O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

Para onde caminha o sentimento humano?

Océlio de Morais

Sêneca (4 a. C), um dos expoentes do estoicismo, preconizava que a felicidade repousava na  prática das virtudes e na vida em harmonia com a natureza. A conjugação da prática das virtudes (coragem, justiça, sabedoria e temperança como virtudes cardeais) em harmonia com a natureza era a base para alcançar a tranquilidade da alma.  No fundo, tudo isso se refere à essência humana.

Epicteto (55 a.C), outro filósofo estoico,  dizia que a busca da felicidade (que era a paz e a harmonia) passava necessariamente pela virtude, tida  como a principal meta da vida, a qual deveria ser vivida de acordo com a natureza, conforme a razão universal. 

O filósofo, portanto, também falava dos desafios opostos à  indelével natureza humana.

Jesus Cristo – o maior de todos os filósofos, de todos os profetas e de todos os sábios  –  disse que  "O espírito está pronto, mas a carne é fraca" ( Mateus 26:41), destacando que o espírito é o mais nobre e elevado valor do ser humano, enquanto que a  carne  (o corpo) é  a parte mais instintiva (onde repousam as fraquezas, os desejos e as tendências) da pessoa humana.

Bem, eu poderia continuar citando inúmeros outros filósofos e teólogos  que falaram da natureza humana e de suas vicissitudes temporais, dos desafios espirituais e  da luta do bem contra o mal na espiritualidade. Limitei-me aos três exemplos  porque são centrais do tema desta pensata:  para onde caminha o sentimento humano? 

O tema vem a propósito do que tem sido abertamente exposto nas redes sociais e na rede mundial de computadores acerca dos relacionamentos humanos com robôs ou das pessoas que se identificam (ou se veem) como animais irracionais, POR EXEMPLO, cachorro, gato, cavalo,  felinos selvagens e  aves, dentre outros.

Sobre o tema, no ano de 2020, a “International Anthropomorphic Research Project” entrevistou 2.500 pessoas, concluindo que, daquele universo de entrevistados,  cerca de 5% se identificavam como "therians. “Therians” – um termo usado em comunidades online e subculturais – designam pessoas que se identificam com uma espécie animal, porque acreditam  e compartilham os mesmos comportamentos do animal.

Agora está em evidência  a onda dos “bebês robots” – tipos de  bonecos robóticos à base de plástico e silício –  que pessoas (homens e mulheres, isoladamente,  ou casais) acreditam que são seus filhos e, como tais, os “adotam” e aos mesmos dispensam tratamentos como se humanos fossem, mas, também exigindo que sejam tratados como seres humanos. 

Essa onda de “bebês robôs”, desde o início da década o ano de 2020, vem sendo adotada no Japão entre jovens e até entre casais mais idosos como substitutivos dos bebês humanos. Ainda no Japão, no ano de 2015, foi registrado o primeiro caso de robôs, também celebrados por robôs e, em 2018, um professor japonês se casou com um holograma, mas o “casamento” acabou devido a problemas de “comunicação” robótica.

Todas essas questões  levantam e apresentam profundas e gravíssimas questões éticas e filosóficas. Vou colocar algumas na forma de questionamentos. Cabe ao leitor refletir e tirar suas conclusões, a partir de seus virtudes humanas:

A sociedade está ficando maluca ou está perdendo as referências dos  sublimes valores humanos? 

As pessoas se sentem vazias ou não mais acreditam nos relacionamentos humanos?  

As pessoas não têm coragem (aqui tomada como virtude) para enfrentar e compreender  os desafios que as diferenças humanas apresentam nas relações cotidianas ou preferem se esconder dentro de suas muralhas de incertezas e fraquezas, buscando refúgio nas “relações” com robôs, exatamente porque eles não têm sentimentos? Portanto, não fazem cobranças. 

A indústria de robôs, que vende a ilusão dos bebês robóticos como substitutivos humanos,  vende apenas um entretenimento ou está plantando nas mentes e corações das pessoas um novo modelo de sociedade humanoide, desvirtuada das ricas características da natureza humana? 

Qual o tipo de sociedade que, na atualidade, está sendo plasmada no futuro?

A condição humana –  recorde-se a abordagem do livro  "Liberdade para ser livre” de Hannah Arendt – expressa  as atividades essenciais da vida e por toda a vida  humana, por exemplo, os relacionamentos humanos,  trabalho, o agir, a escolha, o prazer, a alegria, a tristeza, enfim, tudo o que compõe a intrínseca natureza humana. 

A perspetiva ética e filosófica das lições de Sêneca e Epicteto, quando elegem a prática das virtudes em harmonia com a natureza como caminho para a serenidade da alma, coloca o ser humano diante do próprio ser humano. Isso é próprio da condição e da natureza humana. 

A parábola profética de Jesus Cristo – ao lembrar que o espírito está pronto, embora a carne seja fraca – chama a atenção para a natureza corpórea e espiritual da pessoa humana. Isso é colocar a pessoa diante do confessionário de sua própria consciência existencial: como fazemos nossas escolhas e para qual finalidade? Mas qual finalidade: a finalidade do bem ou do mal?, aquela de de que tratam Agostinho de Hipona (nas obras  "Confissões" e "A Cidade de Deus")  e Tomás de Aquino na obra "Suma Teológica".

Comportamentos dos Therians, dos Furries (pessoas que exploram a identidade animal) e dos Otherkin (pessoas que  se identificam com seres não humanos),  rigorosamente fora das características que personalizam a natureza humana, também levantam questões éticas sobre esses valores e relacionamentos.   Ao que indica, nessas  comunidades online e subculturais, as reflexões existenciais e espirituais são de outra natureza

Nos relacionamentos humanos versus robôs (sejam com bonecos robôs ou de casal humanoide), a  perspectiva filosófica da serenidade da alma e a perspectiva teológica da espiritualidade perdem espaço.

Precisamos ser bem claros e honestos com a condição ética da natureza humana: bonecos robóticos não possuem corações (são vazios de sentimentos) , não tem veias (neles não correm sangue humano), não têm fome e nem adoecem (portanto, não sabem o que é a dor , a tristeza ou a felicidade humana). Numa palavra:  boneco robótico é boneco. Nada mais do que isso.  Bebê humano é bebê humano. É uma criança que exala vida e representa sequência da humanidade.   Pronto! Essa é a diferença  basilar que deve prevalecer para que se evitem as subjacentes  e perigosas mensagens ideológicas  para o futuro da saúde mental humana, com a relativização dos sentimentos humanos.

Então, fica a última questão: será possível, e em que medida, o exercício das virtudes cardeais e das virtudes teologais (fé, esperança e caridade) nos relacionamentos humanos com robôs? O que pensa o leitor? 

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Océlio de Morais
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