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O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

Qual o princípio do Código Moral?

Océlio de Morais

Se a gente der uma pausa no automático e  concentradamente pensar na condição humana, será possível perceber que todo mundo, todos os dias, emite juízos valorativos sobre fatos e sobre as pessoas que estão envolvidas nos fatos.  A “métrica” desses “julgamentos” é o sentimento moral que cada um possui, certo ou errado, na perspectiva da sua visão de mundo. 

É por isso que todos os dias –  e a todo momento em algum lugar do planeta – fatos e pessoas estão no “banco dos réus” dos “juízes” das vidas alheias: são “inocentadas” ou "condenadas" pelo ”tribunal” do senso comum, nos territórios denominados “reinos de justiça” individuais. 

Mas, claro,  isso não é novo. Sempre acompanhou a vida humana e assim continuará enquanto essa existir, e sempre ganhará novos contornos, inclusive como espécies de “entretenimento” social com transmissões ao vivo pelas televisões mundo afora. 

Aqui e acolá fico pensando sobre isso. A razão procura uma razão lógica na psicologia, na teologia e na filosofia para esse fenômeno que  está no seio social como se fosse uma espécie de alimento do imaginário cotidiano  humano. 

A teologia Cristã, legada por Jesus, a partir do Sermão da Montanha, apresenta uma explicação: aquele  possível sentimento farisaico que cada um pode ter ou pode desenvolver.

Jesus abominou a hipocrisia humana, qualificada no farisaísmo hipócrita:  aquele que aponta o dedo em riste aos defeitos e falhas do outro, mas  esquece ou ignora os seus, porque não cultiva os sentimentos da fraternidade e da caridade.

Para deixar bem contextualizado, nas palavras de Jesus:

“Por que observas o cisco no olho do teu irmão, e não prestas atenção à trave que está no teu próprio olho?  Ou, como podes dizer ao teu irmão: 'deixa-me tirar o cisco do teu olho', quando tu mesmo tens uma trave no teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu próprio olho, e então enxergarás bem para tirar o cisco do olho do teu irmão”.

O modo de ser farisaico era ou não uma espécie de “reino” de justiça individual movido pela falsa moral daquele grupo social?  

Percebendo aquela falibilidade, Jesus colocou o dedo na ferida: “Não julgueis, e não sereis julgados. Pois, vós sereis julgados com o mesmo julgamento com que julgardes; e sereis medidos, com a mesma medida com que medirdes.”  (Mt, 7:1-5).

No sentido popular, a história dos fariseus pode ser assim traduzida: o sujo falando do mal lavado. A mensagem diz que alguém não pode ser algoz do outro, se o algoz é tão falível quanto. A mensagem mostra que as fraquezas humanas são muitas e, por isso, cotidianamente, a misericórdia e a fraternidade devem ser os sentimentos do bem cuidar  em lugar dos atos acusatórios e condenatórios. 

A filosofia estóica, já o disse Epicteto — o escravo que nasceu no ano 55 depois de Cristo lá em Hierápolis (Frígia) extremo oriente do Império Roimano da época do  Imperador Nero e que se tornou a maior expressão do estoicismo antigo —  explica isso por duas fraquezas humanas: os desejos déspotas impacientes e a ambição pelo  poder.

Um Parêntesis para recordar: a filosofia estóica tem por essência a  busca da felicidade, através da sabedoria virtuosa, cujo desafio incessante é viver com dignidade e tranquilidade interior; é estabelecer fraternas relações interpessoais e aprender com a natureza das coisas. Parêntesis fechado.

 A primeira fraqueza humana identificada por Epicteto, para essa questão, diz respeito ao domínio da razão pelos desejos, os quais, por serem “impacientes”, também são tidos como ‘déspotas” da natureza humana. 

“Nossos desejos e aversões são déspotas impacientes”, escreveu Epicteto na reflexão “Os desejos exigem realização” no livro “A Arte de Viver''. E explicou que isso acontece porque a “impaciência despótica dos desejos exige uma satisfação imediata”.  

De um lado, “os desejos ordenam que nos apressemos para obter o que queremos”, enquanto que, por outro lado, “as aversões insistem que evitemos aquilo que nos causa repulsa”.  Entre o desejo déspota (aquele que domina a razão) e as aversões (àquilo que causa repulsa) revelam-se duas fragilidades humanas: o desapontamento e a angústia. 

“Todas às vezes que não conseguimos o que queremos, ficamos desapontados e quando recebemos o que não queremos, ficamos angustiados", escreveu, Epicteto, acrescentando que “desejos e aversões, apesar de poderosos, não passam de hábitos que podem ser treinados para que melhorem”.

A outra fraqueza está relacionada à ambição que cada pessoa alimenta, em si e no meio social, para ter poder e o domínio total sobre as coisas e sobre o semelhante. 

 No pensamento de Epicteto, isso decorre  da visão distorcida que pensa que têm domínio total das coisas e, como não possui, frustrada, a pessoa procura culpados às suas próprias decepções, angústias e  outras fraquezas. 

Este excerto é bem apropriado ao nosso tema: “Se alguém trata você de uma forma desrespeitosa, ou fala de você com aspereza,  lembre-se de que o faz porque acha que tem razão em agir assim”, disse Epicteto, na reflexão sob o título “Maltratar vem falsas impressões",  no mesmo livro. 

“A pessoa que tem o ponto de vista errado, é que se engana”, disse ainda o filósofo, aduzindo  que “A partir do momento em que você compreender isso claramente, será menos provável que se sinta ofendido  pelos outros mesmo que o insultem”.

O hábito milenar de comentar (elogiando) ou julgar (destruindo) o outro é um sentimento movido pela curiosidade sobre a vida alheia ou pela solidariedade que se deseja à vida alheia ou ainda pela inveja das conquistas da alheia.

Então isso está localizado no campo dos desejos despóticos  (ambições pelo domínio total sobre todos) e pela inveja da vida alheia. Os desejos despóticos e a inveja são recorrentes nos “tribunais” da mortalidade humana. 

Isso decorre de uma verdade: todos temos um código moral, a partir do qual  os atos e os fatos da vida são elogiados ou são colocados diariamente no  banco dos réus.  A questão que intriga é a seguinte: qual o princípio justificador deste código moral?

Possivelmente a psicologia tem uma explicação para isso: a ideia ou sentimento natural que cada pessoa constrói no seu universo particular de como vê no presente e de  como gostaria de ver no futuro  o seu  pequeno reino particular de justiça prevalecer. 

Mas, há um outro problema gigantesco: os outros códigos morais, dos bilhões de outros seres humanos, também são projetados. E aí reside a questão complexa: os choques de valores dos  “reinos” de justiça individuais potencializando choques coletivos, choques culturais e choques ideológicos.

Essa questão leva à próxima questão: do berço ao túmulo, nossas vidas sempre estão sujeitas às turbulências  geradas pelos conflitos de interesses pessoais e interpessoais. 

Disputas pelo domínio do fogo e da roda, como ocorreu no princípio da civilização humana; disputas pelas riquezas, a partir das quais as nações foram dominando, dizimando povos  e anexando territórios; disputadas bélicas, biológicas e tecnológicas, que colocam nações em conflito e tornam mais vulneráveis as vida na Terra.

Alguns conflitos são racionais, legítimos e justos, do ponto de vista da racionalidade ou quando a questão é relativa à garantia das necessidades básicas como critérios à sobrevivência digna.  Outros conflitos são insanos, como os conflitos bélicos pelo controle político territorial  e pelo domínio político-ideológico das pessoas e dos povos. 

É esse o palco universal dos “reinos” de justiça individuais colidindo com os “reinos” de justiça coletivos e vice-versa. E cada indivíduo, à medida que evolui na capacidade cognitiva, vai  se investindo no papel de “juiz” da vida. E assim será até a morte.  

Porém, nem com a morte os “julgamentos” sobre os atos e fatos da vida  cessarão, pois outros códigos morais, aqui e ali, hão de vasculhar atos e fatos do passado. 

A questão, como  disse Epicteto, é que todos temos a tendência de “olhar para o exterior fascinados pelas aparências”, esquecendo-se de “viver a vida com  simplicidade para o nosso próprio bem”.

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ATENÇÃO: Em  observância à Lei  9.610/98, todas as crônicas, artigos e ensaios desta coluna podem ser utilizados para fins estritamente acadêmicos, desde que citado o autor, na seguinte forma (Océlio de Jesus Carneiro Morais (CARNEIRO M, Océlio de Jesus) e respectiva fonte de publicação.

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