Conheça a história das festividades dos santos juninos
As festas são uma representação da cultura popular, unindo fé e apresentações artísticas
Quadrilhas, fogueiras, comidas típicas e casamentos na roça — esses são alguns dos momentos tradicionais das festas juninas, que fazem parte do calendário litúrgico da Igreja Católica. Em junho, fiéis celebram Santo Antônio (13), São João (24), São Pedro e São Paulo (29), santos da chamada quadra junina, e também São Marçal (30), santo protetor dos perigos e aflições. O período une festividades culturais com manifestações de fé, em um momento que se relaciona com a história do sincretismo cultural e religioso no Brasil.
“A espiritualidade que nós recebemos do catolicismo veio a partir de um rosto ibérico, especificamente de Portugal. É uma religiosidade portuguesa onde os santos já tinham festas populares”, diz o teólogo Mário Tito, professor do curso de Ciências da Religião da Universidade do Estado do Pará (Uepa). Ele explica que as festas juninas foram enriquecidas pelas expressões diversas da cultura brasileira, que “trazem consigo, seja pelo aporte dos povos indígenas e dos povos escravizados da África, como também pela participação dos portugueses, a ideia de representações culturais diversas, como dança e musicalidade”.
As festas estão diretamente ligadas à forma como os sentimentos humanos são explorados na espiritualidade ibérica, tanto em Portugal quanto na Espanha. Se durante a Semana Santa as ideias de sofrimento e morte são vividas com intensidade pelos devotos, nas festas juninas os sentimentos de alegria e felicidade são colocados em destaque. “Você tem a celebração do santo e também a celebração da felicidade de poder viver. Isso se junta em um processo de sincretismo cultural e religioso, é como se o transcendente, o divino, se aproximasse do cotidiano das pessoas. Essa proximidade causa uma alegria muito grande”, afirma o professor.
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Música, Dança e Comidas Típicas
A escolha das músicas também tem significados nas festividades. O forró, o xote, o baião, o lundu e o carimbó, característicos das programações, são ritmos contagiantes, que marcam a transformação da alegria da vida em musicalidade, com danças intensas e rápidas. Já as comidas típicas simbolizam a empolgação existencial da chegada do divino ao humano. “Em todas as culturas, quando há manifestação festiva, também existe comida. As festas se fazem ao redor da mesa. Tudo faz parte de um ritual”, diz Tito.
O catolicismo é forte nas tradições, expressões de fé e dogmas consolidados — mas é na festa dos santos que se chega até a capilaridade da vida social, segundo Tito. Os festejos se aproximam do cotidiano dos fiéis e os conduzem para celebrações litúrgicas carregadas de expressões populares. De acordo com o teólogo, os festejos ajudam a criar um coletivo de expressão de religiosidade, que envolve e empolga. “A maior preocupação do catolicismo é fazer com que o culto aos santos não seja um fim em si mesmo, mas conduza, de alguma forma, à centralidade da pessoa e à mensagem de Jesus Cristo”.
Santos de junho
Na tradição católica, os santos possuem uma proximidade maior com Jesus e intercedem pelos devotos para tornar possível o alcance de graças. O primeiro santo de junho é Santo Antônio, celebrado no dia 13. Santo Antônio nasceu em Lisboa, mas sua vida pastoral, atuando como ministro de Deus, iniciou na cidade de Pádua, na Itália. Enquanto São Francisco ainda era vivo, Santo Antônio se tornou franciscano e integrou a congregação de frades menores.
“Um dado da vida é que São Francisco não queria Santo Antônio na Ordem Franciscana, porque ele queria que os franciscanos não tivessem grandes estudos e Antônio era um grande estudioso, um teólogo, um grande pregador. Santo Antônio participou de algumas reuniões dos franciscanos demonstrando claramente a sua pobreza, a sua popularidade, mas também a sua humildade, e Francisco o aceitou”, destaca Mário.
Santo Antônio também é conhecido como Santo Casamenteiro. Em vida, ele era próximo das pessoas e aconselhava homens e mulheres a terem relações de casamento e também a viver o amor matrimonial. Além disso, é conhecido como Santo dos Pobres e das Coisas Perdidas. Durante as festividades de Santo Antônio, é comum que os fiéis peçam para que o santo encontre bens desaparecidos.
Já São João, que batiza as festividades juninas, é celebrado no dia 24 do mês. A tradição das fogueiras nas festas teve início por causa de São João. “Maria, mãe de Jesus, estava grávida e foi visitar Isabel, mãe de João Batista, quando ela estava com 6 meses de gestação. Ficou acordado entre elas avisar quando João nascesse, e foi acesa a fogueira para anunciar a chegada de João Batista. A fogueira acaba sendo um sinal de festa, um sinal de vida, de alegria, um anúncio de coisas boas”, informa o professor da Uepa.
São Pedro é celebrado no dia 29, conhecido como chefe dos apóstolos. Era pescador e é reconhecido como padroeiro dos pescadores. Segundo a história, São Pedro guarda a chave dos céus. Já São Paulo, celebrado no mesmo dia, foi uma das figuras mais importantes para o cristianismo, percorrendo diferentes territórios romanos para levar a mensagem cristã.
São Marçal é celebrado em 30 de junho e encerra o mês junino. Foi bispo na França e é considerado o protetor dos bombeiros, dos momentos de perigo e aflições. Em Vigia de Nazaré, no Pará, a Comunidade São Marçal é dedicada ao santo.
Nossa Senhora do Perpétuo Socorro
Apesar da celebração de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro ser realizada em 27 de junho, as festividades não são consideradas festas juninas. De acordo com o teólogo Mário Tito, esse é um dos vários títulos de Nossa Senhora, mãe de Jesus, também conhecida como Nossa Senhora de Nazaré, das Graças e Auxiliadora.
A figura é bastante popular nos lugares onde estiveram os padres redentoristas — é considerada padroeira da congregação. O título se dá por conta da ajuda que Nossa Senhora oferece às pessoas que passam por dificuldades, representando a mãe de Deus que socorre, consola e intercede.
Histórias de fé com Santo Antônio
A administradora e acadêmica de Fisioterapia Suzy Soares, de 44 anos, alcançou um milagre pela intercessão de Santo Antônio. Devota desde a infância e frequentadora da Paróquia Santo Antônio de Lisboa, ela conta que, na trezena de maio de 2024, a mãe sofreu um AVC hemorrágico e precisou realizar cateterismo no cérebro. A veia afetada foi a femoral. “Quando ela saiu da internação, o médico disse que provavelmente ainda havia um pequeno sangramento e que ela teria que realizar o mesmo exame para desobstruir. Eu disse que ela não precisaria fazer de novo, e isso foi no início da trezena”, compartilha.
A devota conta que conversou com o santo e participou de todos os dias da trezena. “E todos os dias, eu vinha para a trezena, abençoava a água e ela jogava a água na cabeça da minha mãe. Não faltei um dia”. Depois dos treze dias, a mãe precisou realizar um exame, e as duas foram surpreendidas positivamente: o coágulo no cérebro foi completamente dissolvido, e a mãe ficou sem sequelas.
Suzy relata que a experiência fez com que a fé se fortificasse. “Isso faz com que a gente tenha mais força ainda para servir a Ele, porque o pouco que a gente faz é pouco para tudo que Ele intercede por nós. É importante dar o testemunho para as pessoas entenderem a fé”.
Nei Santos, engenheiro eletricista, também alcançou graças. Durante a época da pandemia da Covid-19, a família de Nei enfrentou dificuldades com o financiamento da casa própria: foi preciso interromper o pagamento das parcelas por falta de dinheiro. Em meio às dificuldades, a família viu no espírito de fé e coletividade da paróquia uma forma de superar o momento difícil.
“Para mim, o grande milagre do cristianismo é a partilha, quando as pessoas da paróquia disseram assim: 'Nós vamos ajudar'. O valor que nós precisávamos, a gente conseguiu através dos amigos que nos ajudaram, que fizeram uma coleta. Conseguimos pagar o valor e quitamos nosso apartamento”, relembra.
De acordo com o pároco Frei Rodolfo Pimentel, da Paróquia Santo Antônio, o santo realizou diversos milagres em vida. Santo Antônio teve um dos processos de canonização mais rápidos da igreja, em apenas 9 meses após a morte. “Essa vida de santidade nos inspira como comunidade, a também seguir a Jesus, como ele fez, e contar com o seu auxílio, com a sua intercessão”, finaliza.
*Ayla Ferreira, estagiária de Jornalismo, sob supervisão de Fabiana Batista, coordenadora do Núcleo de Atualidade.
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