Juiz alerta para aumento da grilagem e do desmatamento em áreas não protegidas na Amazônia
Na COP30, Domingos Daniel Moutinho da Conceição Filho citou situações reais vividas no Vale do Rio Jamanxim, situada às margens da BR-163, Rodovia Santarém-Cuiabá
A Seção Judiciária do Pará (SJPA) marcou presença na 30ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), com a palestra “Judiciário e impactos socioambientais”. Na ocasião, o juiz federal diretor do Foro, Domingos Daniel Moutinho da Conceição Filho, abordou o papel do Estado e do juiz em questões relacionadas à grilagem e ao desmatamento em unidades de conservação (UCs) na Amazônia.
A palestra do magistrado, realizada nesta quinta-feira (13), no estande da Caixa Econômica Federal na Green Zone, contou com as presenças do presidente e da secretária-geral da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Pará, Sávio Barreto e Eva Franco; da gerente do Jurídico Regional Belém, Anna Paula Ferreira Paes e Silva; e do gerente do posto de atendimento da Caixa na Justiça Federal, Ronaldo Gomes.
“A exploração de recursos naturais invariavelmente produz riqueza e, em certa medida, viabiliza o surgimento de postos de trabalho. Assim, ainda que promovido em ritmo predatório, o uso desses recursos é capaz de gerar resultados talvez até vultosos, porém, certamente de curto prazo e sujeitos a externalidades negativas de efeitos duradouros”, observou o magistrado, mostrando que a curva do crescimento da renda e do emprego, quando ocorre o uso predatório dos recursos naturais, sobe vertiginosamente, na medida inversa do esgotamento dos recursos naturais.
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Moutinho destacou que “a governança estatal chega tardiamente. Ao fim do breve ciclo de crescimento econômico, o que resta é um esgotamento relativo dos recursos naturais, um contingente populacional sem emprego e nenhuma solução tecnológica que possa oferecer alternativas econômicas para a região. A essa altura só mesmo o Estado é capaz de agir, sem dispor, no entanto, de muitas opções.”
Em relação a crimes ambientais, como grilagem e desmatamento, o juiz palestrante referiu-se ao Vale do Rio Jamanxim, situada às margens da BR-163, Rodovia Santarém-Cuiabá, onde foram criadas, na década dos 2000, unidades de conservação com o objetivo de preservar o meio ambiente. A Floresta Nacional do Jamanxim, de acordo com dados exibidos, foi a terceira unidade de conservação da Amazônia mais desmatada no período entre 2012 e 2015. Entre as UCs federais, é a mais devastada, já que as duas primeiras do ranking geral são as criadas pelos Estados de Rondônia e do Pará.
Para Moutinho, embora o regime jurídico (ambiental e fundiário) das áreas de proteção especial reduza os impactos da ocupação de terras, a realidade mostra que o contrário acontece com o instrumento da desafetação (para retirar a proteção das áreas), que, antes mesmo de concretizado, gera uma corrida pela exploração e ocupação ilegal de terras.
Em relação à Terra Indígena Baú (TI Baú), o magistrado ressaltou que, antes mesmo da demarcação da área, em 2003, o Ministério da Justiça editou portaria que reduziu a área indicada, na década anterior, como tradicionalmente ocupada. A área desafetada na oportunidade correspondia à sede do município de Novo Progresso. Moutinho mostrou um mapa indicando que a degradação ambiental na área desafetada, que até 2003 restringia-se a polígonos isolados, cresceu substancialmente nos três anos seguintes à desafetação, processo que segue continuamente no período entre 2010 e 2014, atingindo parte significativa da totalidade da área.
"A simples iminência de desafetação dessas áreas, por tratativas políticas e manifestações de autoridades, já é suficiente para aumentar exponencialmente a pressão pela sua exploração, conduzindo, eventualmente, à concreta supressão da condição de área de proteção especial e à deflagração de um novo processo de degradação e grilagem”, disse o magistrado.
Para Moutinho, as comparações lançadas deixam poucas dúvidas: a formalização de espaços especialmente protegidos pelo Estado surte significativos efeitos no sentido de reduzir a degradação ambiental e a ocupação desordenada das terras públicas. “No entanto, os casos da TI Baú e da Flona Jamanxim servem como alertas concretos: com a perspectiva de desafetação, a lógica da proteção se subverte e os territórios logo se tornam alvos preferenciais da grilagem e do desmatamento”, concluiu Moutinho.
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