O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

A deidade, a liberdade religiosa e o Estado secular

Ocelio de Jesús Morais

Na pensata ““Lugar de fala”, ideologismo, liberdade de expressão e  dignidade humana”, publicada nesta coluna, afirmei que a declaração “...promulgamos {a Constituição}] sob a proteção de Deus” –  incorporada no Preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988  –  é relativa à “deidade coeterna”.  Entenda-se na hermenêutica sistêmica  da Constituição que a  declaração preambular  é –  sob a dimensão jusfilosófica e normativa  –  o fundamento ( base), o objetivo (propósito( e  os valores que sustentam a Constituição. 

A declaração “(...) promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil” é a devocional expressão da fé  ao Criador, donde exsurge , teologicamente, a “deidade coeterna –  questão que Agostinho de Hipona explica na obra “A Trindde”  como sendo, a deidade,  “(...)  A unidade incorpórea da Trindade, incomunicável, consubstancial a si mesma e coeterna”.

Na Constituição Federativa de 1988 –  promulgada regiamente “sob a proteção de Deus” , reitere-se –  os fundamentos  do Estado Democrático de Direito brasileirto estão nos incisos I a  V  do Art. 1º, dentre eles, a dignidade da pessoa humana. 

E como promessa para “instituir um Estado Democrático”,  como “valores supremos”,  foram definidos “os direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social (...)”. 

Por essa finaldiade, em específico,   à ordem econômica adotou-se o “ objetivo do bem-estar e a justiça sociais” (Art.  193). E, como base da ordem econômica, elegeu-se “a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa” para “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”.

Nessa perspectiva,  os fundamentos (bases), os objetivos (propósitos)  e  os valores que sustentam a  Constituição  brasileira vigente – todos seletivamente escolhidos e promulgados “sob a proteção de Deus” –  querem dizer  o seguinte:  a deidade coeterna é  a tradução da Trindade Onipotente,  conforme  a teologia de Agostinho de Hipona (In A Trindade).

Na prática,  ao povo brasileiro, a promulgação da Constituição “sob a proteção de Deus” (declaração de fé  na “deidade coeterna”) é a declaração constitucional na crença na Trindade Onipotente, o que, teologicamente, representa a crença no  “o Pai, o Filho e o Espírito Santo, de uma e mesma essência, Deus Criador”.

Por isso,  da “deidade coeterna” teológica-constitucional  – assim pode ser dito por força normativa   da declaração da  legal e legítima da Assembléia Nacional Constituinte)  –  advém as   garantias relativas à  inviolabilidade  dos direitos  por motivo de crença religiosa, advém garantias contra a liberdade de consciência e , ainda, as garantias para o  livre exercício dos cultos religiosos – todas reconhecidas como direitos fundamentais. 

Os direitos e garantias relativos à crença e à religião, em última análise,  são inerentes à dignidade humana, porque dizem respeito à  liberdade de consciência e de crença. Logo, tais direitos e garantias fundamentais se opõem  ao Estado como regra de contenção e  de  proibição  contra  possíveis ou eventuais atos de violação institucional .  É  isso que Luigi Ferrajoli destaca,  na obra “Los Fundamentos  de los derechos fundamentales” (Ed. Trotta, 2007), como a força vinculante  dos direitos fundamentais consagrados nas Constituições democráticas, base  da sua teoria  “teoria do garantismo dos defeitos fundamentais” .

Por outras palavras: nem o Estado, nem  qualquer setor privado da sociedade pode restringir ou eliminar a  liberdade de consciência, a liberdade religiosa e tampouco a  liberdade de crença, sob pena de agressão direta à dignidade humana e de violação à Constituição.

Por conseguinte, a declaração de fé que o Constituinte  fez n na  “deidade” (“sob a proteção de Deus”, no caso brasileito, em face do Estado secular   –  laico por não possuir uma religião oficial   –  impõe o dever de garantir  a liberdade religiosa a todos os brasileiros, sem quaisquer formas de discriminação. Mas, ao mesmo tempo,  o garantismo constitucional à  liberdade religiosa também representa a liberdade de não-crença , à medida que a liberdade de consciência (onde repousa o livre arbítrio) precede à liberdade religiosa. 

De raiz teológica, a liberdade religiosa é, desse modo, um direito humano fundamental  inalienável – direito universal  que também está albergado na  Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Artigo 18, da Organização das Nações Unidas: “Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; esse direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática, pelo culto em público ou em particular.”

Desse modo, conclui-se a pensata  com a clareza de  que o constituinte originário optou pela “deidade coeterna” teológica-constitucional (“sob a proteção de Deus”) por uma razão fundamental: a liberdade  de crença religiosa – como um direito  inerente à  dignidade e indispensável ao livre desenvolvimento da personalidade  da pessoa humana – é um direito humano universal.

 E por quê? Porque assim  é reconhecido  pela Declaração Universal dos Direitos Humano, no Artigo 18: “Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião”, o que inclui  “a liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática, pelo culto em público ou em particular.”

 

ATENÇÃO: Em  observância à Lei  9.610/98, todas as crônicas, artigos e ensaios desta coluna podem ser utilizados para fins estritamente acadêmicos, desde que citado o autor, na seguinte forma: MORAIS, O.J.C.

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