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O.J.C. MORAIS

OCÉLIO DE JESÚS C. MORAIS

PhD em Direitos Humanos e Democracia pelo IGC da Faculdade de Direito Coimbra; Doutor em Direito Social (PUC/SP) e Mestre em Direito Constitucional (UFPA); Idealizador-fundador e 1º presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social (Cad. 01); Acadêmico perpétuo da Academia Paraense de Letras (Cad. 08), da Academia Paraense de Letras Jurídicas (Cad. 18) e da Academia Paranaense de Jornalismo (Cad. 29) e escritor amazônida. Contato com o escritor pelo Instagram: @oceliojcmorais.escritor

Liberdade individual e liberdade política

Océlio de Morais

Se bem observarmos – o que significa  um mínimo esforço para separar a objetividade científica  do achismo empírico  – a ideia de liberdade adotada  na Declaração (francesa) dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789 ) não consiste na completa “emancipação do passado”, notadamente em relação à ideia do dogma religioso, como se propagada ainda hoje nalguma interpretação filosófica do iluminismo.  

Com isso, quero afirmar que a ideia de liberdade – na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão –  mantém um princípio religioso, mas inova quando a apresenta como um direito político.

Então essa é a minha  argumentação  básica nesse sucinto ensaio sobre o sentido da liberdade na referida declaração..

Recordemos: filosoficamente conhecido como o "`Século das Luzes” ou o  "Século da filosofia” –  porque a razão é a fonte da autoridade e da legitimidade em oposição  aos dogmas da então Igreja Católica Apostólica Romana –  o  iluminismo do século XVIII  adotou, dentre outros valores humanos,  a liberdade, a fraternidade e a tolerância, além da opção política que deu origem ao laicismo do Estado: a separação Estado-Igreja.

Pascal  Quinard, filósofo francês contemporâneo, relaciona a razão à dinâmica da faculdade de pensar.  A concepção deste filósofo francês, desse modo,  me permite afirmar que a razão iluminista, como uma faculdade da inteligência,  no que  à liberdade, à fraternidade e à  tolerância religiosa, é haurida na doutrina do direito natural ou jusnaturalismo , cujo pressuposto é a existência  de direito divino preexistente e sobreposto ao direito positivo. 

A liberdade humana, na concepção iluminista, possui  um atributo  de universalidade precisamente porque é um direito inerente à condição humana sempre válido e exigível em qualquer lugar, em qualquer tempo, em todos os momentos da vida. 

Na Declaração francesa – ela plantou o ideário “liberté, égalité e fraternité” como direitos universais  à revolução francesa do período de 1789 a 1799 e rompeu com o regime monárquico absolutista  —  são identificáveis os seguintes princípios religiosos e políticos relativos à liberdade.

Observe-se que a declaração francesa enuncia direitos positivos (liberdade e igualdade, por exemplo), mas o faz reconhecendo que  são “direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem e do cidadão”, porque são declarados “na presença e sob os auspícios do Ser Supremo”.

Por um modo bem simplificado de dizer:  a ideia (a razão) filosófica da liberdade iluminista não prescinde da ideia ou base teológica de que toda autoridade legitimadora do poder terreno emana do Ser Supremo (Deus).

Portanto, a liberdade iluminista  na referida declaração não sepulta a liberdade como princípio teológico, visto que são reconhecidos “na presença e sob os auspícios do Ser Supremo”.

A liberdade, a igualdade e a resistência à opressão, dentre outros, são  declarados como “direitos naturais e imprescritíveis do homem” (Art. 2º) precisamente porque as pessoas “nascem e são livres e iguais em direitos” (Art. 1º).  

Formalmente,  elimina-se a ideia estrutural da discriminação da cor e da raça, que possibiliava e justificativa a escravidão  no regime anterior à revolução francesa.  Todos são iguais no direito de pensar e de expressar opiniões, inclusive política e religiosa, desde que não perturbadoras da ordem pública (Arts. 10º e 11º)

A liberdade como “direito natural e imprescritível” quer dizer, que naquele princípio, que é dever da associação política  (o Estado) conservá-lo, seja como garantia individual, seja como princípio  “felicidade geral” – felicidade geral tomada na acepção da felicidade pública de que trata a declaração da independência americana, a partir das ideias de Thomas Jefferson. 

Enquanto princípio político a liberdade individual na declaração francesa, não é absoluta, mas limitada pelo princípio ou direito à igualdade.

O princípio maior  que rege o exercício da liberdade individual é o da não-lestividade ao direito de outrem. É o que consta na primeira parte do Art. 4º:   – “A liberdade consiste em poder fazer tudo aquilo que não prejudique outrem”.

O segundo princípio é o igual direito garantido  ao semelhante, constante na segunda parte do Art. 4º ,  cujo papel é delimitar , pela Lei, o exercício da liberdade: “(...) assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão os que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela Lei.” 

Nesse sentido, a liberdade política é uma liberdade vigiada e contida  pela Lei, porque ela “é a expressão da vontade geral.” Da lei decorre a regulação da liberdade. Ela dirá o que pode e que não pode ser feito: “Tudo aquilo que não pode ser impedido, e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene.” (Art. 5º).

Na concepção da declaração francesa, a Constituição é a garantia do exercício da liberdade enquanto direito natural e enquanto direito político: “- Qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos (...) não tem Constituição.”  (Art. 16º).

Em conclusão, penso que restou objetivamente  comprovado que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão  mantém o princípio teológico como base de reconhecimento dos direitos naturais relativos à liberdade e à igualdade,  mas inova ao apresentar a liberdade com a natureza de direito político individual e coletivo. Porém, ainda que, por um lado, seja reconhecida como um direito natural, inalienável e imprescritível  na declaração francesa, por outro lado, o exercício da liberdade  exige  o princípio da  igual e respeitosa correspondência de direitos. 

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ATENÇÃO: Em  observância à Lei  9.610/98, todas as crônicas, artigos e ensaios desta coluna podem ser utilizados para fins estritamente acadêmicos, desde que citado o autor, na seguinte forma (Océlio de Jesus Carneiro Morais (CARNEIRO M,  Instagram: oceliojcmoraisescritor

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