O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

O tempo do silêncio e a decisão judicial

Crônicas judiciárias de quase um quarto de século na magistratura

Océlio de Morais

Quando acabei de ler “O silêncio”, o best-seller internacional de  Erling Kagge,  escritor e editor, norueguês nascido  em Oslo,  surgiu-me a ideia  de escrever essa crônica sobre a silenciosa arte reflexiva de prolatar decisões judiciais, especialmente, as sentenças.

Esse momento diferente é, sem dúvida, um dos mais cruciais, mas especialmente nobre da missão do magistrado, porque ali - a partir de uma multitude de documentos, falas e contra-falas, argumentos e contra-argumentos - o juiz mergulha no silêncio dos seus valores, curiosamente dialogando (silenciosamente) com as provas até encontrar a decisão mais justa para verbalizar sua decisão.

A  leitura do livro me fez bem. Kagge pergunta sobre o que é o silêncio e onde encontrá-lo. Nas sabedorias filosóficas  de Sócrates e Aristóteles, o escritor norueguês lembra que a melhor forma de entender e encontrar o precioso silêncio está em “aprendermos a nos conhecer melhor”. Referia-se, por certo, ao milenar ensinamento de Sócrates “nosce te ipsum”, equivalente em português a conhece-te a ti mesmo.

Isso pode ser comparado ao vinho envelhecido, aquele que fica na maturação em barricas de carvalho, no silêncio e na penumbra dos anos a fio. É o tempo do amadurecimento.

O dito popular diz que o melhor vinho é aquele mais envelhecido. Então o melhor vinho é fruto do  tempo da sua maturação silenciosa . 

Tudo na vida - isso é  óbvio, mas preciso enfatizar - está relacionado ao aprendizado do tempo que nos ensina a maturação das ideias.

O exercício da magistratura, quando o juiz aprende a ouvir o silêncio que está nele mesmo e aprende o silêncio significativo dos processos, entenderá que eles carregam os dilemas humanos reais ou não reais. 

O silêncio do tempo faz entender, como nos dizem as palavras imortais de Sócrates, que “A verdade não está com os homens, mas entre os homens”. Por outras palavras, adaptando-se ao mundo dos processos judiciais: o direito não está com as petições e nem com as contestações, mas está  entre as partes que vêm ao processo com a boa fé. 

É a partir desse princípio que o magistrado, aquele que aprende a ouvir a voz do tempo, utiliza para separar o joio do trigo, a boa-fé ou má-fé dentro das relações processuais.

O silêncio do tempo na magistratura é o tempo do aprendizado; é o tempo do conhecimento; é o tempo da ponderação do pensamento; é o tempo do “nosce te ipsum” socrático para melhor conhecer e compreender os dilemas humanos porventura violados, e colocados ao exame e julgamento judicial.

Numa síntese, é o tempo do conhecimento, mas daquele conhecimento útil que nos torna melhores. Como disse Sócrates:  “só é útil o conhecimento que nos torna melhor”.

O silêncio do tempo na magistratura - e isso tenho me esforçado a aprender neste meu quase um século dedicado à jurisdição trabalhista na Amazônia - possibilita, por exemplo, identificar que, por traz dos processos, existe um silêncio loquaz, às vezes movido por outras razões distantes do direito pretendido, mas são razões que não estão expostas ali naquelas folhas silenciosas.

E o magistrado, no “silentio animo” (no silêncio de seu sentir), vai compreendo que a decisão judicial, mais do que a expressão com as palavras  do que pensa - Aristóteles dizia que “O sábio não fala tudo o que pensa, mas pensa sempre tudo o que diz” - precisa representar a máxima da jusfilosofia plasmada por Soares: “o julgamento é a aplicação da justiça”.

Concluo essa breve crônica filosófica, sobre a lição silenciosa de meu tempo de aprendizado na magistratura, com o autor que a iniciei: “(...) o silêncio ao nosso redor” também nos chama a atenção para “o silêncio que  trazemos dentro de nós”.

Adaptando o pensamento ao universo dos processos: o silêncio eloquente das folhas processuais mexe com o sentido silencioso e com o valor de justiça que cada juiz traz dentro de si, não como expressão da decisão absoluta e intocável, mas como honesto esforço de entregar a Justiça a quem merecê-la.

Esse é o meu tempo de meu  sentir.

ATENÇÃO: Em  observância à Lei  9.610/98, todas as crônicas, artigos e ensaios desta coluna podem ser utilizados para fins estritamente acadêmicos, desde que citado o autor, na seguinte forma (Océlio de Jesus Carneiro Morais (CARNEIRO M, Océlio de Jesus) e respectiva fonte de publicação. 

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