Mais de 80% dos trabalhadores domésticos do Pará não têm carteira assinada

Das 180 mil pessoas ocupadas com o cuidado do lar, apenas 22 mil trabalham formalmente no regime CLT

Elisa Vaz

Na véspera do Dia do Trabalhador Doméstico, celebrado nesta quarta-feira (27), o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) publicou um estudo mostrando que mais de 80% dos trabalhadores desta categoria estão ocupados sem carteira assinada no Pará, embora a Lei do Trabalhador Doméstico esteja em vigor já há alguns anos. Os dados são do quarto trimestre do ano passado, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em todo o Norte, o Pará é o Estado com o maior quantitativo de trabalhadores domésticos ocupados, alcançando um total de 180 mil pessoas, cerca de 44% do total da região, que agrupa 409 mil pessoas ocupadas no trabalho doméstico. Destas, apenas 22 mil pessoas (13,9%) tinham carteira de trabalho assinada no final de 2021 no território paraense, e o restante, cerca de 158 mil pessoas (87,8%), não trabalhava nesse regime.

O total de trabalhadores domésticos neste trimestre foi 4,6% superior ao do mesmo período do ano anterior, com oito mil pessoas a mais, mostra o órgão. Mas, quanto às pessoas que tinham carteira assinada, houve uma queda de 21,4%, com seis mil trabalhadores a menos. O Dieese ainda aponta uma alta de 10,5% no número de pessoas sem o regime de Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), com 15 mil pessoas a mais.

Atrás do Pará, aparecem, na quantidade de trabalhadores domésticos, os Estados do Amazonas (81 mil, ou 19,8%), Tocantins (51 mil, ou 12,5%), Rondônia (44 mil, ou 10,8%), Acre (21 mil, ou 5,1%) e Amapá e Roraima (ambos com cerca de 16 mil pessoas ocupadas, ou 3,9% do total do Norte). Na região como um todo, apenas 57 mil pessoas (13,9%) tinham carteira de trabalho assinada no fim do ano passado, e o restante não possuía essa garantia, cerca de 352 mil pessoas (86,1%).

Trabalhadoras queriam mudar de vida

Entre tantas pessoas que atuam no trabalho doméstico estão Carmem Lima, de 46 anos, e Raquel Sobrinho, de 35. As duas atuam em casas diferentes e não se conhecem, mas têm histórias parecidas: vieram do interior do Estado para tentar uma vida melhor em Belém. Hoje, elas têm dois filhos cada uma e vêem neles uma oportunidade de ter um futuro mais leve.

A diferença entre Carmem e Raquel é que a primeira trabalha sem carteira assinada, por vontade própria, e a segunda atua formalmente com CLT. Carmem conta que já está na área há décadas, e que começou a trabalhar cuidando de lares porque não encontrou outro serviço. “Eu já pensei em mudar, mas eu morava no interior e não terminei meus estudos, então é mais difícil. Para mim está bom, gosto de cuidar de casas”, afirma.

Ela se mudou para Belém aos 18 anos, e foi só depois disso que se tornou uma trabalhadora doméstica. Carmem optou por morar na capital para “mudar de vida” e, ao longo desses anos de trabalho, conseguiu algumas grandes conquistas, como a compra da casa própria. “Isso não tem preço”, diz. Hoje tem duas filhas adultas – uma com 18 anos, prestes a fazer vestibular, e outra com 21 anos, fazendo um curso técnico. “Agora quero que elas cuidem de mim”, adianta.

Sobre a carteira, Carmem afirma que nunca pensou em exigir essa modalidade de trabalho. Ela diz que seu avô trabalhou por muitos anos no regime CLT, contribuindo todos os meses, mas no final se aposentou e o benefício não valeu o preço que ele pagou. “Vou me aposentar por idade. Mas vou demorar muito ainda, sou nova e ainda sou morena, dizem que a gente demora mais a envelhecer”, brincou Carmem.

Já Raquel lembra que foi sua patroa quem fez questão de assinar sua carteira de trabalho para deixar tudo nos eixos, formalmente, e a trabalhadora gosta de ter os direitos garantidos. Ela se mudou para Belém para morar com uma tia e conseguiu alguns trabalhos como babá. Depois, foi chamada para cuidar de uma casa, onde está há 16 anos agora. “Só tenho que agradecer a Deus pelo trabalho e pela patroa maravilhosa que tenho. Sempre gostei de cuidar de casa, desde os oito anos de idade já tinha alguma coisa para fazer em casa”, lembra Raquel.

Embora ela também já tenha pensado em mudar de profissão ao longo dos anos, diz que está focada no seu trabalho. Para o futuro, espera conseguir dar uma vida melhor para os filhos, de 5 e 8 anos de idade. Um deles já sabe que quer ser policial, e o outro, médico. “Futuro se a gente soubesse... Mas o que eu penso é poder ajudar meus filhos, dar uma coisa melhor para eles, alimentação, escola. Eu falo para eles: depois de todo o meu sacrifício, espero ser recompensada quando eles se formarem”, brinca.

Panorama de pessoas ocupadas no trabalho doméstico na região Norte

Pará
Total: 180 mil
Com carteira: 22 mil (13,9%)
Sem carteira: 158 mil (87,8%)

Amazonas
Total: 81 mil
Com carteira: 11 mil (13,6%)
Sem carteira: 70 mil (86,4%)

Tocantins
Total: 51 mil
Com carteira: 6 mil (11,8%)
Sem carteira: 45 mil (88,2%)

Rondônia
Total: 44 mil
Com carteira: 9 mil (20,5%)
Sem carteira: 35 mil (79,5%)

Acre
Total: 21 mil
Com carteira: 4 mil (19%)
Sem carteira: 17 mil (81%)

Amapá
Total: 16 mil
Com carteira: 2 mil (13,3%)
Sem carteira: 14 mil (93,3%)

Roraima
Total: 16 mil
Com carteira: 3 mil (20%)
Sem carteira: 13 mil (86,7%)

Fonte: Dieese-PA

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