Brasil fora do “Mapa da Fome”: uma vitória estrutural ou conjuntural? Rodolfo Marques 30.07.25 16h28 No dia 28 de julho de 2025, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), durante a 2ª Cúpula de Sistemas Alimentares na Etiópia, anunciou oficialmente a retirada do Brasil do “Mapa da Fome”, categorização baseada no percentual da população em situação de subnutrição crônica, hoje inferior a 2,5%, conforme os dados consolidados do triênio 2022/2024. O fato, em si, representa um marco político e social de alta relevância. No entanto, enquanto analista da política pública e suas dinâmicas institucionais, a pergunta que se impõe não é apenas "como saímos do Mapa da Fome?", mas sobretudo: "o que explica essa vitória e quais as condições para sua sustentação?" O presidente Lula (PT-SP) assumiu, já em 2023, o compromisso de retirar o país dessa condição até o fim de seu atual mandato, que ocorrerá em 2026. Atingiu essa meta na metade do percurso. A resposta à fome foi organizada por meio de um pacote de políticas públicas já testadas, porém rearticuladas sob novas diretrizes: o Plano “Brasil Sem Fome”, a reestruturação do Bolsa Família, o fortalecimento do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o investimento na alimentação escolar (PNAE) e o apoio às cozinhas solidárias. Tais políticas atuaram de forma intersetorial em um formato que combina transferência de renda, incentivo à agricultura familiar e políticas educacionais. O impacto é expressivo: 24 milhões de brasileiros deixaram a condição de insegurança alimentar grave até o final de 2023; a pobreza extrema caiu para 4,4%; a desigualdade, medida pelo índice de Gini, recuou para 0,506; e o desemprego, em 2024, atingiu 6,6%, o menor patamar em mais de uma década. O sucesso da atual política de combate à fome pode ser lido como fruto de uma reconstrução institucional deliberada. Após o desmonte ocorrido entre 2016 e 2022, houve uma reconstituição de instrumentos e capacidades estatais. O retorno de políticas redistributivas e a rearticulação com a sociedade civil são componentes centrais dessa virada. Mais do que o volume de investimento, o que se destaca é a coerência entre os objetivos e os meios. A combinação de transferências condicionadas de renda, elevação do salário mínimo, recuperação do CadÚnico e estímulo ao emprego formal gerou efeitos multiplicadores sobre a base da pirâmide social. Ainda assim, é necessário cautela quanto à durabilidade desses avanços. O histórico brasileiro demonstra que conquistas sociais são reversíveis, sobretudo quando dependem de vontades políticas conjunturais e não de pactos institucionais sólidos. O retrocesso entre 2018 e 2020, que recolocou o país no Mapa da Fome, foi fruto direto da descontinuidade de políticas estruturais. Assim, a permanência dessa conquista exige mais que ações governamentais pontuais: requer a institucionalização da justiça social como eixo da política de Estado. A fome, como fenômeno político, não desaparece sem estabilidade normativa. Assim, a pergunta crucial não é apenas quem garante essa vitória – mas quem garante sua permanência? O desafio, agora, é transformar esse sucesso em compromisso permanente, blindado contra alternâncias eleitorais e contra a fragilidade de coalizões voláteis. Dessa forma, a superação da fome exige mais do que políticas eficazes; exige instituições resilientes, atores comprometidos e, sobretudo, uma sociedade civil vigilante. Do contrário, a fome deixará de ser um problema transitório apenas para voltar a ser um traço estrutural da exclusão brasileira. Assine O Liberal e confira mais conteúdos e colunistas. 🗞 Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱 Palavras-chave colunas rodolfo marques COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA Rodolfo Marques . Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo! Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é. Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos. Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado! ÚLTIMAS EM RODOLFO MARQUES Rodolfo Marques Brasil fora do “Mapa da Fome”: uma vitória estrutural ou conjuntural? 30.07.25 16h28 Rodolfo Marques Governo encurralado: como Lula III pode governar com um Congresso que só quer sangrar e barganhar? 24.06.25 15h10 Rodolfo Marques A resiliência de Lula e os desafios de um novo tempo 17.06.25 15h00 Rodolfo Marques Desgaste recorde e desaprovação acendem alerta no Planalto sobre futuro de Lula 10.06.25 16h15