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O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

Thomas Jefferson e o direito à felicidade

Océlio de Moraes

Não há dúvida de que, do ponto de vista filosófico, o objetivo da existência humana é a busca da felicidade. O que é duvidoso é se tomadas das  decisões e as respectivas  ações concretas coletivas ou individuais têm priorizado a felicidade.

Vou dedicar esse breve ensaio à felicidade sob a  sua dúplice natureza: a natureza do ser e a natureza poder-ser. Para essa tarefa , define-se a seguinte tese: sob a perspectiva filosófica, a natureza do ser  e a natureza do poder-ser são indissociáveis,  à medida que  compõem a condição humana, enquanto que o direito à felicidade, no pensamento de Thomas Jefferson, está baseado nas virtudes teológicas. 

A inteligência distingue a natureza do ser humano, capacitando-o nas escolhas e nas ações. As decisões e as ações designam a natureza do poder-ser, isto é, o bom (virtuoso) ou mau caráter. 

 O dever-ser kelseniano – aquela conduta que deve se adequar à norma sancionadora – também está relacionada às escolhas da pessoa.  As escolhas  geralmente levam às conclusões binárias:  exitosas ou não-exitosas,   à satisfação ou à insatisfação, à felicidade ou à infelicidade.

  Mas,  a natureza humana, em si,  é destinada à felicidade, porque é inerente à inteligência fazer o bem sem olhar a quem. Fazer o bem é, na verdade,  um estado de espírito que cria e espalha uma sensação de bem-estar. A alma espelha leveza e graciosidade por todo o ambiente  e às pessoas alcançadas pelos efeitos mágicos daquele bem realizado.    

Por isso, se bem observado, fazer o bem sem olhar a quem é uma virtude: a bondade que é, designadamente, uma qualidade da pessoa generosa e benigna, aquela que se dedica a fazer obem.   

Essa questão está no pensamento socrático, o qual  associa a felicidade à virtude – como um atributo de sabedoria – porque o filósofo grego  a considerou um meio honesto para se alcançar a felicidade. 

Por essa perspectiva, Sócrates plantou o ideário: o objetivo máximo da condição humana é ser virtuoso – condição que designa ser bom, agir com a correspondente  benignidade e  dar exemplo de bondade moral –  como um caminho certo  à facilidade.

A condição oposta à bondade moral, assim é logicamente conclusivo dizer, é a maldade, aquela  condição anética que  demonstra desonestidade. E dessa condição, por ser inescrupulosa, leva à infelicidade.  Portanto, a felicidade socrática repousa no caráter virtuoso que cultiva a bondade moral. 

Mas, a felicidade também está relacionada às virtudes teológicas – fé, esperança e caridade –  porque potencializam valores que enobrecem o caráter humano e, substancialmente, estabelecem uma condição mais íntima e  sensível à relação com Deus.

 Na Bíblia Sagrada – lá em Romanos 12:2 podemos ver isso – a felicidade é Deus e sempre estar com Ele é o que torna a pessoa feliz.  

– “A verdadeira felicidade está em Deus. Quando tomamos conhecimento do Seu poder e o que Ele fez por nós, não há como ficar triste. Tanto amor e carinho deixa-nos felizes e gratos.”

Nessa perspectiva, a felicidade é uma virtude teológica derivada da fé em Deus – virtude que capacita a pessoa  à bondade moral (de que falou Sócrates) ou à caridade, expressa na vontade de bem-servir, como disse Jesus, conforme Atos dos Apóstolos, 20:35:

– “ Em tudo o que fiz, mostrei a vocês que mediante trabalho árduo devemos ajudar os fracos, lembrando as palavras do próprio Senhor Jesus, que disse: 'Há maior felicidade em dar do que em receber' ".

Do ponto de vista individual, a felicidade não é tida  exclusivamente como riqueza material, tipo aquela do “tesouro de ouro” que estaria escondido na ponta final do arco-íris, conforme reza a lenda irlandesa. A felicidade pessoal é um estado de graça que se procura  de forma permanente, através das virtudes teológicas; ou coletivo, através daquilo que  Thomas Jefferson (o terceiro presidente americano) definiu como “felicidade pública”. 

Principal responsável pela redação da Declaração da Independência (4 de julho de 1776)  das 13 colônias americanas em relação  à “longa série de abusos e usurpações” do então  Rei da Grã-Bretanha,  Thomas Jefferson compreendia que a “felicidade pública” –  uma espécie de bem-estar social – deveria ser garantida por “governos justos (...), escolhidos pelo povo, e que fossem ”capazes de realizar a segurança e a felicidade”.  

Thomas Jefferson  foi  um político iluminado.  Num ambiente de  quase nenhum  reconhecimento de direitos, dominado pelo colonialismo britânico –  e antes mesmo da  Declaração (francesa)  dos Direitos do Homem e do Cidadão,  de 1789,  reconhecer os “direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem” para a “felicidade geral” e como oposição  à ignorância, ao esquecimento, ao desprezo  e à corrupção dos governos  –,  Jefferson já concebia os direitos inalienáveis como verdades evidentes como essenciais à realização da "fecli pública".

Democrata convicto, Jefferson atribuiu ao povo o controle máximo em face do governo que desviasse o objetivo de realizar a segurança e a felicidade: “(…) sempre que qualquer forma de governo se torne destrutiva de tais fins, cabe ao povo o direito de alterá-la ou aboli-la e instituir novo governo”. 

O governo comprometido à procura da felicidade e com a garantia dos demais direitos inalienáveis, como pressupostos da felicidade pública,  é composto por homens justos, aqueles que não tornem “ destrutiva de tais fins”. 

Na linguagem atual: a corrupção na gestão da coisa pública é uma forma destrutiva dos direitos inalienáveis e, desse modo, incompatível com a realização da felicidade pública.  Somente homens justos (sinonímia de pessoas honestas) seriam capazes de se comprometer com a realização da “felicidade pública”, e  não corrompê-la por quaisquer motivações  pessoais ou corporativas. 

A “felicidade pública”,  na Declaração de Direitos dos EUA,  não poderá prescindir, dentre outros,  da “proteção à liberdade de expressão, a liberdade religiosa, a liberdade de reunião e o direito de petição.”

No Brasil, a Emenda Constitucional nº 19/2010 (a denominada PEC da Felicidade), por razões políticas até então não esclarecidas,  não prosperou, eis que foi arquivada. A ideia era “incluir o direito à busca da Felicidade por cada indivíduo e pela sociedade, mediante a dotação pelo Estado e pela própria sociedade das adequadas condições de exercício desse direito”, conforme constou  na justificativa. 

Hannah Arendt , na  obra "Ação e a busca da felicidade",  lembra que Thomas Jefferson “mudou a fórmula corrente  pela qual os direitos inalienáveis eram enunciados como ‘vida, liberdade e propriedade’ pela vida, liberdade e a busca da felicidade" (p.138-139).

A busca da felicidade – escreveu ainda Arendt – passou a significar ao longo dos séculos XIX e XX “um direito que a natureza conferia a todos os homens  (...) para promover a felicidade pública'', essa entendida como o direito de proteger a vida.

Uma leitura bem atenta da Declaração da Independência possibilita ver que  a inclusão da felicidade como direito inalienável no mesmo patamar do direito à vida e à liberdade  decorre do fato de Thomas Jefferson nela incorporar o seu pensamento religioso, pois justificou “que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador”. A isso Jefferson denominou de “verdade evidente”.  

“A busca da felicidade" como “direito inalienável” na Declaração da Independência das 13 colônias adota as virtudes teológicas – notadamente a fé no Criador – ratificando o criacionismo divino.  Isto é, o  direito à “posição igual que lhe dão direito as leis da natureza e as do Deus da natureza” – leis da natureza e as do Deus da natureza, também qualificadas por Jefferson como “verdades evidentes” ou, por outro modo de dizer,  rigorosamente verdades inquestionáveis.

De minha parte – que acolho as virtudes teológicas como chaves abrir as portas e estabelecer a ligação com o Criador e que adiro à condição filosófica da bondade moral –  posso concluir assim:

  1. A procura da felicidade, na perspectiva da “felicidade pública”,  é um projeto-promessa  para a realização humana  a ser garantido e promovido pelo poder público composto por governo justo, o qual deve ser capaz de realizar a segurança e a felicidade.  
  2. Governo destrutivo, caracterizado pela composição de dirigentes não probos,  é  incompatível com realização da  “felicidade pública” como um direito inalienável. 
  3. A felicidade socrática decorre da virtude moral e a felicidade  teológica reside na fé e na obediência aos preceitos de Deus. 
  4. A  bondade moral e a caridade teológica (fazer o bem) são os atributos morais à verdadeira felicidade espiritual. 

Ainda não temos o máximo respeito aos nossos direitos naturais, constitucionais  e inalienáveis. Ainda estamos à procura da felicidade pública. 

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ATENÇÃO: Em  observância à Lei  9.610/98, todas as crônicas, artigos e ensaios desta coluna podem ser utilizados para fins estritamente acadêmicos, desde que citado o autor, na seguinte forma (Océlio de Jesus Carneiro Morais (CARNEIRO M,  Instagram: oceliojcmoraisescritor

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