Crianças devem aprender desde cedo a ter responsabilidade financeira; veja como ensinar

Mesada e cofrinho são algumas ferramentas que os pais podem usar para passar a ideia de controle e economia

Elisa Vaz
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Mesmo com o cenário de alto endividamento registrado no Estado pela Federação do Comércio do Pará (Fecomércio-PA), muitos pais preferem não envolver os filhos no orçamento familiar. Mas essa não é a melhor forma de lidar com o dinheiro dentro de casa. Os responsáveis devem, na verdade, fazer de tudo para que, desde cedo, as crianças valorizem os ganhos e saibam gastar com consciência.

O economista Valfredo de Farias acredita que mostrar o valor do dinheiro e como ele deve ser usado é uma das missões de quem é pai ou mãe. Uma das dicas do profissional é que a criança seja acostumada a receber “não” como resposta. É possível fazer isso, por exemplo, quando o filho pedir algum brinquedo caro demais para o orçamento dos responsáveis. Ou, quando o filho pedir alguma guloseima no supermercado, mesmo que os pais comprem, é preciso ensiná-lo a escolher a opção mais barata ou vantajosa, dizendo “não” à mais atrativa.

“Isso vai servir muito para a conscientização de valor. Por isso, outra dica é dar uma mesada, porque a criança, com o dinheiro dela, tem mais consciência ao gastar. É bom começar a trabalhar com a mesada quando a criança já está indo para a escola e começa a ter contato com números. O pai dá um valor para ela comprar um lanche na escola, mas sempre orientando que, se acabar o dinheiro, vai ter que esperar mais um tempo para comprar as coisas. Conforme a idade vai progredindo, vai aumentando o valor dessa mesada, mas sempre é muito importante a orientação sobre o gasto desse dinheiro e nunca repor a mesada no caso de o filho gastar tudo”, orienta.

Influência

A gestão financeira por parte dos pais pode influenciar como os filhos vão lidar com o dinheiro futuramente, na opinião de Valfredo. Na adolescência, eles começam a ter mais percepção das finanças, e quando começam a trabalhar isso se intensifica. “Quando o pai é gastador, que se endivida para fazer festa e ter luxos supérfluos, usa muito o cartão de crédito e vive endividado, quando o filho tiver uma vida financeira ativa, provavelmente, será igual. Em geral, se o pai e a mãe são enrolados, o filho também vai ser. Por isso o exemplo é tão importante”, diz.

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Nas famílias com mais renda, a falta de educação financeira tende a ser um problema, segundo o economista. Isso porque nem sempre os pais com muito dinheiro têm o senso de responsabilidade de mostrar, desde cedo, a importância de economizar. Em vez disso, fazem a maioria das vontades dos filhos. Para Valfredo, este é um erro grave na educação financeira, porque é preciso também estar preparado psicologicamente para ser organizado. “Eu percebo que quem tem menos dinheiro faz menos a vontade dos filhos. Quando os filhos querem um brinquedo tal ou querem comprar tal coisa no supermercado, o pai ou a mãe diz que não dá para comprar porque não tem dinheiro, e os pais com maior poder aquisitivo já compram tudo que o filho quer, aí eles crescem com aquele desejo de ter tudo, e sabemos que a vida não é assim”.

Poupança

Outro ensinamento válido que os pais podem passar para os filhos é a importância de poupar o dinheiro que se ganha. Com crianças, a saída mais fácil é o incentivo a um “cofrinho”, em que os pequenos recebem algum dinheiro e podem usar aquela ferramenta para guardar moedas e trocos e, ao ficar cheio, trocar por algo item de seu desejo.

O que não deve ser feito, segundo Valfredo de Farias, é os próprios pais alimentarem o cofre – afinal, o exercício é para os mais novos, que ainda estão aprendendo sobre economia; são eles que devem decidir o que entra ou não na caixinha e quanto ela vai gastar da mesada. A melhor estratégia, na visão do profissional, é a orientação em relação à poupança do dinheiro.

image Rafael Nóbrega e a dentista Tainá Nunes ensiam a filha, Cecília, a economizar desde cedo (Cláudio Pinheiro / O Liberal)

Quando o filho ficar maior, na adolescência, os pais podem ainda incentivá-lo a anotar os gastos em geral. “Isso é muito interessante. A partir do momento que ele tem essa percepção deve anotar e acompanhar os gastos, isso abre a mente da criança. Por volta da quinta série, os pais também podem oferecer um cartão de crédito ou de débito, onde a mesada será depositada e o filho vai usando. Isso também dá muito certo para o controle financeiro porque, por meio do cartão, é possível trabalhar melhor esse acompanhamento”, indica o economista.

Pais ensinam finanças para a filha

O administrador de empresas Rafael Nóbrega, de 31 anos, e a dentista Tainá Nunes, da mesma idade, são casados e têm histórias parecidas com as finanças. Os pais dos dois não tinham muito conhecimento no assunto e ensinaram conforme sua experiência e de um jeito informal. Nenhum deles chegou a ter mesada na infância, mas sempre tentavam convencer os responsáveis a ganhar algo que queriam, provando que era necessário – às vezes, precisavam esperar até uma data importante para receber o presente.

Tudo o que sabem sobre economia aprenderam na prática e hoje, com uma filha de sete anos, tentam repassar o conhecimento e a importância do dinheiro. Há pelo menos três anos as finanças fazem parte da vida de Cecília de forma recorrente, porque foi a época em que ela começou a demonstrar mais interesse por coisas de maior valor. A primeira coisa que Rafael e Tainá fizeram foi conversar com a família, para garantir que todos passariam a mesma mensagem para a criança. Ela precisava entender que, mesmo se os pais tivessem dinheiro disponível, não teria tudo o que quisesse.

“A partir daí, sempre que ela pedia alguma coisa, perguntávamos se ela realmente precisava daquilo e, caso ela realmente ‘provasse’ para nós que sim, sempre haveria uma troca: a cada coisa que ela ganhasse teria tinha que dar algo de valor equivalente para uma criação mais necessitada. Em outros casos, simplesmente dizíamos que tal coisa era muito cara e que teríamos que trabalhar muito tempo para poder comprar e, então, caso ela quisesse, teria que esperar nós juntarmos o dinheiro para comprar, e dávamos no Natal ou aniversário seguinte. Agora, já mais velha, ela tem um cofrinho e responsabilidade de comprar as coisas que quer, como sorvetes, docinhos e chicletes”, conta o pai.

Adquirindo mais conhecimento sobre finanças, Cecília ajuda os pais. Antes de ganhar presentes no Natal ou Dia das Crianças, os pais a levam às lojas para ver preços. A pequena não ganha mesada, mas recebe prêmios por boas ações: quando termina o dever de casa sem reclamar ou ajuda os pais em algo, eles colocam uma moeda no cofrinho. Com o dinheiro guardado, Cecília cria suas próprias prioridades e os pais a ajudam a encontrar o que seja mais satisfatório. Na semana passada, por exemplo, ela fez a compra de um sorvete com o seu dinheiro e colocou o troco no cofre.

Rafael diz que, cada vez mais, ela tem se interessado por criar objetivos a longo prazo, mas, como é muito nova, ainda está trabalhando nesse processo. “Sempre começa com uma boneca mais cara, mas ela acaba caindo na tentação do sorvete. É um processo em evolução, digamos assim. Nosso objetivo não é torná-la uma fanática por controlar o seu orçamento, mas saber viver bem com o que se tem e ensinar que sempre terá uma escolha a se fazer sobre isso na vida. Acredito que, até esse momento, ela tem entendido a mensagem”, opina o pai.

A escola também tem ajudado a introduzir os conceitos de economia. Cecília já fez uma visita com a turma e os professores ao supermercado. A escola pediu para os pais mandarem R$ 20 para ela mesma fazer as compras e saber quanto custa cada produto. A instituição criou também um projeto chamado "Meu Dinheirinho", que vai estimular as crianças a pouparem. Na opinião de Rafael, economizar em grupo, junto com os amigos, vai incentivar a criança.

Investimentos para os filhos

Além de guardar dinheiro e entender como o orçamento familiar funciona, os pais também podem ensinar os filhos a como fazer o dinheiro render. Para isso, os investimentos no mercado financeiro funcionam muito melhor do que um cofre ou poupança no banco. Para os pais que querem fazer aportes mensais para os filhos, com ou sem a ajuda deles, há várias opções no mercado, segundo o assessor de investimentos Leonardo Cardoso.

“Quando falamos de investimento para um menor de idade, quase sempre é focado no longo prazo, que é quando o juro composto vai ter, de fato, um efeito muito forte que chamamos de bola de neve. Quanto mais tempo você passa investindo em constante disciplina, maior o crescimento do seu investimento”, explica o especialista.

Embora seja comum os pais utilizarem a Previdência privada para fazer investimentos para os filhos, nem sempre essa é a melhor opção, ou a mais eficiente, porque a rentabilidade é baixa e a taxa de administração alta. Da mesma forma, a poupança também não é uma boa opção de investimento. O que tem crescido muito, segundo Leonardo, é a abertura de conta para pessoas menores de idade dentro das corretoras de investimento.

“O pai vai criar conta para o seu filho tranquilamente, assim como faz a abertura de uma bancária. Pode optar por abrir no seu nome também e fazer a gestão desse recurso, já que há uma opcionalidade infinita para alocar esse capital, como imobiliária, ações, fundos de investimento, tesouro direto, enfim, várias opções. Como estamos falando de um tempo maior, a renda variável, certamente, vai trazer a melhor composição entre risco e retorno, porque quanto mais tempo você deixa investido, menor a chance de tirar aquele recurso perdendo dinheiro, e maior vai ser a sua rentabilidade”, orienta.

Para quem tem um perfil mais conservador, é interessante buscar opções como o tesouro direto, diz Leonardo, porque ele protege o capital da inflação. O investidor consegue, então, ter a rentabilidade da variação da inflação mais uma taxa real – e o valor cresce cada vez mais com a consistência ao longo do tempo. Ao comparar alguns investimentos, com uma aplicação inicial de R$ 1.000 e um aporte mensal de R$ 200, a retirada líquida em 13 anos, ou seja, em 2035, será de R$ 53,3 mil no tesouro direto e de R$ 44,7 mil na poupança.

“A aplicação no tesouro consegue ser muito mais interessante do que outras, como a poupança. Além disso, tem crescido o número de contas em nome de menores de 15 anos na bolsa brasileira, um indicador muito importante que mostra que, cada vez mais, os pais estão preocupados em gerir esses recursos e criar uma poupança para os seus filhos, para que eles cheguem no momento da faculdade ou iniciem a vida e possam custear um curso ou iniciar uma vida empreendedora”, afirma.

Como educar financeiramente crianças?

  • Mostrar o valor do dinheiro e como ele deve ser usado
  • Dizer “não” quando não puder comprar algo e explicar para a criança
  • Ensinar o filho a escolher o produto mais barato ou vantajoso
  • Dar uma mesada de acordo com a idade, mas orientar sobre o gasto
  • Nunca repor o dinheiro da mesada se o filho gastar antes
  • Incentivar a criança a guardar dinheiro em um cofre
  • Orientar a anotar seus gastos quando atingir certa idade

Endividamento x Inadimplência

O endividamento costuma ser associado à inadimplência, mas as duas palavras representam situações diferentes. O endividamento se refere às dívidas com as quais o consumidor se comprometeu, como parcelas de cartão de crédito, empréstimo, financiamento de carro ou casa. A pessoa pode ter essas dívidas e, ainda assim, estar adimplente.

Somente quando o pagamento dessas dívidas passa da data de vencimento, ou seja, atrasa, você é que a pessoa se torna inadimplente. Por isso, quando a economia está aquecida ou não se encontra em uma grande crise, de forte impacto, a tendência é que o consumidor realize mais compras e, na sua maioria, em cartão de crédito. Por isso, a taxa de endividamento pode aumentar. 

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