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Nomofobia, a fobia dos novos tempos

O debate sobre o medo de ficar sem celular ganhou um dia especial no Estado do Pará

Vito Gemaque
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O medo ou a ansiedade excessiva de ficar sem acesso ao celular ou à internet é uma nova fobia fruto dos tempos hiperconectados. A conscientização para o combate à chamada nomofobia ganhou uma data especial no Estado do Pará, anualmente no primeiro domingo de setembro, conforme determina a Lei nº 11.189/2025. O Dia Estadual de Combate à Nomofobia pretende debater e conscientizar sobre o tema. Especialistas apontam que essa ação é fundamental para a sociedade entender o problema.

O operador de caixa Eric Pinheiro, de 22 anos, utiliza o celular diariamente para o lazer e diversas outras atividades essenciais, como acessar bancos, pedir transporte ou comida e se comunicar com amigos e familiares. Ele tem buscado equilíbrio para não se manter tanto tempo no smartphone. “Costumo usar bastante, é mais para me distrair. Em torno de seis horas por dia, o que já é muita coisa”, avalia.

Eric não sente ter dependência do celular. Ele já ficou um mês sem aparelho e até se acostumou, depois do sufoco inicial. Entretanto, Eric percebe cada vez mais as pessoas dependentes dessa tecnologia. “Conheço pessoas que são dependentes. Percebi a minha irmã quando perdeu o celular dela, ficou desesperada, dizia que a vida dela estava lá. Parecia como se tivesse perdido algum parente, e era só um celular”, comenta.

A nova lei busca alertar a população sobre os riscos e as consequências do uso exagerado de dispositivos móveis, além de promover ações educativas voltadas à saúde mental e ao uso consciente da tecnologia. De acordo com o texto aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), a data servirá como incentivo para que órgãos públicos, conselhos profissionais, entidades religiosas, organizações sociais e empresas privadas realizem campanhas, palestras e seminários sobre o tema.

“Nomofobia é o medo irracional e desproporcional de uma situação, de um estímulo ou objeto, e ‘nomo’ é uma expressão para ‘no mobile phone’, ou seja, sem celular. É o medo irracional de ficar sem celular, seja por ter deixado em casa, porque a bateria acabou ou qualquer tipo de situação que deixe a pessoa sem o aparelho. A nomofobia pode causar ansiedade, dependendo do caso, desespero, palpitações, taquicardia, assim como qualquer outro tipo de fobia”, explica o psicólogo e professor de Psicologia da Universidade da Amazônia (Unama), Erick Noborikawa.

De acordo com Noborikawa, o uso do celular muitas vezes acaba sendo uma forma de fugir da realidade, por isso não ter o aparelho gera ansiedade. Uma das características dessas pessoas é o medo de perder alguma informação nas redes sociais. “Isso também pode gerar problema de autoestima, porque vai gerar problemas de auto comparação, provocados indiretamente pelo uso excessivo e vício em usar o celular”, detalha.

A utilização de smartphones gera um fenômeno neurofisiológico no cérebro, como uma sensação de recompensa devido à liberação de dopamina — um dos principais neurotransmissores ligados à motivação. “Imagina como se usar celular fosse uma espécie de droga: quanto mais a pessoa usa, mais dependência gera. Vai chegar um tempo em que a pessoa vai ter que usar muito mais o celular para entrar nesse estado de prazer. O próprio uso do celular vai gerar maior dependência por uma questão neurobiológica”, explica.

SONO — Outro malefício é a possível alteração do ciclo de sono, pois os estímulos das redes sociais e dos aplicativos fazem com que as pessoas percam a vontade de dormir. A luz azul da tela dos smartphones também cansa os olhos. Desde 2018, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece a nomofobia como um transtorno que se encaixa na família das fobias, como agorafobia e fobia social, entre outras.

A pedagoga Bianca Ribeiro, de 28 anos, confessa utilizar bastante o smartphone e não largar nem nos momentos em que está comendo. Ela calcula que use o aparelho cerca de 16 horas por dia, pela necessidade de estudar e trabalhar. O prejuízo vem na hora de dormir. Bianca trabalha com redes sociais e com a administração de imóveis em plataformas de aluguel por temporada.

“O prejuízo é principalmente para dormir, porque ele praticamente rouba o meu sono. Durante o dia, pela manhã e à tarde, eu costumo usar o celular mais para trabalho, mas, quando chega a noite, no horário em que vou dormir, começo a usar o celular, utilizo as redes sociais e vejo vídeos”, detalha. No outro dia, Bianca percebe que deixa de ser produtiva por causa do cansaço da noite anterior.

O receio de Bianca de ficar sem celular é pela dependência do aparelho para o trabalho. “O receio é mais porque envolve o meu trabalho. Eu só consigo me manter estabilizada por causa dos meus trabalhos, que estão basicamente inseridos nele. Mas, pela questão emocional, não. Seria muito bom viver em um mundo sem celular e poder socializar melhor com pessoas presencialmente, e também poder me conectar com o que tanto gosto, que é a natureza”, imagina.

CONSCIENTIZAÇÃO – A psicóloga Vicky Cordeiro da Rocha, membra do Conselho Regional de Psicologia da 10ª Região (CRP-10), avalia ser extremamente relevante para a sociedade falar sobre essa condição cada vez mais presente. “É extremamente relevante por estarmos falando de uma condição que assola principalmente adolescentes e jovens. Com uma lei podemos, além de gerar debates sobre o tema, direcionar verba pública para pensarmos em ações e educação permanente para a equipe de saúde mental do Estado”, destaca.

As primas Edivany Teixeira, de 31 anos, pedagoga, e a professora Larissa Teixeira, de 27 anos, percebem que a nova geração é muito apegada ao celular. “Para a minha sobrinha, que é adolescente, ficar sem celular é muito estressante. Eles estão muito dependentes do smartphone”, aponta Edivany. Esse é o mesmo sintoma que Larissa percebe nos mais jovens. “Eu visualizo mais isso nas crianças, ainda mais com relação a jogos digitais. Essa nova geração está dependendo bastante dos smartphones. Os jogos fazem as crianças ficarem alegres e, quando você retira o celular, elas acabam chorando e se estressando”, concorda Larissa.

O pesquisador de novas formas de comunicação, Mário Camarão, professor da Unama e especialista em cibercultura e redes de informação, estuda a relação entre tecnologia digital e a reconfiguração humana em imagem digital. “Não há substituição [da comunicação presencial], há transmutação. O que muda é o modo de presença, não a necessidade de vínculo. Acredito que não estamos substituindo a comunicação direta, mas transformando a forma como ela acontece. Continuamos precisando do outro, continuamos buscando vínculo, afeto, presença... o que mudou foi o meio”, exemplifica.

EDUCAÇÃO – No entendimento dos pesquisadores, o caminho para evitar o adoecimento e garantir o bom uso das novas tecnologias passa pela educação. O problema não está na tecnologia, mas na falta de preparo para lidar com ela. “As escolas e as famílias raramente ensinam sobre convivência digital, sobre empatia e responsabilidade nas redes. É por isso que precisamos falar de educomunicação, que é justamente essa educação para o uso consciente da tecnologia”, adverte.

A psicóloga Vicky Cordeiro destaca que essa preparação deve ocorrer desde a infância, com o uso responsável e limitado de acesso à internet e aos aparelhos eletrônicos. É importante pensar em acordos sobre tempo e quantidade de uso. As pessoas devem “atentar-se para os primeiros sinais e sintomas [da nomofobia] para buscar acompanhamento psicológico e incentivar a realização de atividades ao ar livre ou atividades físicas, seja convidando para estar junto com a rede de apoio (família, amigos) ou uma atividade que goste de fazer sozinhos”, orienta Vicky.

Recomendações para prevenir e lidar com a nomofobia

Estabeleça limites de tempo de uso do smartphone

Crie zonas sem celular

Desative notificações não essenciais

Evite o uso do celular antes de dormir

Pratique o “detox digital” regularmente

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