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Círio: comerciantes e empresários se preparam para mais um Círio com pouco movimento

Antes da pandemia, a ocupação nos hotéis chegava a 100% durante a festa religiosa

Elisa Vaz / O Liberal

A menos de dois meses do Círio de Nazaré, período que mais movimenta a economia belenense, os comerciantes e empresários se preparam para mais um ano sem a tradicional procissão. Em anos normais, a cidade deveria estar pronta para receber turistas de vários Estados e países, mas, sem a possibilidade de aglomerar, por conta da pandemia da covid-19, não há expectativas positivas para a data.

Assessor jurídico do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Estado do Pará (SHRB-PA), Fernando Soares explica que muitas empresas do segmento pagam as contas do segundo semestre apenas com o faturamento gerado pelos turistas no Círio, já que há uma lucratividade muito boa. Sem a clientela tradicional do período, as sequelas para o setor são “danosas”, em sua avaliação.

“É um período de muitos ganhos. Para Belém é o maior ganho certo durante o ano. Claro que outros eventos também podem trazer lucro, mas esse é um lucro certo, que sempre foi contabilizado pelo setor como um período para desafogar os prejuízos que se tem no primeiro semestre. A falta da festividade em 2020 foi muito prejudicial, e várias empresas, principalmente de meios de hospedagem, encerraram totalmente suas atividades ou estão parcialmente fechadas até hoje”, diz.

Hotéis

Antes da pandemia, a ocupação nos hotéis chegava a 100% durante a festa religiosa. No ano passado, os meios de hospedagem tiveram cerca de 25% dos quartos ocupados, e agora, em 2021, o percentual deve se manter quase o mesmo. Com a flexibilização do bandeiramento, e também com uma boa parcela da população vacinada, Fernando afirma que a tendência é ter algum tipo de movimento na cidade, maior que ano passado, mas o setor de hotelaria perde porque os maiores atrativos são as procissões.

Na parte de alimentação fora do lar, que são as empresas que mais lucram no Círio, de acordo com o sindicato, a perda é “incomensurável”, para Fernando. “Além das pessoas que vêm para Belém, que não têm casa para ficar e que ficam nos meios de hospedagem, o grande ganho do setor é com aquelas que vêm do interior do Estado, para casa de parentes e amigos. Essas têm o hábito de ficar os 15 dias inteiros na cidade, ou mais tempo que os turistas de fora do Estado. Desde vendedores de comidas típicas que você vê pelo Largo de Nazaré até as empresas mais tradicionais, todos sofrem perdas muito grandes”.

Já no setor do comércio, que também fica com o faturamento alto durante o período do Círio, o presidente da Associação Comercial do Pará (ACP), Clóvis Carneiro, explica que a situação deve permanecer longe dos patamares de 2019, antes da pandemia. Em 2020, houve queda de cerca de 60% nas vendas do comércio. Neste ano, deve haver um ganho entre 10 e 15% em relação ao ano passado, o que coloca o setor em uma retração de 45 a 50% em relação ao período pré-pandemia.

De vagar

“O Círio vai ser devagar. Mesmo no ano passado ele trouxe algum aporte para o comércio, mas, no geral, muito aquém do que se tinha antes. As vendas não foram significativas. Neste ano, vamos ter um faturamento melhor por conta do relaxamento das medidas sanitárias, mas nesse formato estabelecido pela Diretoria da Festa, não acho que vai ter grande impacto como tínhamos em 2019”, aponta Clóvis.

Com isso, o presidente da ACP acredita que toda a economia belenense sofrerá impacto, já que o setor que mais emprega é o de comércio e serviços. Para o futuro, ele acredita que só será possível ver uma recuperação no setor com a retração da crise sanitária. Isso porque ainda há restrições de viagens, alto desemprego, renda mais baixa e uma série de recomendações sanitárias que inibem o turista. Portanto, será um Círio mais introspectivo.

Já Fernando Soares não acha que o primeiro Círio pós-pandemia vai ter o mesmo faturamento de antes da crise. “As incertezas são muito grandes. No primeiro ano depois de uma pandemia, você encararia uma multidão de 2 milhões de pessoas na rua? Essa é a pergunta que precisa ser respondida. É muito complicado, mesmo com a segurança da extinção da pandemia, é muito assustador. A gente espera que o fim da pandemia também traga segurança para a população e credibilidade para viajar e voltar à normalidade. Não vai ser o normal de antes, mas uns dois anos depois acho que teremos mais faturamento”, adianta.

Otimismo

Com o isolamento social e as medidas restritivas, os donos de hotéis tiveram muitas perdas no período pandêmico. Um deles é o diretor do Beira Rio Hotel, Daniel Fiorentini. Antes com uma ocupação de 100%, no ano passado apenas 30% dos seus quartos tiveram hóspedes – a maioria por conta de um pequeno evento corporativo que já estava programado para a data e que foi liberado pelo bandeiramento definido pelo governo do Estado. Porém, o restaurante do hotel ficou sem público.

Neste ano, ele diz que a estimativa é a mesma. Até o momento, nenhuma reserva foi feita para outubro, sendo que, em outros anos, o hotel já recebia demandas desde junho. “Não tem o que fazer. Nosso público vem de fora mesmo. Vai ter fluxo grande de famílias que vêm para Belém se confraternizar, mas ficam em casa. Se tiver fluxo na hotelaria é pequeno”, comenta.

Mesmo assim, a expectativa é positiva de que, após o Círio, haja mais demanda. Alguns eventos corporativos estão sendo cotados para o mês de novembro, por exemplo, e, assim, Daniel espera compensar a falta de hóspedes no Círio. Porém, ele já espera que a recuperação econômica só aconteça, de fato, no segundo semestre do ano que vem, e a procura pela hospedagem em seu hotel deve crescer por volta de maio de 2022.

Camisas

Já o redator publicitário Andrey Rodrigues trabalha com o comércio de camisas. Ele tem uma marca, chamada “Caboquisse”, que começou em 2009 e ganhou a cara atual em 2015, ano em que criou o CNPJ. Todo ano, ele produz camisas que fazem referência ao Círio de Nazaré. Sem a festa, o faturamento caiu, mas ele não deixou de fazer a produção.

“O nome Caboquisse é para valorizar o lado caboclo, é uma forma de expressão. É camisaria porque usa camisas como veículo, mas na verdade a Caboquisse faz comunicação social. Nossa primeira coleção teve duas estampas de muito sucesso: Marias Negra e Indígena; a ideia é também valorizar o povo afroamazônida. Acredita-se que senhoras negras, quando viam a camisa, se emocionavam, os olhos marejavam e elas diziam ‘Eu nunca vi Nossa Senhora preta...’”, conta Andrey.

Estampas famosas

As estampas mais famosas e conhecidas da marca são relacionadas ao Círio, com um conceito a cada ano. Essa prática começou em 2015 e, na época da festa, as vendas da empresa triplicam, segundo o empresário. “Em anos normais, começamos em setembro. Elas dão uma levantada nas vendas e trazem visibilidade. Muitas pessoas recomendam nosso trabalho nessa época”.

No ano passado, mesmo sem a procissão religiosa, a Andrey chamou atenção para o genocídio indígena e homenageou uma Mãe Indígena. “Maria, politicamente, é isso: a mãe que vence a opressão de um império, que resiste a ataques por acreditar na vida. E nosso povo se alimenta desta esperança. A desse ano ainda não fiz, mas tenho uma ideia na cabeça. Prefiro mesmo é relançar a Mãe Indígena”, adianta Andrey.

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