da atuação que têm um talento tão notável que chega a ser um desafio dissociar seus trabalhos dos personagens que viveram nas telas dos cinemas. Lembro-me de assistir pela primeira vez Macunaíma (1969), de Joaquim Pedro de Andrade, e ficar deslumbrado em ter o mesmo personagem interpretado por dois grandes atores: Grande Otelo e Paulo José. 

Otelo é uma das maiores referências da arte brasileira desde os filmes da Chanchada, nos anos 1950, e Paulo José estava desenvolvendo sua trajetória de ator quando Macunaíma foi lançado. Lembrava dele no delicioso seriado “Shazam e Xerife” e de atuações em algumas telenovelas da Rede Globo, mas não conhecia a extensão do seu trabalho artístico no cinema. Paulo estava deslumbrante ao interpretar e ser Macunaíma, um personagem tão brasileiro, repleto de características e comportamentos de um país tão estranho e sedutor como o Brasil. 

Cine News 2008

 

Posteriormente, conheci e reconheci a excelente atuação de Paulo em muitos filmes - como O Padre e a Moça (1966), Todas as Mulheres do Mundo (1967), O Rei da Noite (1975), Eles não usam Black-Tie (1981), O Homem do Pau Brasil (1981) e Faca de dois Gumes (1988), entre outras produções. O lançamento no festival de Paulínia de O Palhaço (2011), um de seus últimos filmes, foi um momento inesquecível. Eu estava no festival, pude assistir ao belo filme e depois testemunhar a presença de Paulo José no palco do cinema, e vê-lo sendo aplaudido pelo público presente ao lado de outros atores e equipe técnica do filme. Foi bonito observar essa ovação a um ator tão significativo para o Brasil. Em todos estes filmes, era perceptível o talento de Paulo José e sua sensibilidade em interpretar papéis tão distintos, que encontravam nele uma disposição rara de interpretar e ser este personagem. Na comédia, drama ou filme policial, Paulo soube superar a expectativa do público a cada novo trabalho e, por isso, tornou-se memorável por parte daqueles que conseguiram acompanhar sua trajetória como ator. 

Tarcísio Meira foi um ator constante em diversas telenovelas durante décadas e seu sucesso foi comprovado em obras marcantes para muitas gerações de telespectadores, como Irmãos Coragem (1970-1971). Apesar de seu sucesso na TV, estranhava que ele não fizesse muitos filmes. Lembro-me de Independência ou Morte (1973), em que ele interpretava D. Pedro I em um filme pouco inspirado. Mas sua carreira no cinema teve um destaque especial no final dos anos 1970, quando ele procurou escolher papéis que o afastassem da imagem de galã de telenovelas. República dos Assassinos (1979), A Idade da Terra (1980), Eu te Amo (1981) e O Beijo no Asfalto (1981) foram filmes em que ele interpretou personagens difíceis, complexos e enigmáticos. Provavelmente seus admiradores das telenovelas não o reconheceram nestes filmes, mas certamente a maioria percebeu a intensidade de seu repertório como ator que, muitas vezes, não era explorada no formato das telenovelas. 

Em República dos Assassinos, ele interpretou um policial envolvido com o esquadrão da morte no Rio de Janeiro nos anos 1970. Em Eu te Amo, ele é um dos personagens em delírio que tenta lidar com suas vidas frustradas e cotidianas. Em O Beijo no Asfalto, baseado na obra de Nelson Rodrigues, faz parte de uma história que envolve um desconhecido que é morto ao ser atropelado por um ônibus e pede a um bancário que lhe dê um beijo na boca. Em A Idade da Terra, Tarcísio interpretou um personagem especial com a direção do genial Glauber Rocha. Neste filme é possível testemunhar um ator disponibilizando ao seu personagem uma intensidade emocionante na fala, nos gestos, olhares e posicionamento perante a câmera. Entendo que Glauber Rocha conseguiu a melhor interpretação de Tarcísio Meira no cinema em um filme que procurou retratar a situação política e cultural do Brasil no final dos anos 1970. Em todos estes filmes, foi possível ratificar o talento de Tarcísio Meira e esperar novos desafios na sua carreira no cinema.

Paulo José e Tarcísio Meira construíram uma trajetória no cinema diferenciada, reveladora de suas habilidades de atuação e "cheios de enigmas e completos de enredos" como nos diz o genial Zé Ramalho na bela "Beira-Mar" (Capítulo II) . Certamente, todos os filmes de que participaram são referências para aqueles que admiram a arte da interpretação e procuram aprender sobre possibilidades e inovações artísticas. O cinema brasileiro tem uma extensa galeria de grandes atores e atrizes que merecem reconhecimento constante - como Grande Otelo, Oscarito, Paulo Autran, Fernanda Montenegro, Marília Pera, Othon Bastos, Lima Duarte, Marieta Severo, José Wilker, Nathalia Timberg e muitos outros. Certamente, essa galeria artística inclui Paulo José e Tarcísio Meira. Espero que as novas gerações de cinemaníacos possam conhecer e estudar o legado destes atores como homenagem aos seus talentos!

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